Coautora: IGÉSIA ROCHA BARRETO: Servidora Pública.e Pós-Graduada pela Unisul Graduada Pela Universidade Tiradente
Nas últimas décadas a família passou por diversas transformações, podendo-se afirmar que hoje o que forma a família é o amor e o afeto. Com essa evolução, ao invés da prole, o que une o um casal é o amor. Assim, “casais” não precisam necessariamente ter sexo diferentes. É comum hoje a família formada por pai ou mãe e filhos, a família formada por irmãos, a família formada por avós e netos e porque não a família formada por dois homens ou duas mulheres, sem filhos, com filhos de um deles ou até mesmo por filhos adotivos?
É chegado o momento dos operadores do direito, de um modo geral, perceberem que não há como conceituar o afeto em rol taxativo, como o direito positivado o faz. Se a sociedade evolui, suas formas de relacionamento assumem novas feições, cabe ao direito, enquanto ciência, abrigá-las em prol da própria dignidade da pessoa humana.
Como bem diz Giselda Hironaka “mudam os costumes, os homens e a história só não muda a atávica necessidade de cada um saber que, em algum lugar, se encontra o seu porto e seu refúgio, vale dizer o seio de sua família. (Família e casamento em evolução: Direito Civil: estudos. Belo Horizonte: Del Rey, 2000, p. 21).
A família é a base da sociedade e antes da Constituição Federal de 1988, era considerada como legal apenas aquela família oriunda do casamento. Após a Constituição Federal de 1988, se passou a reconhecer a união estável e a família monoparental, fato que instigou os juristas, pois se permitiu aos cidadãos brasileiros o exercício do direito de constituir família, seja ela de forma natural, artificial, ou por adoção.
Essa institucionalização da família monoparental veio reforçar a tese de que o homossexual tem direito à adoção, pois a Carta Magna nem a discriminou, já que tem como princípio fundamental a proibição a qualquer tipo de discriminação, bem como não a afastou, o que faz concluir que o homossexual em momento algum pode ter negado este direito.
Vale ressaltar que o art. 5°, inciso II, da Constituição Federal dispõe que ninguém pode ser obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. Portanto, não se pode deixar de permitir a adoção, porque isso estaria contrariando o direito da criança de ter um lar com afeto.
Não há nenhuma norma na Constituição Federal, no Código Civil ou mesmo no Estatuto da Criança e do Adolescente que proíba a adoção por um casal do mesmo sexo que viva em harmonia. Se vedado não o é, deve ser permitido.
Ao contrário, a constituição proíbe qualquer forma de discriminação, bem como faz uma opção ampla e irrestrita pelo asseguramento à criança e ao adolescente do direito à vida, à educação, à saúde, à alimentação, ao lazer, à profissionalização, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, como se verifica no art. 227, sendo certo que o Brasil também ratificou, em 24.09.90, a Convenção Sobre os Direitos da Criança (e que assim está integrada ao ordenamento jurídico, conforme o disposto, também no art. 5º, da CF), onde se levam em consideração "os interesses superiores da criança" e se privilegia a colocação de crianças, temporariamente ou permanentemente privadas de seu ambiente familiar, em lares de adoção e, supletivamente, em instituições adequadas de proteção.
Verifica-se, portanto, que a opção constitucional brasileira é absolutamente democrática, abominando qualquer forma de discriminação e privilegiando a proteção à criança e a adoção, quando essa criança esteja privada da convivência com os seus genitores naturais. Entretanto, conquanto absolutamente protetiva tal legislação, a mente dos brasileiros ainda não foi modificada e a ela adaptada.
O “pré-conceito” insta, portanto, que se permita ainda decisões fortemente inconstitucionais que indeferem a adoção a algumas pessoas, meramente apenas motivada na opção sexual do adotante ou no caso de pleitos realizados pelo casal homoafetivo com a equivocada “impossibilidade jurídica do pedido”, argumento frágil, que retrata o fato de muitos magistrados não saberem lidar com o novo, deixando de ampliar, desta forma as condições de cidadãos dos homossexuais, crianças e adolescentes.
O Estatuto da Criança e do Adolescente dispõe os requisitos necessários para adoção, são ele: ser maior de vinte e um anos, ser dezesseis anos mais velho que o adotado, ser capaz e, caso o adotante seja tutor ou curador, este deve de antemão prestar contas de sua administração.
Quanto à adoção conjunta, o ordenamento jurídico exige a estabilidade da família, ou seja, que os adotantes convivam em união estável ou sejam casados (art. 42 do ECA).
O único obstáculo que se vislumbra na concessão da adoção a casais homoafetivos é a regra disposta no art. 1.622 que diz que ninguém pode ser adotado por duas pessoas, salvo se for marido e mulher, “ou se viverem em união estável”. Argumento este facilmente resolvido e superado, se for atribuída uma interpretação finalística ao preceito de acordo com os princípios constitucionais da igualdade e da vedação da discriminação por orientação sexual. Ademais, entendemos que a expressão legal deve ser compreendida , para efeito de adoção, as uniões homoafetivas, desde que sejam estáveis, respeitáveis, duradouras, formando os parceiros uma família.
Não se vislumbra no ordenamento jurídico brasileiro (ECA ou Código Civil) nenhuma vedação, explícita ou implícita, para que um casal homoafetivo adote. O essencial é que o Adotante tenha indoneidade moral, apresente disposição e capacidade para assumir os encargos decorrentes da paternidade ou maternidade adotiva.
É importante lembrar que, apesar de não haver uma lei que diga expressamente que é possível a adoção por casais homoafetivos, esse direito pode ser concedido baseado em princípios constitucionais. Não existe uma base legal, mas o direito brasileiro, felizmente, está construindo uma sólida jurisprudência, graças a pessoas que abrilhantam o nosso judiciário, permitindo que adoção seja realizada por companheiros homoafetivos.
Assim, cabe evidenciar que os motivos que levam a resistência da adoção homoafetiva não é legal, mas moral, sejam fatores religiosos, históricos ou simplesmente preconceitos desprovidos de argumentos.
Após exposto os argumentos legais, o argumento fático utilizado no combate a adoção por casais homoafetivos, é que a mesma representaria uma forte influência na orientação sexual do adotado, que tenderia a ser também homossexual. Argumento em sua amplitude improcedente! Não tem nenhum embasamento científico que indique que os filhos seguem as preferências sexuais dos pais, e a grande prova é que a maioria dos homossexuais são filhos de casais heterossexuais e por questão de lógica todos nasceram de um ato heterossexual.
O Estado democrático de Direito só será completo quando, na prática e na legalidade estiver garantido o direito a equidade entre heterossexuais e homossexuais, inclusive na adoção.
Referências Bibliográficas
BRASIL, Vade Mecum. Organização de PINTO Antônio Luiz de Toledo; WINDT, Márcia Crstiana Vaz dos Santos; CÉSPEDES, Lívia. 6.º Ed. Atual e ampl. São Paulo; Saraiva, 2010.
DIAS, Maria Berenice. União Homossexual – Aspectos sociais e jurídicos. In: Revista de Direito de Família n.4 –Porto Alegre: Síntese, IBDFAM, 2000.
HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Família e Casamento em envolução: estudos. Belo Horizonte: Del Rey, 2000.
PEREIRA, Rodrigo da Cunha. A Sexualidade vista pelos Tribunais. Belo Horizonte: Del Rey, 2001.
Precisa estar logado para fazer comentários.