Resumo: Este artigo busca examinar o conceito da "Sociedade do Cansaço" na atualidade e explorar os desafios que ela impõe aos profissionais, especialmente, da advocacia. Inicialmente, será abordada a era da exaustão generalizada e seus efeitos sobre a sociedade moderna. Em seguida, o foco será voltado para como esse fenômeno influencia as carreiras jurídicas, abrangendo tanto a advocacia pública quanto a privada. Ao final, serão discutidos os principais obstáculos enfrentados pelos advogados, além de sugerir possíveis estratégias para atenuar os impactos da sobrecarga no desempenho da profissão.
Palavras-chave: Sociedade do Cançaso. Desafios profissionais. Burnout. Carreiras Jurídicas. Advocacia Pública e Privada. Soluções.
Abstract: This article aims to reflect on the concept of the "Society of Exhaustion" and discuss the challenges faced by the legal profession in this context. First, the era of widespread exhaustion and its impact on contemporary society will be analyzed. Then, the effects of this phenomenon on legal careers, both in public and private law, will be addressed. Finally, the main challenges faced by lawyers will be discussed, and possible solutions will be presented to mitigate the effects of exhaustion in the practice of the profession.
Keywords: Society of Exhaustion. Professional Challenges. Burnout. Legal Careers. Public Advocacy. Private Advocacy. Solutions.
Sumário: Introdução. 1. A Sociedade da Exaustão: Desafios e Impactos na Atualidade. 2. Desafios e Possíveis Soluções. Conclusão. Referências.
Introdução
Nos tempos recentes, a sociedade tem vivenciado uma crescente exaustão generalizada, afetando não apenas a advocacia, mas diversas outras profissões. Esse cansaço, que atinge aspectos físicos, emocionais e mentais, reflete-se em todos os setores da vida social, econômica e política, sendo um fenômeno global. Profissões como medicina, educação, e tecnologia, por exemplo, também enfrentam altas demandas, pressão por resultados e jornadas de trabalho exaustivas.
Na advocacia, essa realidade é ainda mais acentuada devido aos prazos apertados e ao desgaste emocional envolvido nas questões jurídicas. O mesmo ocorre em outras áreas, onde a sobrecarga de responsabilidades compromete o bem-estar dos profissionais.
Este artigo examina os efeitos da era do cansaço nas diversas profissões, com foco nas implicações para a advocacia, e propõe soluções para reduzir a exaustão e promover um ambiente de trabalho mais saudável e sustentável.
1 A Sociedade da Exaustão: Desafios e Impactos na Atualidade
O cansaço, cada vez mais presente na sociedade contemporânea, deu origem à "era da grande exaustão", com um aumento significativo de casos de burnout. Esse fenômeno é impulsionado pela lógica de hiperprodutividade e pela obsessão pelo desempenho, características centrais do capitalismo tardio.
O filósofo Byung-Chul Han, em Sociedade do Cansaço, descreve a sociedade moderna como uma "sociedade do desempenho", onde o sucesso é medido pela otimização constante das capacidades individuais. Essa mentalidade prejudica o equilíbrio, colocando o autoaperfeiçoamento acima do bem-estar físico e mental.
A exaustão, resultante da busca incessante por produtividade, desvaloriza o descanso e o ócio, refletindo-se em altos índices de ansiedade, depressão e burnout.
O impacto dessa lógica se estende a todas as esferas da vida, especialmente no ambiente de trabalho. A era digital, com suas redes sociais e a pressão por manter uma imagem impecável, intensifica a sensação de cansaço, criando um estado de alerta contínuo que dificulta o descanso. A pandemia de COVID-19 exacerbou essa pressão, dando origem à "fadiga pandêmica". A "sociedade do cansaço" não é uma responsabilidade exclusiva dos empregadores, mas também dos próprios trabalhadores, que internalizam expectativas de desempenho e associam seu valor à produtividade.
A "sociedade do cansaço" é um fenômeno que afeta diversas profissões essenciais à sociedade. Médicos, enfermeiros, advogados, juízes e outros profissionais são constantemente desafiados por pressões externas e internas que os empurram para além dos seus limites. O impacto disso na saúde mental e física desses trabalhadores é alarmante e pode comprometer a eficiência dos serviços prestados.
Esse fenômeno se reflete de maneira particularmente preocupante no setor jurídico, onde advogados lidam com uma combinação de sobrecarga de trabalho e pressão psicológica, o que intensifica a exaustão. A advocacia, essencial para o sistema jurídico, exige grande dedicação, com a responsabilidade de lidar com casos complexos e a pressão constante por resultados.
Esse desgaste é agravado pela cultura de longas jornadas e alta exigência de produtividade, criando um ambiente propenso à exaustão física e mental. Além disso, índices elevados de depressão, ansiedade e burnout entre os advogados comprometem tanto a saúde dos profissionais quanto a qualidade da Justiça.
Da mesma forma, na advocacia pública, o cenário é semelhante. A sobrecarga de trabalho e a pressão por resultados rápidos, especialmente diante da judicialização excessiva, criam um ambiente de estresse e exaustão. Juízes e promotores também enfrentam altos níveis de pressão, devido à exigência de decisões rápidas e eficazes, o que resulta em um desgaste considerável.
Contudo, a "sociedade do cansaço" não se limita ao campo jurídico. Profissionais de outras áreas, como os da saúde, enfrentam desafios semelhantes, com a sobrecarga de trabalho, a pressão por resultados rápidos e a constante exposição a situações de grande impacto emocional. No contexto da saúde, especialmente entre os profissionais que integram a rede Ebserh (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares), esse fenômeno tem se tornado um problema crescente.
A Ebserh gerencia hospitais universitários públicos em diversas regiões do Brasil, e os profissionais de saúde que ali atuam, como médicos, enfermeiros, técnicos e demais colaboradores, enfrentam desafios únicos. Esses hospitais são centros de referência no atendimento a pacientes em situações de alta complexidade, o que impõe uma carga emocional intensa sobre os profissionais.
A pandemia de COVID-19, com seu impacto devastador sobre o sistema de saúde, agravou ainda mais a situação desses profissionais. A constante sobrecarga de trabalho, a escassez de recursos materiais e humanos e o enfrentamento diário de situações críticas contribuíram para um quadro de exaustão extrema. Além disso, a alta demanda por atendimento médico e a responsabilidade emocional de lidar com casos graves geram um desgaste psicológico significativo, afetando tanto a saúde mental dos profissionais quanto a qualidade do atendimento prestado.
Para enfrentar esse problema, é fundamental implementar medidas estruturais e culturais que promovam um ambiente de trabalho equilibrado e saudável. Programas de apoio psicológico, a criação de políticas que valorizem o equilíbrio entre vida pessoal e profissional, e a utilização de tecnologias para otimizar processos e reduzir a carga de trabalho são ações essenciais para preservar a saúde dos profissionais e garantir a qualidade dos serviços prestados à sociedade.
2 Desafios e Possíveis Soluções
O enfrentamento dos desafios impostos pela "sociedade do cansaço" no campo jurídico exige a implementação de medidas estruturais e culturais eficazes para proteger o bem-estar dos advogados e profissionais do direito, tanto no setor público quanto no privado. É fundamental criar programas de apoio psicológico contínuo, como serviços permanentes de acompanhamento e workshops sobre saúde mental e técnicas de gerenciamento de estresse. Essas iniciativas são essenciais para identificar sinais precoces de burnout e evitar o agravamento de problemas de saúde mental, respeitando a dignidade e a integridade dos profissionais.
Além disso, é necessário fomentar uma cultura organizacional que valorize o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional. Isso pode ser alcançado com a implementação de políticas que flexibilizem as jornadas de trabalho, bem como programas de capacitação focados em gestão do tempo e redução de estresse. Incentivar hábitos saudáveis, como boa alimentação, sono adequado e atividades físicas regulares, também é essencial, pois contribui diretamente para o bem-estar físico e mental dos profissionais.
A tecnologia pode ser uma aliada importante nesse processo, pois permite a automação de tarefas repetitivas e administrativas, liberando os advogados para se concentrarem em questões mais complexas e estratégicas. O uso de inteligência artificial, por exemplo, pode diminuir significativamente o tempo dedicado a atividades burocráticas, reduzindo o desgaste e aumentando a produtividade.
Na advocacia pública, a situação exige uma reavaliação profunda das práticas institucionais. Ampliar o número de advogados e fornecer recursos adequados, como equipes de apoio técnico e jurídico, são medidas essenciais para equilibrar a carga de trabalho e evitar o esgotamento causado pela excessiva judicialização e pelo grande número de processos. Como destaca Barroso (2018), a advocacia pública é fundamental para a defesa do interesse público e para o fortalecimento do Estado Democrático de Direito, e para isso, os advogados precisam de condições adequadas de trabalho.
Além disso, no Judiciário, é possível adotar algumas soluções para mitigar o estresse entre juízes e promotores. A revisão das metas do CNJ, tornando-as mais flexíveis e levando em consideração a complexidade dos processos, pode reduzir a pressão sobre os profissionais sem comprometer a eficiência do sistema. A ampliação das equipes de apoio e a implementação de uma reforma estrutural no sistema judicial, com maior estímulo à mediação e conciliação, também podem contribuir para aliviar a sobrecarga de trabalho e reduzir o número de processos.
Investir na qualidade de vida dos profissionais do direito não é apenas uma questão de saúde ocupacional, mas uma estratégia essencial para garantir a eficiência e a qualidade do sistema de justiça. A "sociedade do cansaço" impõe desafios significativos, mas existem soluções viáveis e eficazes que, se aplicadas de forma coordenada, podem transformar o ambiente de trabalho no campo jurídico.
Essa reflexão, no entanto, não se limita ao campo jurídico. A "sociedade do cansaço" atinge uma série de outras profissões, principalmente aquelas que envolvem trabalho intenso e alta demanda emocional, como na saúde, educação e tecnologia. Profissionais da saúde enfrentam jornadas extenuantes e estresse constante, lidando com vidas humanas, o que agrava ainda mais o desgaste físico e emocional. Médicos, enfermeiros e outros trabalhadores da saúde têm suas condições de trabalho frequentemente prejudicadas pela sobrecarga e falta de recursos adequados, o que pode impactar diretamente a qualidade do atendimento prestado e a saúde desses profissionais.
Da mesma forma, na educação, professores e outros educadores estão sendo cada vez mais exigidos a manter altos padrões de desempenho, lidar com grandes turmas e atender a uma variedade de demandas pedagógicas e sociais. O aumento da carga de trabalho e da pressão por resultados tem gerado um aumento nos índices de burnout entre os profissionais da educação.
No setor tecnológico, a pressão por inovação constante, a alta competitividade e a demanda por produtividade em um ritmo acelerado também têm gerado altos níveis de estresse. Profissionais da área de TI, desenvolvedores e designers, por exemplo, são frequentemente sobrecarregados com prazos curtos e a necessidade de estar sempre atualizados, o que pode levar à exaustão.
Por fim, é fundamental que escritórios, órgãos públicos, associações profissionais e empresas de diversos setores trabalhem juntos para criar ecossistemas de trabalho mais equilibrados e saudáveis. Só assim será possível garantir que os profissionais desempenhem suas funções com excelência, sem sacrificar sua saúde e qualidade de vida, e assegurar que os sistemas de justiça, saúde, educação e outros continuem a operar de maneira eficaz, justa e alinhada aos princípios democráticos.
Conclusão
O fenômeno da "sociedade do cansaço" nas carreiras jurídicas exige uma reflexão profunda e ações imediatas. A exaustão mental e emocional não só afeta os profissionais individualmente, mas compromete também a qualidade do trabalho e a saúde do ambiente organizacional como um todo. Reconhecer os sinais de burnout e adotar estratégias eficazes de prevenção e cuidado é essencial para garantir que os advogados possam continuar a exercer suas funções de forma eficiente e saudável. Somente com um compromisso coletivo, que envolva profissionais, instituições e políticas públicas, será possível criar uma cultura de trabalho mais equilibrada e sustentável na advocacia, que beneficie tanto os profissionais quanto os clientes.
Para reduzir os efeitos dessa sobrecarga, é fundamental que escritórios de advocacia e instituições públicas implementem uma abordagem integrada, que valorize o bem-estar dos profissionais. A criação de políticas de saúde mental, o uso inteligente de tecnologias para otimizar o trabalho e a redistribuição de tarefas são medidas indispensáveis para proteger a saúde física e emocional dos advogados. Essas ações não são apenas questões de saúde ocupacional, mas são essenciais para assegurar a eficiência e a qualidade do sistema de justiça.
No entanto, essa reflexão sobre o impacto da "sociedade do cansaço" não se limita ao campo jurídico. Profissões como as da saúde, educação, e outras áreas de alto desgaste também enfrentam desafios semelhantes. Médicos, enfermeiros, professores e policiais, entre outros, convivem com jornadas intensas e pressão constante, que, assim como na advocacia, podem resultar em esgotamento físico e mental. O cuidado com a saúde dos profissionais dessas áreas deve ser encarado de maneira holística, por meio de políticas de apoio psicológico, ajustes nas demandas de trabalho e a adoção de tecnologias que aliviem a carga repetitiva e mecânica.
Ao tratar a exaustão como um desafio estrutural, e não meramente individual, as diversas profissões podem evoluir para ambientes de trabalho mais saudáveis, produtivos e equilibrados. Isso permitirá que os profissionais desempenhem suas funções com excelência, sem prejudicar sua saúde ou vida pessoal. Dessa forma, não só a advocacia, mas também outras áreas essenciais à sociedade poderão continuar cumprindo sua missão de forma eficaz, com profissionais mais preparados e equilibrados, aptos a enfrentar os desafios de suas profissões e a atender às necessidades da sociedade de maneira justa e humana.
Referências
ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2014.
BARROSO, Luís Roberto. _O Novo Constitucionalismo: Singularidade, Racionalidade e Legitimidade_. São Paulo: Saraiva, 2018.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição Da República Federativa Do Brasil. Diário Oficial da União, Brasília/DF, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 18 out. 2024.
CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2018.
COCO, Vivian. A prevalência do estresse e da angústia na advocacia. 22/09/2022. https://www.migalhas.com.br/depeso/373706/a-prevalencia-do-estresse-e-da-angustia-na-advocacia. Acesso em: 18 out. 2024.
DIDIER JR., Fredie. O exercício da advocacia e seus desafios. Salvador: JusPodivm, 2015.
GOMES, Joaquim Leonel. _Advocacia e Tecnologia: O impacto da inovação no mercado jurídico_. São Paulo: FGV Direito SP, 2019.
GOMES, Luiz Flávio. A ética na advocacia. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013.
HAN, Byung-Chul. _Sociedade do Cansaço_. Petrópolis: Vozes, 2017.
HELOANI, Roberto. _Assédio moral: o trabalho entre o medo e a resistência_. São Paulo: Editora Contexto, 2003.
Krill, Patrick R. JD, LLM; Johnson, Ryan MA; Albert, Linda MSSW. The Prevalence of Substance Use and Other Mental Health Concerns Among American Attorneys. Disponível em: https://journals.lww.com/journaladdictionmedicine/Fulltext/2016/02000/The_Prevalence_of_Substance_Use_and_Other_Mental.8.aspx. Aceso em: 18 out. 2024.
LÔBO, Paulo. O advogado e a advocacia. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
OLIVON, Beatriz. Transtorno mental é principal causa de afastamento do trabalho. 28/10/2019. Disponível em: https://valor.globo.com/legislacao/noticia/2019/10/28/transtorno-mental-e-principal-causa-de-afastamento-do-trabalho.ghtml. Acesso em: 18 out. 2024.
ORGANIZAÇÃO Mundial da Saúde (OMS). ( 1946 ), “Constitution of the World Health Organization”. Disponível em http://apps.who.int/gb/bd/pdf/bd47/en/constitution-en.pdf , consultado em 17/10/2024.
ORGANIZAÇÃO Mundial da Saúde (OMS). ( 2001 ), Relatório sobre a saúde no mundo 2001: Saúde mental: nova concepção, nova esperança . Biblioteca da OMS.
Saúde mental da advocacia: Por que é preciso falar sobre o assunto? 04/04/2024. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/quentes/358283/saude-mental-da-advocacia-por-que-e-preciso-falar-sobre-o-assunto. Acesso em: 18 out. 2024.
WASHINGTONPOST. The happiest-jobs-on-earth. Disponível em: https://www.washingtonpost.com/business/2023/01/06/happiest-jobs-on-earth/. Acesso em: 18 out. 2024.
WOLF, Christiane; SERPA, J. Greg. Mindfulness para redução do estresse no ambiente de trabalho. São Paulo: Gente, 2018.
Advogada Pública com atuação em Direito Administrativo, Cível e Trabalhista, e na área da saúde. Graduada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC Minas. Pós-graduada, com especialização em Direito Público (Direito Constitucional) e Privado (Direito Civil). MBA em Licitações e Contratos.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MELO, Juliana Melissa Lucas Vilela e. Impactos da Sociedade do Cansaço na Atualidade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 28 nov 2024, 04:43. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigo/67148/impactos-da-sociedade-do-cansao-na-atualidade. Acesso em: 12 dez 2024.
Por: Isnar Amaral
Por: LEONARDO RODRIGUES ARRUDA COELHO
Por: REBECCA DA SILVA PELLEGRINO PAZ
Por: Isnar Amaral
Precisa estar logado para fazer comentários.