RESUMO: O presente artigo tem por objetivo fazer uma breve explanação sobre a possibilidade, à luz da jurisprudência do STF e das opiniões doutrinárias, da vedação da concessão de medidas liminares em ações constitucionais.
PALAVRAS-CHAVE: Ações Constitucionais. Medidas Liminares. Mandado de Segurança. Vedação. Medida Provisória.
1. INTRODUÇÃO
Inicialmente, cumpre destacar que as garantias constitucionais previstas na Constituição de 1988 abrangem os (1) princípios constitucionais (como por exemplo, o da igualdade, a inafastabilidade da jurisdição, liberdade de crença), e as (2) ações constitucionais, também chamadas de remédios constitucionais, os quais se destinam a assegurar a fruição dos direitos enunciados na Constituição, entretanto, vislumbra-se que em determinadas situações a garantia pode constar na própria norma que assegura o direito, tal como o caso do direito ao juízo natural cuja garantia é a vedação da instituição de juízo ou tribunal de exceção (art. 5°, XXXVII).[1]
Nessa senda, as ações constitucionais afiguram-se como garantias individuais, proclamadas de forma expressa no art. 5° da Constituição. São elas: o habeas corpus – inciso LXVIII, o mandado de segurança – inciso LXIX, o mandado de injunção – inciso LXXI, o habeas data – inciso LXXII e a ação popular – inciso LXXIII. E recebem proteção particular no art.60, § 4° da Constituição, à medida que por serem consideradas cláusulas pétreas está proibida a apreciação de emenda tendente a abolí-las.
Em razão da importância do papel desempenhado pelas ações constitucionais é que a tutela judicial por elas promovida deve fundamentalmente abarcar as diversas formas de tutela de urgência (cautelares e antecipação de tutela) desde que os requisitos legalmente enunciados se façam presentes no caso concreto, em geral o fumus boni iuris e o periculum in mora.
É por tal motivo que não há necessidade de previsão expressa na legislação regulamentadora dos remédios constitucionais para que haja concessão de medidas liminares, a exemplo do que ocorre com o procedimento do habeas corpus, no caso, a justificativa para a concessão de medida liminar é a necessidade de garantir o direito à liberdade de locomoção que encontra-se violada. A mesma solução deve ser dada diante da ausência de previsão de medida liminar na legislação que rege o habeas data.
Em relação à cautelar em ação direta de inconstitucionalidade e na ação declaratória de constitucionalidade, já há previsão normativa para a sua concessão. No entanto, mesmo antes da previsão expressa no texto normativo a prestação jurisdicional prestada pelo Supremo Tribunal Federal nessas ações já abrangia a medida.
2. DESENVOLVIMENTO
Desta feita, observa-se que não há qualquer óbice à concessão de tutelas de urgência nas ações constitucionais, ainda que não haja previsão expressa. Por outro lado, insta trazer à baila indispensável discussão acerca da possibilidade da legislação infraconstitucional vedar a concessão de medidas liminares em ações constitucionais civis. Indaga-se se o veto caracterizaria medida tendente a abolir as garantias individuais ou tratar-se-ia apenas de norma limitadora.
A dita proibição está presente em nosso ordenamento jurídico, exemplificadamente, nas normas que proíbem a concessão de liminares quando o objeto for incorporação de vencimentos e vantagens de servidores públicos ou a antecipação de tutela em face da Fazenda Pública. Como veremos a seguir a matéria foi analisada pelo Supremo Tribunal Federal em algumas oportunidades.
Nesse sentido, o julgamento da Medida Cautelar em Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 223, cujo objeto era a declaração de inconstitucionalidade da MP 173/90, que veda a concessão de medida liminar em mandado de segurança e em ações ordinárias e cautelares decorrentes das medidas provisórias números 151, 154, 158, 160, 162, 165, 167 e 168 venceu o entendimento do então Ministro Sepúlveda Pertence pela constitucionalidade da norma impugnada. Um de seus argumentos foi o de que havia leis no Brasil (2.770/56, 4.348/64 e 5.021/66) que proibiam a concessão de liminares em determinados casos, contudo nunca tiveram sua constitucionalidade impugnada. Sendo assim, a princípio, não haveria qualquer inconstitucionalidade no fato da lei prever uma limitação, ressalvando, contudo, que o juiz de 1° grau ao analisar a causa estaria livre para conceder a liminar e declarar a inconstitucionalidade da Medida Provisória. Pela importância, faz-se necessário colacionar trecho do voto:
Assim, creio que a solução estará no manejo do sistema difuso, porque nele, em cada caso concreto, nenhuma medida provisória pode subtrair ao juiz da causa um exame da constitucionalidade, inclusive sob o prisma da razoabilidade, das restrições impostas ao seu poder cautelar, para, se entender abusiva essa restrição, se a entender inconstitucional, conceder a liminar, deixando de dar aplicação, no caso concreto, à medida provisória, na medida em que, em relação àquele caso, a julgue inconstitucional, porque abusiva.[2]
No referido julgamento, ressalve-se o entendimento do relator original, o Ministro Paulo Brossard, que enfatizou a impossibilidade da vedação em relação à ação de Mandado de Segurança.
Outro exemplo foi o julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade- ADECON nº 04, na ocasião o Supremo Tribunal Federal, por maioria, entendeu constitucional o artigo 1º da Lei 9.494, de 10 de Setembro de 1997, nos seguintes moldes:
O STF, por votação majoritária, deferiu, em parte, o pedido de medida cautelar, para suspender, até final julgamento da ação, a prolação de qualquer decisão sobre pedido de tutela antecipada, contra a Fazenda Pública, que tenha por pressuposto a constitucionalidade ou inconstitucionalidade do art. 1º, da Lei nº 9.494, de 10/9/1997, sustando, ainda, com a mesma eficácia, os efeitos futuros dessas decisões antecipatórias da tutela já proferidas contra a Fazenda Pública, vencidos, em parte, o Min. Néri da Silveira, que deferiu a medida cautelar em menor extensão, e, integralmente, os Mins. Ilmar Galvão e Marco Aurélio, que a indeferiam. Votou o Presidente[3]
Há autores, entretanto, que discordam do posicionamento do STF, sob a alegação de que determinadas situações só podem ser protegidas por meio de instrumentos de tutelas de urgência, conforme afirma o Ilustre Autor Marinoni: “É por demais evidente que determinadas situações de direito substancial somente se compatibilizam com tutelas de urgência. E tutelas urgentes para estes casos são os instrumentos que concretizam o direito à adequada tutela jurisdicional.”[4]
Além do que, asseguram, proibir a concessão de tutelas de urgência de modo genérico pode configurar afronta aos princípios da inafastabilidade da jurisdição (Art. 5°, XXXV da CF) e da independência entre os Poderes (Art. 2° da CF).
3. CONCLUSÃO
Conclui-se que, conforme entendimento consagrado no Supremo Tribunal Federal não há óbice à criação pela legislação infraconstitucional de vedações genéricas à concessão de medidas liminares no bojo das chamadas ações constitucionais.
Entretanto, na análise do caso concreto e exercitando o controle difuso de constitucionalidade o Juiz está livre para afastar a aplicação da norma considerando-a inconstitucional e conceder a liminar pleiteada.
4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Supremo Tribunal Federal, ADI – MC N° 223, Voto do Ministro Sepúlveda Pertence, DJ 29.06.1990.
BRASIL.Supremo Tribunal Federal, Pleno, ADC n°4, DJ de 12.11.1998
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 10ª ed., São Paulo: Malheiros Editores, 2000.
LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 11ª ed. Rev. atual. e ampl. – São Paulo: Editora Método, março/2007.
MARINONI, Luiz Guilherme. A Antecipação de Tutela. 4ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1998.
NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 2ª edição, revista, atualizada e ampliada – São Paulo: Método, 2008.
[1] Lenza, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 11 ed. Ver. E atual. E ampl. – São Paulo: Editora Método, mar./2007, p. 695-696.
[2] Supremo Tribunal Federal, ADI – MC N° 223, Voto do Ministro Sepúlveda Pertence, DJ 29.06.1990.
[3] Supremo Tribunal Federal, Pleno, ADC n°4, DJ de 12.11.1998
[4] MARINONI, Luiz Guilherme. A Antecipação de Tutela. 4. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1998.
Procuradora Federal da Advocacia-Geral da União (Subprocuradora- Chefe da Comissão de Valores Mobiliários) e é Pós Graduada em Direito Processual Civil pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP) e em Direito Constitucional e Direito Tributário pela Universidade Anhanguera (Uniderp). Ex-Defensora Pública do Estado de Pernambuco.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CAMPOS, Luciana Dias de Almeida. Possibilidade da legislação vedar a concessão de medidas liminares em ações constitucionais Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 13 dez 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42304/possibilidade-da-legislacao-vedar-a-concessao-de-medidas-liminares-em-acoes-constitucionais. Acesso em: 10 dez 2024.
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