RESUMO: A partir de um método dialético, com análise bibliográfica, consultiva e jurisprudencial, o presente estudo foca sua atenção em meios alternativos para a solução de conflitos, e, em especial, no avanço da utilização no Brasil da Constelação Familiar. A construção de caminhos para que a Justiça chegue aos cidadãos através da desjudicialização dos conflitos deve ser incentivada. Os resultados extremamente positivos já alcançados corroboram essa tese. O estudo a seguir discorre sobre a construção de um sistema brasileiro composto de métodos alternativos para a solução de conflitos, frequentemente chamado de multiportas, as mudanças que foram necessárias para tal construção, e os avanços obtidos para toda a sociedade com a maior utilização desses métodos. Por último, trata-se mais especificamente sobre o método chamado Constelação Familiar, usado como forma de resolução pacífica de conflitos, sobretudo no âmbito familiar, de modo que as próprias partes possam se resolver, e assim evitar a judicialização.
PALAVRAS CHAVES: Conflito, Métodos Alternativos, Resolução, Constelação Familiar.
INTRODUÇÃO
As sociedades modernas compartilham a experiência da expansão crescente da judicialização dos conflitos. Na maioria dos países democráticos, tribunais e juízes enfrentam sobrecarga de trabalho pelo incremento de demandas judicias que devem ser analisadas e solucionadas. A morosidade da Justiça é preocupação crucial dessas sociedades . Para enfrentar essa questão, há de se promover métodos alternativos eficazes e legítimos para a solução de conflitos. Há de se eliminar progressivamente a cultura impregnada do litígio e construir a cultura da consensualidade, acelerando o processo como um todo. Nas palavras de Rui Barbosa:
“Justiça atrasada não é justiça, senão injustiça qualificada e manifesta."
O Brasil apresenta um dos maiores índices de disputas judiciais do mundo, além de um alto índice de morosidade processual, o que contraria diversas legislações nacionais sobre celeridade e eficácia.
Segundo Thiago Crepaldi e Severino Goes, em reportagem publicada no Anuário da Justiça Brasil 2022, disponível em < http://www.conjur.com.br/2922-jun-30.poder-decide-faz>:
“A Base Nacional de Dados do Poder Judiciário, mantida pelo Conselho Nacional de Justiça, contabilizou 80.129.206 processos em tramitação nos tribunais e varas do Brasil no dia 31 de março de 2022.”
Esse número aumenta para 84 milhões de processos em outubro de 2023, ainda que observado aumento de produtividade dos magistrados, segundo informação obtida no endereço <https://www10.trf2.jus.br/portal/cnj-com-84-milhoes-de-processos>
A construção de caminhos para que a Justiça chegue oportunamente aos cidadãos brasileiros, através da formação de um sistema de métodos alternativos, acelerou-se nos últimos 25 anos, tendo sido iniciada nos anos 70.
O Brasil acompanha, portanto, diretrizes mundiais , como a contida no Objetivo 16 do Desenvolvimento Sustentável (ODS), presente na Agenda 2030 da Organização das nações Unidas:
“16 – Paz, justiça e instituições eficazes: promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis.” (grifo nosso)
1- BREVE HISTÓRICO DA CONSTRUÇÃO DO SISTEMA BRASILEIRO DE MÉTODOS ALTERNATIVOS PARA A SOLUÇÃO DE CONFLITOS:
No Brasil atual, o acesso à Justiça é feito através de um modo, adequado ao conflito, de solução do problema jurídico (aquele que pode ser resolvido pelo Direito), sendo que essa Justiça não é necessariamente o Judiciário. O conjunto desses modos, tem-se como um Sistema Brasileiro de Solução de Conflitos. Esse Sistema está em construção, foi e é desenvolvido sem planejamento, organizando-se ao longo do tempo. As leis vão surgindo naturalmente , promovendo mais caminhos.
Interessante notar que, desde muito, exemplos isolados de meios alternativos de solução de conflitos estavam presentes no ordenamento brasileiro, como o Decreto 70/66 que autoriza a execução extrajudicial de determinados créditos, Isso, para a época foi uma revolução e também causou muita controvérsia. Em 2021, o STF entende que esse Decreto foi recepcionado pela CF/88. O que era uma excentricidade nos anos 60 se torna trivial atualmente.
O papel do legislador foi fundamental, ao longo do tempo, para possibilitar a construção desse sistema de métodos alternativos para a solução de conflitos. Já no preâmbulo da Constituição Federal de 1988, encontra-se a citação de comprometimento da sociedade com soluções pacificas de controvérsias. Essa Constituição também já trata de métodos para a solução de conflitos, apesar de não os nomear como tais . Como exemplos, a conciliação, a arbitragem e o acordo.
Em 1995 surgiram os Juizados Especiais, possibilitando maior acesso à Justiça. Neles foi prevista a audiência conciliatória no início do procedimento.
Em 2009 houve o Segundo Pacto Republicano, que previa fortalecer a mediação e conciliação. Na prática, os outros poderes não atuaram de forma concreta nesse sentido.
A Resolução N º 125/2010 do CNJ, que dispõe sobre a Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário, trouxe para o Judiciário a responsabilidade de difundir a conciliação e a mediação. Essa Resolução influenciou o novo CPC, a Lei da Mediação e a atualização da Lei da Arbitragem . Com isso, em 2016, o Brasil já tinha um sistema de métodos adequados à solução de conflitos.
O art. 3 º, § 2º, do Código de Processo Civil de 2015 prioriza a solução consensual de conflitos. Já o art. 3 º, § 3º, desse mesmo CPC permite a criação pelas partes em consenso de formas de solução de conflitos.
Art. 3º Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito.
§ 1º É permitida a arbitragem, na forma da lei.
§ 2º O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos.
§ 3º A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.
Enorme importância deve ser reconhecida ao citado art. 3º do CPC. Não por acaso sua matéria foi tratada no capítulo de normas fundamentais do processo civil, Quis o legislador demonstrar a importância do tema. No caput, cuida de jurisdição. O § 3º estabelece cláusula geral de meios consensuais de solução de conflitos que devem ser promovidos pelos agentes do processo, como Estado e advogados. Cria dever do Estado de promover solução consensual, tida como prioritária, e cria abertura para os meios de solução, sem tipificá-los. Como já dito, esse art. 3º do CPC foi inspirado na Resolução N º 125/2010 do CNJ e também na Recomendação 38/2011 do CNJ, que recomendou aos tribunais a instituição de mecanismos de cooperação judiciária entre os órgãos do Poder Judiciário.
Em seguida, houve ainda alteração no Código de Ética dos Advogados, trazendo o dever de promover soluções consensuais.
O sistema brasileiro, portanto, é aberto em múltiplas dimensões. Diversos são os sujeitos, como o Procon, Ministério Público, Conar, Poder Judiciário. Diversos são os meios de solução. Está em permanente expansão, sendo o CNJ o articulador e regulador desse sistema.
Hoje, todas as leis sempre tratam de soluções alternativas de conflitos, nas diversas áreas do Direito. São exemplos: a colaboração premiada, a transação penal, o superendividamento, as licitações, a improbidade.
2- ALGUNS MÉTODOS ALTERNATIVOS DE SOLUÇAO DE CONFLITOS, SEUS AMBIENTES E CARACTERÍSTICAS.
Os principais métodos utilizados no Brasil atualmente são os citados a seguir:
Negociação;
Conciliação;
Mediação;
Arbitragem;
Processo Judicial;
Dispute Board;
Constelação Familiar;
Justiça restaurativa;
Avaliação imparcial de terceiros;
Sistemas híbridos.
Em continuidade, serão resumidamente conceituados alguns dos métodos acima.
Negociação - utilizada para divergências que não necessitam de uma intervenção e nem participação de um terceiro, alheio à situação conflitante. É adequada para aqueles casos que não envolvam afetividade entre as partes, e estas, por meio de um acordo (negócio) resolvem o conflito, que geralmente é de ordem material.
Conciliação - há a necessidade de um terceiro que trabalhe na escuta do problema vivenciado entre as partes e as estimule a chegada de um acordo. Nesse meio, o conciliador sugere e propõe soluções para o conflito, cabendo às partes aceitarem ou não essa proposta. Os tipos de conflitos adequados à conciliação são aqueles de natureza temporária e circunstancial, não muito complexos, conforme alerta Juan Carlos Vezzulla (2001, p.43):
“A conciliação como técnica é de grande utilidade nos problemas que não envolvem relacionamento entre as partes, o que permite trabalhar sobre a apresentação superficial (verdade formal ou posição) para alcançar uma solução de compromisso sem repercussão especial no futuro de suas vidas.”
Mediação - as próprias partes chegam a uma conclusão do que seria mais benéfico para ambas. E, muito embora haja a figura de um terceiro, o mediador, este servirá, na verdade, como orientador, mas, sem trazer sugestões, atuando na construção de um diálogo. A mediação pode ser aplicada em diversos tipos de conflitos, como os de família, empresarial, saúde, ambiental, urbanos, vizinhança, consumidor, comunitário. Os conflitos que tratam de sentimentos e situações frutos de relacionamentos – mágoas, frustrações, traições, amor, ódio, raiva - revelam-se adequados à mediação, podendo ser judicialmente, quando realizada depois de iniciado um processo jurisdicional, ou extrajudicialmente, conforme preceitua a Lei nº 13.140/2015, ou Lei de Mediação. O mediador trabalha o pano de fundo do conflito com objetivo de que as partes, com ou sem consenso, restabeleçam seu diálogo.
Arbitragem - é o meio que mais se aproxima com o Judiciário, pois nessa modalidade há a figura do árbitro, que embora possa ser escolhido pelas partes, detém o poder de decisão, e esta tem validade de sentença e versa sobre direitos patrimoniais disponíveis, como disposto no art. 1º da Lei de Arbitragem nº 9.307, de 23 de Setembro de 1996.
Dispute Board – criação de comitês para resolução ágil de conflitos, sobretudo em obras de infraestrutura e contratos de execução continuada.
Justiça Restaurativa - método que busca, quando possível e apropriado, realizar o encontro entre vítima e ofensor, assim como eventuais terceiros envolvidos no crime ou no resultado dele, com o objetivo de fazer com que a vítima possa superar o trauma que sofreu e responsabilizar o ofensor pelo crime que praticou.
Avaliação imparcial de terceiros – terceiro é contratado para fornecer sua opinião jurídica , como se juiz fosse, possibilitando às partes decidir sobre acordo ou ingresso no Judiciário.
Os principais ambientes do sistema são:
Judicial;
Extrajudicial;
Administração Pública;
Ambiente Digital.
Por inovador que é, importante comentar sobre o Ambiente Digital , que abrange todos os ramos do Direito, disponibilizando ferramentas como:
Balcão Virtual – extingue a necessidade de comparecimento físico para atendimento;
Juízo 100% Digital – atos do processo podem se realizar digitalmente, até uma audiência online;
Plataforma Codex - plataforma nacional que consolida as bases de dados processuais, integrando dados, permitindo uso de inteligência artificial;
ODR (Online Dispute Resolution) - plataformas digitais para resolução de conflitos.
Já as principais características do sistema são:
Alto grau de organização já alcançado;
Expansivo - aberto a outros métodos;
Dinâmico – pode sofrer mutações;
Democrático – acessível a todas as pessoas, atendendo os mais diversos conflitos;
Humanizador – não se restringe a soluções frias;
Gerencial – deve-se entender o conflito para decidir sobre o método;
Heterogêneo – técnicas diferentes;
Pluriespacial – diversos ambientes;
Interativo – métodos podem se interconectar, resolvendo parte do conflito por um método e parte por outro;
Instrumental – serve ao Direito Material;
Interdisciplinar – abarca diversas ciências;
Pacificador.
Contudo, a principal característica do processo civil após 2015, que vale ser ressaltada, é a Flexibilidade, podendo-se amoldar a diversas situações de crises do direito material que eventualmente sejam levadas ao Judiciário. É recheado de cláusulas gerais que permitem ao aplicador do direito certa discricionaridade porque traz uma hipótese determinada e um consequente determinado, dando capacidade adaptativa muito grande. Como exemplo, a Cláusula Geral da Negociação Processual , contida no art. 190 do CPC :
Art. 190. Versando o processo sobre direitos que admitam autocomposição, é lícito às partes plenamente capazes estipular mudanças no procedimento para ajustá-lo às especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, antes ou durante o processo.
Principais consequências a partir do uso do sistema são:
Priorização da solução consensual dos conflitos;
Ampliação do conceito de acesso à Justiça e de jurisdição;
Empoderamento das partes – antes elas dependiam só do Judiciário e hoje têm poder de escolha;
Transformação dos profissionais do Direito.
O devido processo legal deve estar inserido no sistema. Todos os métodos devem observar a Lei, não podendo ferir direitos fundamentais. Devem observar os Princípios consagrados do Direito e ter as garantias processuais que lhes são inerentes.
3- A CONSTELAÇÃO FAMILIAR COMO FERRAMENTA DO JUDICIÁRIO:
Como já visto no capítulo anterior, o CPC traz processo democrático que orienta participação dos atores em igualdade, sendo um dos seus eixos a autocomposição (permissão às partes para encontrarem solução). Isso permite o uso do método de Constelação Familiar nos conflitos, principalmente os relacionais e familiares.
Constelação Familiar é uma técnica vivencial, holística, que pode revelar dinâmicas ocultas das relações familiares que possibilita um conhecimento mais pleno do conflito para o indivíduo.
A técnica é trazida para o Judiciário de forma neutra, sem violar direitos fundamentais, como isenção de aspectos religiosos (direito à laicidade). Também não se utiliza nenhum misticismo no seu emprego no Judiciário, como pode ocorrer quando empregada em consultórios terapêuticos.
A técnica favorece a autocomposição e que o conflito relacional não retorne ao Judiciário sob outra forma, diminuindo também os casos de descumprimento de acordos.
Após a Constelação Familiar , ocorre audiência de conciliação ou mediação. Ela não gera informação para o processo nem serve de prova.
Os conflitos que são levados para uma sessão de Constelação, em geral, versam sobre questões familiares, como guarda dos filhos, divórcios litigiosos e adoção.
Críticas são feitas com relação a não ser encarada como prática psicoterapêutica pelo Conselho Federal de Psicologia, entretanto, é permitida como técnica vivencial, o que atende ao Judiciário.
A Constelação Familiar foi desenvolvida pelo filósofo alemão Bert Hellinger na década de 1970 e foi aplicada no Judiciário inicialmente pelo Tribunal de Justiça da Bahia, a partir de 2012.
É uma técnica de autocomposição e conscientização. Além da pessoa a ser constelada, há a figura do constelador, capacitado, que conduz a prática, e participação de pessoas convidadas a representar papéis de familiares ou de relacionados com o participante constelado. Todos são colocados em uma sintonia em que as relações, os conflitos e suas dinâmicas são percebidos, observados, sentidos. Busca-se descobrir a raiz do problema para, então, solucioná-lo.
O caso em questão no Judiciário não é abordado. A técnica é usada em fase preliminar ao processo de família e pode resultar na conciliação ou na mediação do conflito. Esse fica melhor compreendido pois o participante constelado expande sua consciência. A dinâmica é indicada pelo juiz, mas a participação é voluntária.
O conflito familiar não abordado com uma técnica humanizada no início do processo, apresenta tendência a se agravar e a se multiplicar no sistema Judiciário tradicional.
Sobre a técnica, através de representações e imagens, busca-se a ordem de amor mais harmoniosa para o sistema familiar, tendo como sustentáculo as chamadas leis sistêmicas, as quais são aplicáveis universalmente aos agrupamentos familiares e às suas conexões através das gerações. Conforme diz Barreto (2018, p.20):
“A Constelação não é uma técnica para reviver o passado ou, por curiosidade, querer saber o que houve na vida dos antepassados. É uma forma de contato com tudo que está em desordem na vida de uma pessoa e através do que se olha, pode-se mudar a energia que estava parada, sendo assim, deixando a pessoa livre para viver sua vida em plenitude, sem interferências. Também não é julgar como os ancestrais fizeram, ou se arrogar melhores e superiores a eles, mas sim fazer diferente, com consciência e entender que o que foi feito, só pôde ser realizado como foi, da forma como poderia ter sido para aquele momento, para aquela época, da forma como eles sabiam, [...] pois para aquele momento era tudo que tinham para enfrentar a questão.”
Neste ponto, o que surpreende é o fato de que na maioria das vezes os representantes começam a se comportar como a pessoa representada, falando, sentindo e tendo até mesmo os sintomas físicos semelhantes aos dos representados. É possível ter a explicação desse fenômeno através da Teoria dos Campos Morfogenéticos:
A Teoria dos Campos Morfogenéticos postula a hipótese de que as mentes de todos os indivíduos de uma espécie se encontram unidas, formando parte de um mesmo campo mental planetário – campo morfogenético -, no qual a mente dos indivíduos afeta o campo e este afeta a mente dos indivíduos por ressonância mórfica. O campo morfogenético seria como uma grande biblioteca universal, na qual estariam todas as informações da humanidade. (PIZZATTO, 2018, p. 35-36).
A prática da constelação familiar se destacou pelos resultados alcançados e por não ser consubstanciada em uma técnica engessada que seguia uma fórmula aprendida, procedente de uma solicitação de ajuda, e usada da mesma forma para todos. Vista e introduzida inicialmente dentro da vivência familiar, as constelações familiares ajudam a esclarecer as teias que ligam a vida e o destino de membros da mesma família e grupo familiar, bem como os resultados e os efeitos trazidos por meio da consciência humana, que, quando expostos à luz da percepção da própria existência, despontam emaranhamentos e divergências.
Retornando à questão da utilização do método pelo Poder Judiciário, conforme explicitado por Valadares (2020):
“(...) com exceção dos tribunais de justiça do Tocantins, de Sergipe, do Espírito Santo, do Acre, do Amazonas e de Roraima, após apenas sete anos, todos os demais 21 Estados já aplicam, em alguma medida, a técnica psicoterapêutica da Constelação Familiar. Dado que confirma a hipótese inicialmente considerada de que mais de 60%, atualmente 78%, dos tribunais estaduais no Brasil já adotariam práticas consteladoras. Mesmo os tribunais que ainda não utilizam o método Hellingeriano já ministraram palestras, workshops, oficinas e debates para divulgação do instituto.” (VALADARES, 2020, p.82)
O emprego das Constelações Familiares no Judiciário surge como uma forma efetiva de atendimento humanizado, a fim de propiciar às partes uma melhor percepção acerca do conflito. Em 2012, a Constelação Familiar começou a ser aplicada pela Justiça da Bahia, pelo juiz Sami Storch.
Nesse ano, a técnica começou a ser testada com cidadãos do município de Castro Alves, cidade do interior da Bahia. Nas 90 audiências realizadas, nas quais pelo menos uma das partes participou da vivência de Constelação, o índice de conciliação foi de 91%, segundo dados fornecidos em entrevistas pelo magistrado. Portanto, é de suma importância que o Judiciário se capacite para lidar com questões humanas sensíveis, enxergando cada história e cada caso como único. Atualmente no Brasil, profissionais do Ministério Público, Defensoria Pública, advocacia, dentre outros, já começaram a utilizar esse método, percebendo a consequente diminuição da rejudicialização e reiteração de processos judiciais.
Algumas experiências nos Tribunais de Justiça que utilizam a Constelação Familiar:
TJGO - Tribunal de Justiça do Estado De Goiás - O Projeto Mediação Familiar aplicado pelo CEJUSC, rendeu prêmio do CNJ. A prática consiste no exercício da mediação familiar sob a perspectiva interdisciplinar e multidirecional e envolve profissionais e acadêmicos do direito e da psicologia. Iniciou-se em 2013 e de acordo com dados desse tribunal, o índice de solução é de aproximadamente 94% das demandas.
TJRJ - Tribunal de Justiça do Estado do Rio De Janeiro – Ato Normativo 14/2014 do TJRJ dispõe sobre as Casas de Família, espaços humanizados para tratamento dos conflitos. Em seu art. 2 º traz a Constelação Familiar como prática a convite. Para as primeiras experiências do projeto, cerca de 300 processos com temas semelhantes sobre questões como pensão alimentícia e guarda dos filhos foram selecionados em 2016. Segundo dados do TJRJ, o índice de aprovação da técnica foi de quase 80% das audiências. Além disso, 86% das audiências realizadas após as Constelações Familiares resultaram em acordos. A aplicação da técnica fica a cargo de uma organização sem fins lucrativos, a Praxis Sistêmica.
CONCLUSÃO:
No Brasil se viveu uma grande necessidade de acesso à Justiça. O ingresso foi tão grande que se adoeceu a Justiça e surgiu a necessidade de possibilitar e emprego de diversas técnicas de solução de conflitos. Com isso houve modificação do conceito de jurisdição. Antes era muito estatal, pelo Poder Judiciário. Hoje tem que incluir a jurisdição arbitral e conciliativa. Se antes havia grande preocupação com a técnica, hoje há a preocupação com o conflito, em como tratá-lo e solucioná-lo, conferindo grau maior de humanização.
O princípio da consensualidade hoje perpassa todas as matérias (direito civil, penal, administrativo, tributário, etc.). As características desse princípio são o maior diálogo entre as partes, soluções mais adequadas, aplicação em esfera pública e privada e flexibilização do procedimento.
Esse novo conceito de Justiça é a ressignificação do acesso, que possibilita aos jurisdicionados diversas ferramentas adequadas ao tratamento de seus conflitos.
Nesse sentido, um dos métodos para a solução de conflitos, que vem se expandindo no país, é a Constelação Familiar. Utilizando representações, visa justamente harmonizar relacionamentos, o que permite a ampliação da visão problema, demonstrando que ele não afeta nem vem de um único membro da família. Com isso, as partes colocam-se uma no lugar da outra e buscam a solução, vindo o juiz a homologar a sentença, sem necessariamente julgar e decidir quem é o detentor do direito
Um dos objetivos do trabalho era pesquisar o uso de métodos alternativos para a solução de conflitos e sua previsão no Novo Código de Processo Civil, além de abordar de modo específico as Constelações Familiares.
Constatou-se que a Resolução N 125/2010 do CNJ fomenta a solução consensual e pacífica de conflitos, estimula, quando possível, a autocomposição, dando às partes o poder de achar forma de solução. O Novo Código de Processo Civil inovou, propondo o uso prioritário de métodos alternativos, como a conciliação e mediação, e dando cabimento para a utilização das Constelações Familiares.
O CPC também trouxe, além da previsão de autocomposição material, que é em relação ao conflito, a autocomposição processual, que é a possibilidade das partes realizarem convenções processuais de procedimento (Exemplos: suspensão do processo para refletir melhor, calendário do processo, etc.).
O padrão litigioso, operante durante anos na cultura jurídica brasileira, pode ser gradativamente abandonado. A cultura social pode passar a encarar o Judiciário como último recurso, não o primeiro.
O maior desafio atualmente é fazer com que todos esses métodos alternativos funcionem adequadamente, não adianta somente o Judiciário tentar, ou somente o privado tentar, tendo todos que trabalhar de forma harmônica.
Desafio também é como aumentar as soluções consensuais. Nesse sentido, alguns juízes até determinam para alguns casos, como os de consumo, a tentativa de solução consensual anterior, tendo em vista a existência de várias plataformas do governo para tal (consumidor.gov.br), a existência de diversas startups voltadas a esse negócio e a existência de plataformas privadas que já possuem negociação própria para solução conflitual, como ebay.
O presente estudo não esgota os temas tratados. A partir de visão geral sobre os conceitos apresentados, apenas tenta posicionar o atual estado de existência e utilização dos diversos métodos alternativos para solução de conflitos, registrando o longo caminho já percorrido, mas não findo, de evolução do acesso a uma Justiça mais direta, célere, humanizada e eficaz.
BIBLIOGRAFIA:
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CREPALDI, Thiago e GOES,Severinos Justiça brasileira alcança marca de 80 milhões de processos em tramitação. CONJUR, 2022. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2022-jun-30/poder-decide-faz>. Acesso em: 31/03/2024.
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Advogado, formado pela UFRJ.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ARAUJO, Gustavo Cordeiro Lomba de. Métodos alternativos de solução de conflitos: o avanço da constelação familiar no Brasil Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 23 abr 2024, 04:24. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/65174/mtodos-alternativos-de-soluo-de-conflitos-o-avano-da-constelao-familiar-no-brasil. Acesso em: 13 maio 2024.
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