Dr. DIOGO RUDGE MALAN
(orientador)
RESUMO: Este trabalho propõe-se, por meio do desenvolvimento de pesquisa teórica e jurisprudencial, analisar a novidade legislativa introduzida pelo “Pacote Anticrime” do artigo 492, do Código de Processo Penal, alínea “e”, inciso I, que prevê a possibilidade de prisões imediatas logo após a condenação pelo Tribunal de Júri a pena igual ou superior a 15 (quinze) anos de reclusão. Para tanto, preliminarmente, delimitar-se-ão os antecedentes históricos da presunção de inocência e sua consolidação no ordenamento jurídico interno. Em um segundo momento, se buscará compreender a origem e o contexto do surgimento do Tribunal do Júri, bem como os efeitos decorrentes da garantia constitucional da soberania de seus veredictos. Por último, se analisará, finalmente, a compatibilidade da novidade legislativa com a Constituição Federal e o Sistema Internacional de Direitos Humanos.
Palavras-chave: Soberania dos Veredictos; Tribunal do Júri; Pacote Anticrime; Presunção de inocência; Execução Provisória
ABSTRACT: This study aims to analyze, through the development of theoretical and jurisprudential research, the legislative novelty introduced by the Brazilian “Anti-Crime Package” on section 492 of the Brazilian Code of Criminal Procedure, subsection I, clause “e”, which grants the possibility of immediate arrests shortly after the condemnation by trial of Jury to a penalty equal to or greater than 15 (fifteen) years of imprisonment. Thus, preliminarily, it is delimited the historical antecedents of the presumption of innocence and its consolidation in the domestic legal system. Subsequently, it is reasoned the origin and context of the emergence of the trial by Jury, as well as the effects arising from the constitutional guarantee of the sovereignty of its verdicts. Conclusively, it is analyzed the compatibility of the legislative novelty with the Brazilian Federal Constitution and the International Human Rights.
Keywords: Sovereignty of Verdicts; Trial by Jury; Brazilian Anti-Crime Package; Presumption of innocence; Provisional Execution
Seja na lógica das relações tecnológicas, midiáticas, trabalhistas e até mesmo interpessoais, o imediatismo configura-se como o atual modus operandi da sociedade contemporânea. Nesse sentido, através da internalização de um verdadeiro senso de urgência individual, busca-se, cada vez mais, afastar quaisquer obstáculos que dificultem o alcance instantâneo de uma pretensão, mesmo que, para isso, torne-se necessário abrir mão de caminhar por vias mais seguras.
Quando os vetores jurídicos e sociais se somam na direção da celeridade a qualquer custo, a força resultante dessa equação resulta na busca desenfreada de mecanismos aptos a tornar o processo cada vez mais sumário. Com a temerária transposição dessa lógica para a seara processualista penal, julgamentos são precipitados e, cada vez mais, garantias de tratamento do acusado são comprometidas.
Nesse sentido, objetiva-se, através da presente pesquisa, investigar não apenas as origens, mas também os impactos decorrentes dessa busca desenfreada pela aceleração no âmbito da execução da pena. Em específico, pretende-se analisar a novidade legislativa introduzida pelo “Pacote Anticrime” do art. 492, inciso I, alínea “e”, do Código de Processo Penal, que prevê a possibilidade de prisões imediatas logo após a condenação pelo Tribunal de Júri a pena igual ou superior a 15 (quinze) anos de reclusão.
Tendo em vista o foco analítico legal do presente trabalho, o método da abordagem a ser realizado, pautar-se-á, sobretudo, em uma revisão bibliográfica a partir de aportes doutrinários e jurisprudenciais, a fim de verificar a compatibilidade da novidade legislativa introduzida pela lei nº 13.964/2019 no CPP com a Constituição Federal e o Sistema Internacional de Direitos Humanos, bem como questionar sua adequação interna com o próprio sistema acusatório processual penal atualmente vigente.
Ocorre que, antes de adentrar especificamente na temática da validade jurídica do art. 492, inciso I, alínea “e”, do CPP, urge necessário que haja o prévio entendimento do panorama normativo e doutrinário acerca da interpretação da presunção de inocência, bem como sua compatibilização com a soberania do Júri.
Teria o processo penal se tornado mero refém de clamores sociais que pugnam pela execução de penas instantâneas? O veredicto condenatório poderia mitigar garantias asseguradas pela Lei Maior? Seria possível vislumbrar, na prática, a coexistência da presunção de inocência e da garantia constitucional da soberania do Júri? Existem fundamentos aptos a sustentar a prevalência absoluta dos veredictos em quaisquer casos? Ou, de maneira inversa, seria factível anular uma condenação proferida pelo Conselho de Sentença em nome da presunção de inocência?
No intento de alcançar respostas fidedignas para tais questionamentos, o presente trabalho, ao menos em sua fase introdutória, buscará analisar o direito processual a partir de uma filtragem constitucional e convencional, bem como revisitar autores clássicos da seara penalista e, ao mesmo tempo, confrontá-los com entendimentos mais modernos e críticos a fim de afastar-se de qualquer viés pré-definido acerca de uma posição em relação ao tema.
Especificamente, no primeiro capítulo, busca-se esmiuçar a garantia constitucional da presunção de inocência, revisitando seu âmbito assecuratório e analisando suas origens, tanto no âmbito do ordenamento pátrio, como internacional, e, sobretudo, sua relação com a prisão processual. Para melhor contextualização da sua aplicação concreta, serão analisados especificadamente 3 (três) momentos determinantes da Suprema Corte: (i) Habeas Corpus nº84.078-7/MG; (ii) Habeas Corpus nº 126.292/SP; (iii) e, por fim, o julgamento conjunto das ADCs nº 43,44, 54, realizados em 2019, em que restou consignado, por maioria dos votos, a impossibilidade do início do cumprimento da pena antes do efetivo trânsito em julgado da sentença condenatória.
Em relação à análise documental da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF)[1] acerca da execução provisória da pena, a metodologia aqui empregada pautar-se-á, sobretudo, na estruturação de uma base de dados a partir de uma análise crítica dos votos dos Ministros do STF, cujo teor foi extraído através de pesquisa do acervo jurídico digital disponibilizado pelo próprio Tribunal.[2]
No segundo capítulo do presente trabalho, buscar-se-á compreender a origem e o contexto do surgimento do Tribunal do Júri no ordenamento jurídico pátrio, bem como os princípios formadores da instituição, com uma análise centralizada nos efeitos decorrentes da garantia constitucional da soberania dos veredictos e a competência exclusiva para julgamento dos crimes dolosos contra a vida. Em seguida, será traçado um breve panorama acerca da estrutura bipartida do Tribunal e os fundamentos que justificam a existência de um reforço assecuratório a partir de uma filtragem prévia e da previsão excepcional de um juízo rescindente pela Corte de Apelação.
Por último, na terceira seção do presente trabalho, será possível examinar como a temática das prisões antes do trânsito em julgado vem se desenvolvendo no âmbito do STF, e, sobretudo, qual a tendência de entendimento a ser seguida pelo Pleno do Tribunal acerca da temática. Finalmente, será viável analisar a constitucionalidade e a convencionalidade da novidade legislativa introduzida pelo “Pacote Anticrime” no artigo 492, inciso I, alínea “e”, do Código de Processo Penal. [3]
Em primeiro plano, importante salientar que, ao adentrar na temática referente a evolução histórico-principiológica, o presente estudo não pretende realizar uma análise típica de manuais, tampouco compreender a historicidade a partir de uma ótica linear progressista. Na verdade, busca-se abordar a evolução da presunção de inocência a fim de entender de que maneira o princípio teria, de fato, se consolidado em determinados momentos políticos.
Sem dúvidas, os ideais de igualdade e liberdade, intrínsecos ao Iluminismo pós-Revolução Francesa, foram responsáveis por fornecer inovadores contornos limitadores à atuação repressiva do Estado no âmbito penal e permitir, ainda que de modo incipiente, o desenvolvimento gradual de princípios democráticos e garantias individuais. De acordo com Zanoide de Moraes, essa nova perspectiva foi responsável, em última análise, por revolucionar todo o sistema de justiça criminal, na medida em que modificou a própria forma de tratamento do acusado no decurso de seu processo.[4]
No âmbito internacional, em consonância a garantia dos direitos individuais do cidadão, o princípio da presunção de inocência foi expressamente positivado como regra de tratamento no artigo 9º da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, que determinava que todo homem deveria ser considerado presumidamente inocente até ser declarado culpado.[5]
Em 1948, o princípio adquiriu status de direito humano fundamental, na medida em que passou a ser consagrado no artigo 11.1 da “Declaração Universal dos Direitos do Homem”[6] como forma de protesto após os horrores nazifascistas vivenciados na Segunda Guerra Mundial. Embora sem força legal, Gomes destaca a força política da DUDH, bem como sua influência para consolidação do Tratado Internacional sobre Direitos Civis e Políticos de 1966, que além de consagrar a presunção de inocência em seu artigo 14,2, dispôs acerca da garantia do duplo grau de jurisdição a partir da necessidade de reavaliação da sentença por órgão jurisdicional diferente daquele que a proferiu, conforme o artigo 14,5 do dispositivo.[7]
Posteriormente, em 1969, ainda em consonância com a garantia consagrada em 1948 pelas Nações Unidas e no cabimento da prisão preventiva apenas como medida excepcional, a Convenção Americana de Direitos do Homem (Pacto de San José da Costa Rica), que foi incorporada no direito interno brasileiro a partir do Decreto Federal nº 678/92[8], dispôs em seu art. 8.2 que, enquanto a culpa não for legalmente comprovada, o indivíduo acusado de cometer um determinado delito deve ser presumidamente inocente.[9]
É interessante observar que, além da expressa previsão acerca da presunção de inocência, a Convenção Americana de Direitos do Homem (CADH) também implementou a atuação de uma Corte Internacional de Direitos Humanos (Corte IDH) e uma Comissão Internacional de Direitos Humanos (CIDH) para garantir, de fato, um mecanismo eficiente para aferir o cumprimento da Convenção por parte dos países signatários, bem como ensejar eventuais responsabilizações internacionais pelas suas violações de direitos humanos.
Com efeito, em decorrência da ratificação do Pacto de São José da Costa Rica e, dez anos mais tarde, do expresso reconhecimentos da competência obrigatória da Corte[10], nos termos do Decreto nº 4.463/02, o Brasil encontra-se sujeito ao monitoramento e, inclusive, ao próprio julgamento pela Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH), que se constitui como “órgão Judiciário autônomo” [11], na medida em que, além de emitir opiniões consultivas aos países signatários, exerce também uma competência contenciosa, nos termos dos artigos 62 e 63 da CADH.[12]
1.2 O desenvolvimento da presunção de inocência a partir da construção jurisprudencial e interpretativa da Corte IDH e da CIDH
1.2.1 O paradigmático caso Suárez Rosero vs. Ecuador[13]
Trata-se de importante caso submetido à Corte pela CIDH, oriundo de uma demanda movida contra o Estado Equatoriano em razão de suposta violação a determinados artigos da CADH.[14] O julgado, sem dúvidas, constitui relevante marco jurisprudencial em matéria de prisão cautelar, na medida em que, além de sistematizar os princípios fundamentais para o desenvolvimento processual, considerou a presunção de inocência como razão de ser de todas as demais garantias judiciais asseguradas pela Convenção e, além disso, capaz de nortear a excepcionalidade das prisões processuais.[15]
Em 23 de junho de 1992, sem ordem emitida por uma autoridade competente e fora das circunstâncias necessárias para um flagrante, Rafael Ivan Suárez Rosero foi preso por policiais equatorianos, em razão de suspeita de seu envolvimento com organização internacional de narcotraficantes. Ademais, em violação a própria Constituição do Equador, foi mantido incomunicável por 35 dias e, somente 49 dias após sua restrição de liberdade, teve sua prisão preventiva formalmente decretada por uma autoridade competente.
Inicialmente, a defesa do acusado se manifestou pela necessidade da revogação da sua prisão preventiva e, após sucessivas denegações do pedido, impetrou um habeas corpus em face da Corte Suprema de Justiça do Equador. Contudo, somente em 1996, quase 4 anos após sua prisão ter sido ilegalmente decretada, a Corte concedeu a liberdade ao acusado.
Após seu julgamento, Rosero foi condenado à pena privativa de liberdade de dois anos e a uma multa de dois mil salários-mínimos, em decorrência do cometimento do crime de ocultação de tráfico ilícito de entorpecentes. Destaca-se, ainda, que a decisão consignou que o tempo que o acusado permaneceu preventivamente em cárcere seria comutado no cumprimento de sua pena.
A Corte IDH, além de reafirmar o caráter de excepcionalidade da prisão processual, assentou que, em tais casos, a restrição de liberdade somente se justificaria diante da necessidade de assegurar a eficácia do desenvolvimento das investigações e a ação da justiça. Assim, ao contrário do argumento ventilado pela defesa Estatal, não é possível sustentar eventual relativização e, em decorrência disso, o próprio esvaziamento de uma garantia processual sob o fundamento da alegada gravidade em concreto do delito imputado. Nesse sentido:
“Esta Corte estima que en el principio de presunción de inocencia subyace el propósito de las garantías judiciales, al afirmar la idea de que una persona es inocente hasta que su culpabilidad sea demostrada. De lo dispuesto en el artículo 8.2 de la Convención se deriva la obligación estatal de no restringir la libertad del detenido más allá de los límites estrictamente necesarios para asegurar que no impedirá el desarrollo eficiente de las investigaciones y que no eludirá la acción de la justicia, pues la prisión preventiva es una medida cautelar, no punitiva. Este concepto está expresado en múltiples instrumentos del derecho internacional de los derechos humanos y, entre otros, en el Pacto Internacional de Derechos Civiles y Políticos, que dispone que la prisión preventiva de las personas que hayan de ser juzgadas no debe ser la regla general (art. 9.3). En caso contrario se estaría cometiendo una injusticia al privar de libertad, por un plazo desproporcionado respecto de la pena que correspondería al delito imputado, a personas cuya responsabilidad criminal no ha sido establecida. Sería lo mismo que anticipar una pena a la sentencia, lo cual está en contra de principios generales del derecho universalmente reconocidos.” (GRIFOS NOSSOS)
Por fim, além de considerar o redimensionamento da prisão provisória de Rosero como uma forma de antecipação do cumprimento da sua pena, a Corte declarou, por unanimidade, que o Estado do Equador também violou o direito à integridade pessoal do acusado (art.5), direito à liberdade pessoal (art.7) e a própria proteção judicial prevista na Convenção no art. 25.
Posteriormente, esse entendimento proferido pela Corte seria, felizmente, reiterado em diversas decisões subsequentes. Em decorrência disso, é possível observar que a Corte IDH construiu uma forte jurisprudência acerca da excepcionalidade das prisões temporárias em nome da presunção de inocência. Nesse sentido: Tibi vs. Ecuador[16], Acosta Calderón vs. Ecuador[17], Lori Berenson Mejía vs. Peru[18], Ricardo Canese vs. Paraguai.[19]
1.2.2 Informe nº 35/07 e 86/09: caso Peirano Basso vs. Uruguai
No que se refere ao âmbito da atuação da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), a temática envolvendo o uso arbitrário das prisões processuais também se desenvolveu consideravelmente a partir de orientações e recomendações aos países signatários da Convenção. Como um dos mais importantes informes emitidos pela Comissão, destaca-se o informe nº 35/07, em que a CIDH aprofundou a temática referente a prisão processual e modificou sua posição acerca das limitações existentes. Contudo, embora tenha sido aprovado em 2007, o informe não foi publicado à época pela CIDH, que, somente em 2009, por meio do informe 86/09[20], tornou pública a decisão envolvendo o caso dos irmãos uruguaios.
Trata-se do caso Peirano Basso vs. Uruguai, em que 3 irmãos (Jorge, José e Dante Peirano Basso) foram presos em 08 de agosto de 2002 pelo cometimento de delitos econômicos durante a gestão do Banco de Montevideo. Seus sucessivos pedidos de concessão de liberdade foram indeferidos pela Suprema Corte Uruguaia sob o fundamento da gravidade concreta envolvendo os delitos a eles imputados, bem como da repercussão social gerada pelo caso. Os irmãos permaneceram privados de suas liberdades por mais de quatro anos, até que, finalmente, em outubro e novembro de 2004, as denúncias foram encaminhadas para apreciação da CIDH. Somente em 19 de outubro de 2006, foram formalmente acusados pelo crime de insolvência societária fraudulenta.
Destaca-se que, até 2007, as prisões processuais pautadas em circunstâncias subjetivas, como o clamor público e a grande periculosidade, vinham sendo admitidas no âmbito dos informes proferidos pela CIDH. Contudo, é possível observar que esse posicionamento foi integralmente modificado através do Informe nº 35 de 2007.
No caso, em consonância a jurisprudência da Corte no julgamento do paradigmático caso Suárez Rosero vs. Ecuador, a CIDH ressaltou que, em regra, a garantia da presunção de inocência não impõe a privação de liberdade dos acusados, tendo em vista que a prisão cautelar consiste em uma medida excepcional e não pode ser confundida com uma execução antecipada da pena. Nesse sentido, destacou a necessidade de os países signatários da Convenção definirem um limite plausível para a duração de uma eventual prisão processual excepcional, eis que a “duração excessiva do encarceramento neste período faz surgir um risco de inversão ou desvirtuamento do sentido da presunção de inocência, convertendo tal medida cautelar em verdadeira pena antecipada.”
Ademais, como corolário decorrente do princípio “pro homine”, a CIDH destacou a necessidade das limitações que envolvam a temática dos direitos humanos serem restritivamente aplicadas. Em decorrência disso, a interpretação acerca da prisão cautelar deve pautar-se, sobretudo, em otimizar o exercício do direito de liberdade do acusado enquanto esse não for considerado culpado.[21]
Destaca-se que, embora a Corte já tivesse proferido entendimentos anteriores acerca da factibilidade da prisão provisória a partir de justificativas substancialistas[22], considerou, nesse informe, que independentemente da grande repercussão pública envolvendo o caso em questão, ou mesmo da sua alegada gravidade em concreto, a espécie de delito imputado não pode configurar-se como fundamento apto a justificar a restrição provisória de liberdade no decurso processual. Nesse sentido:
A Comissão ainda assevera que, em nenhuma hipótese, poderá a lei interna dos Estados-partes excluir os acusados de determinadas espécies de infração penal do direito à liberdade durante o processo ou investigação preliminar, com base em critérios subjetivos, tais como “alarme social”, “repercussão social” e “periculosidade”. Estes critérios subvertem a natureza cautelar da prisão, transformando-a em verdadeira pena antecipada. Ademais, violam o princípio da igualdade, despojando pessoas de seu direito à liberdade em razão de percepções sociais que não são passíveis de demonstração.
Em síntese, é possível vislumbrar a existência de uma verdadeiro “corpo de doutrina”[23] acerca da temática envolvendo a restrição provisória da liberdade e o desenvolvimento da garantia da presunção de inocência no âmbito dos órgãos da CADH.
1.3 O desenvolvimento do princípio no direito brasileiro
Antes de adentrar especificamente no estudo relativo à presunção de inocência no ordenamento jurídico pátrio, o presente trabalho considera imprescindível uma abordagem das peculiaridades inerentes a tradição jurídica institucional brasileira e de que maneira o autoritarismo impactou na absorção do princípio pelo direito interno. Isso, porque conforme será exposto, a construção de uma narrativa romântica de superação imediata do passado totalitário pela “virada” democrática de 1988, além de ignorar a perpetuação de diversos ranços autoritários cobertos pelo manto popular da nova Constituinte, também não considera a vigência do Código Processual Penal de 1941, elaborado sob a conjuntura repressiva do Estado Novo e diretamente influenciado pela ideologia fascista do Código Rocco de 1930.
1.3.1 Escola Técnico – Jurídica
Em contraposição ao modelo liberal de processo penal da Escola Clássica Italiana, os postulados decorrentes da visão técnico jurídica do processo penal ganharam cada vez mais força no âmbito do direito interno Italiano. Na exposição de Motivos do Código de Processo Penal (LGL 1941/8), por exemplo, havia uma expressa aversão à presunção de inocência do réu. Alfredo Rocco destacava que, durante o decurso processual, o indiciado não deveria ser tratado como culpado, tampouco como inocente. Deveria, na verdade, em nome da própria lógica jurídica existente, ocupar uma posição neutra de indiciado.[24]
De acordo com Vincenzo Manzini, jurista responsável pela elaboração do Código Penal Italiano de 1930, a presunção de inocência, na verdade, tratar-se-ia de um mero “garantismo não justificado”, tendo em vista que, ao assegurar excessivos direitos para aqueles que violaram a lei, seria, em última análise, responsável por promover a impunidade e desordem social. Assim, a partir da premissa de uma verdadeira “presunção de culpa”, Manzini defendia que não seria factível e tampouco racional sustentar a prevalência de um princípio que vai de encontro a própria natureza das coisas, eis que, na prática, a maior parte dos réus seriam considerados culpados após o término dos seus processos criminais.[25] No mesmo sentido, para Ferri, a extensão da presunção de inocência deveria ser graduada de acordo com o caso concreto, sendo certo, portanto, que possuiria uma dimensão mínima diante de casos de flagrância ou confissão, por exemplo.
Sem dúvidas, a partir do breve panorama anteriormente traçado, é possível verificar que o desenvolvimento do processo penal Italiano se deu sob moldes totalitários e, portanto, aversivos aos direitos e garantias individuais do acusado. Assim, o que, de consequência se depreende, é que, mesmo após o término da segunda guerra mundial e, consequentemente, do perecimento do regime fascista até então vigente, as heranças ideológicas da escola técnico jurídica influenciariam a Constituição Italiana de 1947.
Verifica- se, portanto, que a presunção de inocência não foi expressamente disposta no texto da Lei Maior Italiana, tendo em vista que, na verdade, o constituinte originário se limitou a determinar no artigo 27.2 que: “o imputado não é considerado culpado senão depois da condenação definitiva”. Embora parcela da doutrina considere que o artigo em questão consagrou uma mera formulação de não culpabilidade ao indiciado[26], a melhor interpretação do dispositivo, entretanto, pauta-se na máxima: “qui decid de uno, negat de altero”, ou seja, a partir do momento que a Constituição Italiana determinou a impossibilidade de considerar o imputado culpado, o que, de consequência se depreende, é que a Lei Maior o considerou como inocente.[27]
1.3.2 Influxos da doutrina de “não culpabilidade” no direito interno brasileiro.
Sob a égide da Constituição Brasileira de 1937, a concentração de poderes no Executivo era legitimada a partir da adesão a um discurso de natureza política pautado, sobretudo, na garantia de uma autoridade Estatal e restauração de uma ordem pública durante o Estado Novo. De acordo com Francisco Campos, Ministro da Justiça da Era Vargas, a densidade da justiça de uma sociedade seria diretamente proporcional ao rigor atinente a sua administração e ao uso da autoridade pública. Em síntese, a justiça seria sinônima de Estado, na medida em que o próprio Estado se confundiria com a Justiça.[28]
Nessa conjuntura, buscava-se, por conseguinte, justificar uma reforma processual pautada em um modelo predominantemente inquisitorial, em que a insuficiência probatória implicaria, em última análise, na afirmação da culpabilidade do réu. No mais, adentrando-se a análise do item II da Exposição de Motivos do Código de Processo Penal brasileiro, é possível observar um evidente viés autoritarista, tanto pela referência expressa a Escola Positiva Italiana, como também pela previsão de uma inflação na ação repressiva do Estado contra “os que delinquem”.[29]
Alinhado a essa ideologia, em sua redação original, o art. 312 do CPP de 1941, por exemplo, determinava como obrigatória a prisão preventiva para os crimes cuja pena máxima abstratamente cominada fosse igual ou superior a 10 anos de reclusão. Para Diogo Malan, tratar-se-ia de uma prisão com fins meramente extraprocessuais, na medida em que não se revestia de qualquer finalidade cautelar, sendo somente uma forma de punição antecipada daqueles que a justiça criminal considerava presumidamente culpado. [30]
Somente com a constitucionalização e democratização do Processo Penal Brasileiro, foi consagrado, nos termos do artigo 5º, LVII da Constituição Federal, que: “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória”. Ocorre que, tal como o art. 27.2 da Constituição Italiana, não havia expressamente uma disposição acerca da “presunção de inocência”.
Para Gomes[31], longe de tratar-se de um mero descuido do constituinte originário, a redação do dispositivo foi propositadamente elaborada para incitar dúvidas acerca da intepretação e extensão adequada do seu conteúdo. Assim, ao atribuir ao indiciado um simples status de “neutralidade” durante o desenvolvimento do seu processo penal, buscou-se, sobretudo, restringir o alcance máximo das garantias individuais decorrentes da presunção de inocência a partir de uma redação propositalmente dúbia.
Contudo, a doutrina da “não culpabilidade” oriunda de uma interpretação de cunho meramente literal, além de ser facilmente descontruída a partir de uma interpretação sistemática da Constituição Federal de 1988, não se coaduna com o preceito constitucional ventilado pelo artigo 8.2 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, que dispõe expressamente acerca da presunção de inocência como garantia individual de toda pessoa acusada de cometer um determinado delito. [32]
Não se pode ignorar que o segundo parágrafo do art.5 da CF/88[33] estabelece uma cláusula de recepção aos Tratados Internacionais em que o Brasil for parte. Assim, embora o Pacto de São José da Costa Rica[34] seja anterior a Emenda nº 45, de acordo com o entendimento proferido no julgamento do Recurso Extraordinário nº 466.343/SP, trata-se de norma com status supralegal, sendo, portanto, parâmetro de controle convencional em relação a legislação infraconstitucional.[35]Assim, a partir do Decreto Federal nº 678/92[36], responsável por promulgar a CADH, é possível inferir que a “presunção de inocência” trata-se de um princípio expresso no ordenamento jurídico interno, responsável por assegurar a liberdade e capaz de limitar a arbitrariedade de juízos condenatórios potencialmente precipitados.
Como consequência disso, a legislação infraconstitucional passou a limitar a prisão do acusado presumidamente inocente as hipóteses excepcionais de flagrante delito, prisão temporária e prisão preventiva. Tal garantia, como afirma Aury Lopes, constitui um verdadeiro marco na superação do papel do indivíduo como mero objeto e na sua transformação enquanto parte no âmbito do processo. Dessa forma, o princípio se configura, na prática, como uma opção ideológica fruto da evolução civilizatório de um processo penal acusatório e, em última análise, sua observância funciona como um verdadeiro termômetro apto a indicar a eficácia garantista do sistema processual.[37]
Adverte-se, entretanto, que a transposição da tradição jurídica autoritária italiana criou profundas raízes na legislação infraconstitucional brasileira, na doutrina, na jurisprudência e até mesmo na própria política criminal vigente. A ideologia da “presunção de culpa” ainda permeia, mesmo que indiretamente, diversos institutos processuais e a própria jurisprudência dos Tribunais pátrios.
1.4 A natureza jurídica da presunção de inocência
1.4.1 As “supergarantias” decorrentes da dimensão formal
Em decorrência da inserção no rol de direitos e garantias individuais do art. 5 da CF/88, a constitucionalização da presunção de inocência passou, por conseguinte, a ser dotada daquilo que Gomes denominou de “supergarantias”.[38] Assim, além do preceito ter aplicação imediata, força vinculatória em relação a todos os poderes existentes na ordem constitucional e constituir-se como garantidor do direito líquido e certo de acesso ao Poder Judiciário, também é responsável, em última análise, pelo controle de constitucionalidade da legislação infraconstitucional.
1.4.2 A dimensão principiológica
Como princípio político fundante do processo penal liberal[39], a presunção de inocência, ou o “princípio da não culpabilidade”[40], pode ser vislumbrado a partir de dimensões que, embora distintas, são intrinsecamente correlacionadas para concretizar a garantia constitucionalmente assegurada.
1.4.2.1 Norma de tratamento
A partir de uma leitura do princípio da presunção de não culpabilidade como regra de tratamento, seja durante o curso do processo penal, ou extra processualmente, há uma verdadeira “situação jurídica de inocente” que culmina, sobretudo, em um dever estatal de observância de regras específicas em relação ao acusado, que não poderá ser tratado como se culpado fosse, enquanto não houver o trânsito em julgado da sua sentença penal condenatória.[41]
O que, de consequência se depreende, é que somente de modo excepcional, o réu responderá ao processo preso, sendo vedado, portanto, prisões processuais automáticas, bem como a execução antecipada de sua eventual condenação criminal.
Nessa esteira, de acordo com as lições de Eugênio Pacceli de Oliveira, essa dimensão implica em um dever estatal de observância de regras específicas em relação ao acusado, que deve ser tratado como inocente. Em síntese, pode-se dizer que, na visão do autor, a presunção se traduziria como verdadeiro esforço ativo do magistrado a fim de interpretar o processo para que a prisão processual seja, de fato, a ultima ratio, para garantir o resultado útil processual.[42]
Como corolário decorrente dessa dimensão, eventuais investigações e processos que não estejam finalizados não poderão servir de base para caracterização de um “mau antecedente” do réu, tampouco serem valorados de modo negativo na aferição da “conduta social” ou da própria “personalidade” do acusado.[43] Alinhado a esse raciocínio, a Suprema Corte já proferiu diversos entendimento acerca da necessidade de processos em curso serem considerados neutros na aferição da dosimetria da pena pelo magistrado e, inclusive, durante o julgamento do Recurso Extraordinário nº. 591.054, com repercussão geral reconhecida, fixou tese nesse mesmo sentido. [44]
Ainda inserido no âmbito de tratamento do acusado, mas sob a óptica da dimensão externa ao processo criminal, Aury Lopes leciona sobre a necessidade de preservação da figura do investigado ante a publicidade abusiva e a estigmatização precoce propiciada pela espetacularização da mídia em torno do fato criminoso. Assim, pode-se inferir que o princípio também está intrinsicamente correlacionado a garantia constitucional da dignidade e da própria privacidade do acusado.[45]
1.4.2.2 Norma probatória
Além de uma regra de tratamento do acusado, não há, ainda, como deixar de abordar a dimensão da presunção de inocência responsável por fornecer os contornos probatórios no desenvolvimento processual. Importante frisar que, no âmbito penal, diferentemente do processo civil, não há distribuição de cargas probatórias, na medida em que, em decorrência do princípio da presunção de inocência, o ônus da prova recai exclusivamente sobre a acusação durante a instrução processual. [46]
Nesse sentido, além de consagrar uma inversão em relação ao ônus da prova, o princípio da presunção de inocência foi responsável, em última análise, pela alteração do próprio objeto probatório, que passou a ser a imputação do indiciado.[47] Assim, não há mais como vislumbrar factível um desenvolvimento processual pautado em confirmar informações obtidas no curso do inquérito policial ou mesmo em investigar eventuais escusas alegadas pelo réu em sua defesa. Em síntese, o que compete a acusação, na verdade, é a demonstração inequívoca dos fatos e o elo da participação do réu.
Destaca-se, ainda, que, nos termos do art. 8 da Convenção Americana, esse conteúdo probatório deve ser produzido dentro dos limites legais e padrões constitucionalmente previstos, eis que pode ser responsável por ensejar uma futura condenação. Assim, o procedimento probatório não pode admitir provas ilícitas e deve desenvolver-se em consonância aos corolários decorrentes da previsão de um contraditório efetivo. Em resumo, não há espaço para ir além da lei sob o pretexto de comprovar uma culpa.
Por fim, também é importante salientar que, em decorrência da norma de presunção de inocência, não é possível obrigar que o acusado colabore para a apuração dos fatos, já que o ônus da prova recai exclusivamente sobre a acusação durante a instrução processual.[48] Nesse sentido, o direito ao silêncio, além de norma constitucionalmente assegurada pelo art. 5, inciso LXIII, da CF/88[49], também pode ser vislumbrado como uma consequência da manifestação do princípio da presunção de inocência no âmbito probatório, eis que a participação do acusado como sujeito processual deve limitar-se a perspectiva da sua própria defesa.
1.4.2.3 Norma de julgamento
Há a considerar, ainda, que a acepção da presunção de inocência como regra do tratamento implica, sob a perspectiva do magistrado, em uma regra de julgamento a partir do preceito jurídico do “in dubio pro réu”. Assim, tendo em vista a necessidade de certeza, diante de eventuais dúvidas acerca dos fatos levados a juízo, caberá ao juiz decidir da forma que se apresente mais favorável ao réu. [50]
Nesse sentido, em qualquer fase processual, de acordo com as lições apresentadas por Renato Brasileiro, ante a existência de dúvidas que impliquem na impossibilidade de descontruir a presunção relativa de não culpabilidade, não há qualquer injustiça em uma ponderação do magistrado que privilegie a absolvição do réu e preservação de sua inocência. Em síntese, um juízo probatório válido deve ser, em última análise, sinônimo de certeza. [51]
No mais, para Aury Lopes, o dever de motivação das decisões judiciais é responsável por traduzir, na prática, a concretização da óptica probatória e da dimensão de julgamento do princípio da presunção de inocência. Isso, porque na visão do autor, somente com a exposição dos fundamentos e a razão de decidir, é possível demonstrar a suficiência probatória apta a tornar factível a condenação de um réu no âmbito de seu processo criminal. [52]
Em síntese, seja como dever de tratamento do acusado, norma probatória ou verdadeira regra de julgamento, é possível inferir, portanto, que a presunção de que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença condenatória” configurar-se-ia, em última análise, como um mecanismo apto para igualar as partes diante de um processo penal historicamente marcado por fortes traços e heranças inquisitoriais. [53]
1.5 A relativização como necessidade cautelar
Sem dúvidas, ao dispor acerca do direito fundamental do indivíduo de ser considerado inocente até o seu julgamento definitivo, a Constituição Cidadã de 1988 representou verdadeira conquista popular em relação a força opressiva Estatal. Entretanto, o dispositivo constitucional também foi responsável por assegurar o interesse da coletividade, na medida em que dispôs acerca da possibilidade de restrição da liberdade ante a presença concreta dos requisitos autorizadores da prisão cautelar.
Em síntese, apesar do trânsito em julgado da sentença penal condenatória configurar-se, nos termos do artigo 5, inciso LVII, da CF/88, como um requisito necessário para desconstituição da presunção relativa de inocência, é plenamente factível a restrição da liberdade a fim de garantir a manutenção da ordem pública, econômica, ou até mesmo a fim de assegurar a aplicação da lei, nos termos exigidos pelo art. 312 do CPP, com redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019.[54]
Como bem circunscreveu Gustavo Badaró[55], tal excepcionalidade constitucional não ostenta uma pena antecipada, tampouco é capaz de assegurar a função de imediata retribuição ou prevenção da pena. Trata-se, na verdade, de situações em que a privação de liberdade se configura como mecanismo assecuratório da aplicação da lei penal. Logo, é possível vislumbrar a coexistência das prisões preventivas e temporárias, nos termos do art. 283 do CPP[56], com o princípio da presunção de inocência, desde que, de fato, a hipótese seja excepcional.
Contudo, de acordo com Aury Lopes, não se pode ignorar que a visão supramencionada de “excepcionalidade constitucional” das prisões cautelares não se coaduna na prática. Vale dizer que, com a banalização da urgência, a própria liberdade individual tornou-se provisória e a excepcionalidade das prisões antes do trânsito em julgado se transformou na regra do processo penal. Com efeito, o que de consequência se depreende é que tais prisões tornaram-se uma medida tipicamente de polícia com fins de “proteção da segurança pública”, sem qualquer caráter cautelar.[57]
Trata-se, sobretudo, de uma resposta Estatal aos anseios imediatistas populares a partir de um sopesamento simplista pautado na prevalência do “interesse público” em relação a liberdade individual. Para Fonseca[58] esse tipo de resposta demonstra um caráter precipuamente simbólico com a finalidade de reestabelecer a confiança da população nas instituições do sistema de Justiça criminal. Nesse sentido, na visão do autor, a sanção seria dirigida, em última análise, aos próprios cidadãos comuns.
1.6 Execução antecipada: a temerária artimanha jurisprudencial
Não obstante o tema da banalização das prisões cautelares seja uma temerária ameaça contemporânea a efetividade da presunção de inocência, o cenário da execução antecipada da prisão-pena a partir da decisão condenatória de segundo grau demonstra-se ainda mais problemático. Isso, porque mesmo que analisada sob o âmbito abstrato, tais prisões não ostentam natureza preventiva e sequer possuem qualquer previsão constitucional ou convencional.
Em síntese, encontram-se em um verdadeiro limbo jurídico, na medida em que não podem ser classificadas como prisões cautelares e nem como prisões decorrentes do trânsito em julgado da sentença condenatória.
Aqui, vale ressaltar que o presente trabalho não busca questionar a constitucionalidade das prisões cautelares, tampouco defende a tese de que ninguém poderá ser preso antes do trânsito em julgado da sentença condenatória. Na verdade, a questão a ser aqui analisada se refere a prisão de um acusado que não se enquadra como preso preventivo, ou seja, não oferece perigo ao resultado útil do processo ou a própria sociedade. Questiona-se, portanto, a possibilidade da execução antecipada da pena antes do trânsito em julgado.
É importante enfatizar, ainda, que a temática vem se desenvolvendo no âmbito dos tribunais superiores a partir de idas e vindas jurisprudenciais: ora entendendo pela sua constitucionalidade, ora pela sua inconstitucionalidade. Como destaca Bittencourt[59], embora a Jurisprudência não seja uma fonte formal e imediata de normas penais incriminadoras, a intepretação oriunda das decisões judiciais é responsável por dizer o que é o próprio direito, sendo, muitas vezes, concretamente mais representativa, significativa e, sobretudo, mais relevante que um diploma legal estático. Interpretar seria, portanto, sinônimo de descobrir o real significado, sentido e o alcance de uma norma jurídica.
Por conseguinte, o presente trabalho busca, a partir do prisma da presunção de inocência, analisar os argumentos e pressupostos utilizados pelos Ministros da Suprema Corte do país nos seguintes julgamentos: (i) Habeas Corpus nº 84.078/MG[60]; (ii) Habeas Corpus nº 126.292/SP[61]; (iii) e, por fim, o julgamento conjunto das ADCs nº 43,44, 54, em que restou consignado, por maioria dos votos, a impossibilidade do início do cumprimento da pena antes do efetivo trânsito em julgado da sentença condenatória.[62]
Até o ano de 2009, prevalecia o entendimento nas duas turmas do STF de que a prisão processual seria plenamente compatível com a garantia da presunção de inocência[63], tendo em vista a ausência de efeito suspensivo dos recursos especiais e extraordinários, nos termos do revogado art. 27, §2º, da Lei nº 8.038/90[64] e do art. 618 do CPP[65].
Ocorre que, em 2009, é possível observar uma verdadeira guinada jurisprudencial de 180º acerca da temática. No julgamento do Habeas Corpus nº 84.078-7/MG, sob a relatoria do Ministro Eros Grau, o Supremo Tribunal Federal (STF) revisou seu entendimento e, por sete votos a quatro, consolidou orientação no sentido de que a prisão antes do trânsito em julgado somente poderia ser decretada a título cautelar.
Na ocasião, tratava-se de réu condenado em segunda instância pela prática do crime previsto no artigo 121, § 2º, I e IV, c/c o artigo 14, II do Código Penal, que teve sua liberdade restringida no decurso do processo penal, sem, contudo, preencher os requisitos necessários para uma eventual prisão preventiva. Inicialmente, o paciente impetrou habeas corpus perante o Superior Tribunal de Justiça, sob o fundamento de que a restrição de sua liberdade carecia de fundamentos e consistiria, em última análise, em verdadeira punição antecipada. Denegada a ordem pelo STJ, foi impetrado o Habeas Corpus nº 84.078/MG perante o STF.
Para o Ministro Joaquim Barbosa, em nome da própria efetividade processual e legitimidade das decisões, seria possível a execução da pena privativa de liberdade após o exaurimento das instâncias ordinárias de jurisdição. De acordo o Ministro, aqueles que defendem o contrário ignoram a própria credibilidade e aptidão dos demais tribunais para proferir decisões condenatórias. Para sustentar sua tese, Barbosa considerou, ainda, o estado de impunidade que seria propiciado pelo manejo de recursos meramente protelatórios, visando, precipuamente, ao reconhecimento da prescrição da pretensão executória. Em síntese, de acordo com o Ministro, aguardar eternamente o marco do trânsito em julgado da sentença condenatória seria, em última análise, sinônimo de frustrar a prestação de uma tutela jurisdicional, de fato, efetiva.
Nessa esteira, o Ministro ressaltou, ainda, que, além de não existir qualquer garantia absoluta de um duplo grau de jurisdição, não há como vislumbrar a exigência de um “triplo grau” para tornar factível a execução da sentença. Assim, na visão de Barbosa, na medida em que os recursos extraordinários e especiais não possuem eficácia suspensiva processual, não haveria qualquer comprometimento do princípio constitucional da presunção de inocência com a determinação de cumprimento de pena após o julgamento do recurso de apelação. Nesse mesmo sentido, com fundamentação similar, posicionaram-se os Ministros Menezes Direito, Cármen Lúcia e Ellen Gracie.
Em contraponto, o Relator, Ministro Eros Graus, considerou que, embora o artigo 637 do Código de Processo Penal estabeleça a ausência de efeito suspensivo do recurso extraordinário, a Lei de Execução Penal[66], que se sobrepõe temporal e materialmente ao referido artigo, determina o trânsito em julgado como marco obrigatório para tornar factível execução da pena, seja restritiva de direitos ou privativa de liberdade. Inclusive, o próprio Supremo, em ocasiões posteriores[67], já havia se posicionado pela impossibilidade de prisões antes do trânsito em julgado no que se refere as penas restritivas de direito, que são, indubitavelmente, menos severas que as privativas de liberdade.
O Relator estabeleceu-se, ainda, o entendimento de que a execução antecipada de uma pena comprometeria não apenas a presunção de inocência, mas também o próprio direito a ampla defesa do réu, que deve ser preservado em todas as fases do processo, inclusive após o julgamento da apelação. Nesse mesmo sentido, nas lições apresentadas no voto do Ministro Marco Aurélio, não seria factível vislumbrar um esvaziamento gradativo da presunção de inocência com o avanço do processo, tendo em vista que, até o momento exato do trânsito em julgado, o peso da presunção deve ser conservado por inteiro.
Por todo o exposto, no julgamento do HC 84.078/MG, finalizado em 05 de fevereiro de 2009, o Supremo Tribunal Federal concluiu, nos termos do voto do Relator, Ministro Eros Grau, acompanhado pelos Ministros Celso de Mello, Marco Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes, que a execução antecipada da pena antes do trânsito em julgado violava a garantia constitucional da presunção de inocência, razão pela qual não deveria ser aceita em nosso ordenamento jurídico ou autorizada pela Jurisprudência do Supremo.
1.6.2 Habeas Corpus nº 126.292/SP
Todavia, a posição da Suprema Corte foi novamente modificada em 2016, na apreciação do Habeas Corpus nº 126.292/SP, de relatoria do Ministro Teori Zavascki, em que restou consignado, sem comprometimento do princípio da presunção de inocência, a possibilidade de execução provisória de acordão prolatado em recurso de apelação, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário. Nesse sentido:
CONSTITUCIONAL. HABEAS CORPUS. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA (CF, ART. 5º, LVII). SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA CONFIRMADA POR TRIBUNAL DE SEGUNDO GRAU DE JURISDIÇÃO. EXECUÇÃO PROVISÓRIA. POSSIBILIDADE. 1. A execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência afirmado pelo artigo 5º, inciso LVII da Constituição Federal. 2. Habeas corpus denegado. (STF, Pleno, HC 126.292/SP, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado: 17/02/2016; publicado: 16/05/2016).
Em breve síntese, o caso em questão envolvia um paciente condenado pela prática do crime previsto no art. 157, 2º, I e II do CP, que, buscando recorrer em liberdade e atacar ordem de prisão expedida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, impetrou o remédio constitucional no STJ. Contudo, seu pedido liminar foi indeferido pelo Presidente do Tribunal, o Ministro Francisco Falcão, sob o fundamento de que além de o habeas corpus não se constituir como da via adequada, não havia qualquer flagrante de ilegalidade na ordem de prisão emanada. Posteriormente, o paciente impetrou o HC em face do STF a fim de atacar a referida decisão.
Nos termos do voto do Relator, o Ministro Teori Zavascki, embora a presunção de inocência seja um “postulado civilizatório” responsável por assegurar um direito fundamental processual ao réu, seria plenamente factível a execução provisória da pena. Isso, porque para o jurista, após o julgamento do recurso de apelação e concretização da garantia do duplo grau de jurisdição, a condenação em segundo grau representaria um verdadeiro “juízo de culpabilidade”, não havendo, portanto, qualquer necessidade de atingir o marco do trânsito em julgado.
O Ministro sustentou, ainda, que eventuais recursos especiais ou extraordinários, nos termos do art. art. 637 do Código de Processo Penal, não possuem efeitos suspensivos e, portanto, não obstariam o cumprimento da sentença. Para reforçar seu entendimento, remeteu-se ao Direito Comparado de países em que é possível a execução provisória da pena, como Inglaterra, Estados Unidos e Alemanha[68], bem como fez alusão ao próprio entendimento sumulado pela Corte Suprema nas Súmulas 716[69] e 717[70].
Outro fundamento trazido pelo voto do Relator pautou-se na própria natureza dos recursos extraordinários e especiais, que não se destinam a reanálise fática de determinada sentença condenatória proferido por um juízo ad quem, tampouco visam a assegurar um duplo grau jurisdicional, já que tratam de “questões de direito” com necessária repercussão geral. Em decorrência disso, não haveria, portanto, qualquer fundamentação apta a suspender eventual execução de uma sentença ante a preclusão fática simultânea a determinação de responsabilidade criminal pelas instancias ordinárias.
Por fim, o Ministro reiterou a necessidade de ponderar o princípio constitucional da presunção de inocência com a necessidade de buscar a efetividade do sistema criminal e pugnou pela tese da factibilidade da execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário. Denegou, portanto, o remédio constitucional impetrado pelo paciente.
No mesmo sentido, destaca-se o entendimento proferido no voto do Ministro Luís Roberto Barroso, que considerou a necessidade de esgotamento recursal para execução da pena como (i) incentivo ao manejo de recursos meramente protelatórios aptos a promover a impunidade e suscitar o descrédito da justiça criminal por toda a sociedade; (ii) responsável por fortalecer a seletividade do sistema penal, na medida em que é reservada aos que detém mais recursos para a contratação de advogados melhores. Para o Ministro, além do percentual irrisório de provimento dos recursos extraordinários, há um trânsito em julgado da facticidade com o esgotamento da via recursal ordinária.
Em conclusão, sustentou que, embora a Jurisprudência anteriormente consolidada no âmbito do STF seja no sentido da inconstitucionalidade da execução provisória da sentença condenatória, a alteração da realidade social enseja, de forma urgente, a necessidade de reinterpretar a presunção de inocência sob a égide da efetividade da lei penal. Para o Ministro, a partir da proporcionalidade, seria possível concluir pelo esvaziamento gradual da presunção de inocência no decurso processual e pela necessária prevalência da garantia da efetividade após o exaurimento das instancias ordinárias. Nesse sentido:
“Há, desse modo, uma ponderação a ser realizada. Nela, não há dúvida de que o princípio da presunção de inocência ou da não culpabilidade adquire peso gradativamente menor na medida em que o processo avança, em que as provas são produzidas e as condenações ocorrem. Por exemplo, na fase pré-processual, quando há mera apuração da prática de delitos, o peso a ser atribuído à presunção de inocência do investigado deve ser máximo, enquanto o peso dos objetivos e bens jurídicos tutelados pelo direito penal ainda é pequeno. Ao contrário, com a decisão condenatória em segundo grau de jurisdição, há sensível redução do peso do princípio da presunção de inocência e equivalente aumento do peso atribuído à exigência de efetividade do sistema penal. É que, nessa hipótese, já há demonstração segura da responsabilidade penal do réu e necessariamente se tem por finalizada a apreciação de fatos e provas.”
Em contraposição, para os Ministros Rosa Weber e Celso de Mello não seria possível afastar a exigência do trânsito em julgado para início do cumprimento da sentença condenatória. Para sustentar a manutenção dessa tese, ambos os juristas retomaram os fundamentos já ventilados pelo Ministro Eros Grau no julgamento do HC 84.078 e destacaram a necessidade da preservação do direito fundamental do réu de ser presumido inocente, nos termos do art. 5º, inciso LVII, da CF/88. No mesmo sentido, os Ministros Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio mantiveram seu posicionamento anterior acerca da impossibilidade de esvaziamento gradual da presunção de inocência no decurso das instâncias judiciais.
Contudo, pela maioria dos Ministros do Supremo (Teori Zavascki, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Carmen Lúcia, Dias Toffoli, Luiz Fux, e Gilmar Mendes), restou consignado a factibilidade da execução antecipada da pena após o julgamento do recurso de apelação. Foram vencidos, portanto, os Ministros Rosa Weber, Marco Aurélio, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski.
1.6.3 “Ponderação a brasileira”: Uma análise crítica da decisão proferida no HC 126.292/SP.
De acordo com Ronald Dworkin, a atuação Judiciária deve estar pautada na necessária interpretação da história jurídica anterior, e, consequentemente, deve sujeitar-se ao limite interpretativo fruto da própria coerência narrativa existente. Nesse sentido, tendo em vista a necessidade de compromisso com a redação de um “romance em cadeia” único e, de fato, integrado, não é factível vislumbrar um processo hermenêutico distante do ordenamento jurídico como um todo e dos próprios limites evidentemente intrínsecos do texto interpretado, sob pena dos Ministros da Suprema Corte tornarem-se, em última análise, legisladores constituintes.
Retomando os ensinamentos elucidados pelo filósofo e jurista estado-unidense e projetando-os na análise jurisprudencial, a absoluta ruptura interpretativa da Suprema Corte no HC 126.292/SP, parece estar distante de qualquer compromisso com a integridade do sistema e do necessário exercício de um poder, de fato, contra majoritário e distante dos anseios populares.
Em síntese, a partir de um discurso pautado na ponderação de interesses de densidade distintas, a maioria dos Ministros do Supremo justificou a necessidade de relativização do princípio da presunção de inocência em nome da credibilidade do Judiciário e do próprio sistema penal a partir da criação de um novo conceito de trânsito em julgado. De conseguinte, ter-se-ia um resultado em que, a partir de um viés metajurídico e pragmático, réus poderiam ser presos após o julgamento da apelação.
Nesse sentido, a partir de uma leitura deturpada das lições de Robert Alexy, a tradição jurídica pátria transformou a técnica de ponderação de direitos em um verdadeiro instrumento a serviço de uma doutrina de efetividade. Em síntese, o judiciário brasileiro passou a institucionalizar aquilo que o jurista brasileiro Lenio Streck denominou de “Target Effect”[71]: ou seja, a partir da criação de um “efeito alvo” (combate à impunidade e manutenção de uma ordem social), o “atirador” (intérprete do direito no caso concreto), sempre acerta.
Em decorrência disso, a partir de uma ideologia finalística e em uma ponderação “á brasileira”, decisões passaram a ser proferidas com argumentos políticos unicamente utilitaristas, sem qualquer embasamento constitucional, mas unicamente no desejo incessável de punição a qualquer custo. Não é demais afirmar, portanto, que o Judiciário decidiu remediar o cenário de morosidade no julgamento de recursos a partir da aniquilação de uma cláusula pétrea.
Concorda-se com Hamilton[72], quando ele defende a impossibilidade de ponderar, de um lado, um interesse coletivo (manutenção da ordem pública), e, de outro lado, um interesse individual e concreto (garantia de liberdade do próprio réu). Em resumo, a adoção desse discurso sempre culminaria no inevitável resultado de aniquilação do direito individual em nome da proteção do interesse e ordem pública vigente.
Assim, considerando que o processo penal brasileiro existe à mercê de um projeto democrático e se desenvolve pela busca da eficácia máxima dos direitos e garantias fundamentais do indivíduo[73], o ato decisório não pode ser encarado como mera oportunidade casuística de os julgadores redigirem “contos independentes”, sem conexões internas e correspondências[74], e visando, unicamente, a atender aos anseios populares de punição em prol de apoio decisório a partir de uma ponderação envolvendo interesses de natureza distintas. Vale dizer, não há como atirar a flecha para, somente depois, pintar o alvo em questão. [75]
1.6.4 O julgamento conjunto das Ações Diretas de Constitucionalidade nº43, 44 e 54.
A partir do julgamento do HC 126.292/SP, em que a Jurisprudência do Supremo consignou factível a execução antecipada da pena com base em uma “ponderação a brasileira”, os Tribunais brasileiros passaram a proferir uma série de decisões que reproduziam o entendimento do STF e ignoravam a literalidade do dispositivo legal do artigo 283 do Código de Processo Penal, sem, contudo, suscitar qualquer arguição incidental de sua inconstitucionalidade.
A partir do artigo 283 do CPP, com a redação dada pela Lei nº 12.043/2011, é possível inferir que toda prisão antes do trânsito em julgado da sentença condenatória terá natureza cautelar. Trata-se de uma norma infraconstitucional que reproduz o teor da norma constitucional do art. 5, LVII, da CF/88, sendo, portanto, de “constitucionalidade espelhada”, já que não é possível cogitar a vigência de normas constitucionais inconstitucionais no ordenamento jurídico pátrio.[76]
Ademais, um olhar mais atento para a exposição dos motivos do anteprojeto de lei que ensejou a reforma de 2011, permite inferir que, a finalidade do legislador reformador pautou-se em superar eventuais distorções oriundas do CPP acerca das prisões antes da sentença condenatória transitada em julgado, bem como sistematizar e atualizar o tratamento jurídico das prisões no ordenamento interno a partir do entendimento proferido pela Suprema Corte no julgamento do HC nº 84.078/MG, de relatoria do Ministro Eros Graus.
Nesse sentido, as execuções antecipadas da pena antes do trânsito em julgado da sentença condenatória além de contrariar a literalidade e finalidade do artigo 283 do CPP, violam a cláusula de reserva do plenário no âmbito dos tribunais estaduais e federais, tendo em vista que, ausente decisão de efeito erga omnes acerca do afastamento da constitucionalidade de determinado artigo, a matéria deveria ser enfrentada via arguição do incidente de inconstitucionalidade, nos termos do artigo 97 da CF/88[77], já que que não é possível deixar de aplicar um preceito normativo vigente sem a declaração formal e expressa de sua inconstitucionalidade.
Em meio ao contexto de desarmonia vivenciado pela Suprema Corte, foram apresentadas 3 (três) ações (ADCs nº 43/DF, nº 44/DF e nº 54/DF), de relatoria do Ministro Marco Aurélio, visando à declaração da constitucionalidade do artigo 283 do CPP e, consequentemente, a observação da cláusula de reserva de plenário disposta no artigo 97 da Constituição Federal. Impetrada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados Brasileiros, a ADC de nº 44 expôs em sua petição inicial a grande contradição: como o STF poderá ir de encontro a um dispositivo legal que reproduz o próprio texto constitucional a ser por ele zelado?
Inicialmente, merece destaque o voto proferido pelo Ministro Alexandre de Moraes, que julgou parcialmente procedente as ADCs e defendeu a necessidade de realizar uma interpretação conforme ao art. 283 do CPP, visando, sobretudo, a garantir que o princípio da presunção de inocência esteja em harmonia com o devido processo legal e a eficácia do princípio da tutela judicial efetiva. Dessa maneira, de acordo com o Ministro, suspender a eficácia das condenações proferidas pelos Tribunais de 2º grau e, consequentemente, ignorar a possibilidade de executar a decisão condenatória, seria, em última análise, fulminar o “esquema organizatório funcional” constitucionalmente determinado, em nome da aplicação absoluta e sem qualquer viés proporcional do postulado da presunção de inocência.
No mesmo sentido, para a Ministra Cármen Lúcia, seria necessário reafirmar a própria eficácia da justiça criminal como um todo, que estaria sendo veementemente comprometida por uma crença de impunidade pelo manejo desenfreado de recursos meramente protelatórios pelos réus. Em síntese, de acordo com a Ministra, a possibilidade de executar uma pena provisória não comprometeria o núcleo essencial do princípio constitucional da presunção de inocência.
De igual modo, o Ministro Luís Roberto Barroso considerou que o requisito imposto pela Constituição Federal para decretação da prisão no ordenamento jurídico interno não é o trânsito em julgado da sentença condenatória, mas, na verdade, é a ordem escrita e fundamentada da autoridade competente. Nesse sentido, de acordo com Barroso, com o encerramento das instâncias responsáveis pela análise dos fatos e das provas, defender o adiamento da execução da pena até o trânsito em julgado seria, em última análise, estimular a impunidade e o descrédito da justiça criminal como um todo.
Em contraponto, o Ministro Ricardo Lewandowski defendeu que a presunção de inocência não pode ser alvo de uma interpretação que relativize sua necessária proteção ao réu em nome de uma busca vazia pela efetividade de um sistema penal. Para o Ministro, o julgamento do HC 126.292 consistiu em um verdadeiro retrocesso na Jurisprudência da Corte, na medida em que desconsiderou um verdadeiro pilar constitucional em nome da defesa da execução provisória. Em conclusão, Lewandowski salientou, ainda, que a Constituição não poderá ser considerada uma “mera folha de papel”, sem força normativa e a mercê das forças políticas vigentes.
Assim, o que, de consequência se depreende, é que a preservação do núcleo essencial da presunção de inocência, ressaltada ao longo do voto do Ministro Lewandowski, parece ser a melhor saída para garantir a força normativa da Constituição e assegurar garantias processuais, de fato, efetivas. Em sentido oposto, o entendimento proferido pelos Ministros Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia e Roberto Barroso pautou-se, unicamente, em justificar anseios políticos por meio da prevalência de princípios genéricos, sem quaisquer densidades concretas. Essa problemática, inclusive, foi bem elucidada pelo Ministro Dias Toffoli no julgamento da ADI 4.451/DF a partir do fenômeno da “principiolatria”, em que o intérprete, em detrimento da própria lei, atua como verdadeiro legislador positivo.
Ora, sem dúvidas, a mutação constitucional a partir de uma intepretação conforme a constituição é um fenômeno plenamente factível com os ditames democráticos, na medida em que busca, por meio da hermenêutica, harmonizar o sentido do texto literal com a realidade vigente no momento. Contudo, contrariar os limites semânticos de uma expressão jurídica, fulminar o seu núcleo essencial e transformá-lo em mero produto da sua consciência, deveria, na verdade, ser tratado como uma “mutilação inconstitucional”.
Em 07/11/2019, em um feliz reencontro a orientação que prevalecia até 2009, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu pela procedência do pedido da ADC 43/DF, ADC 44/DF e ADC 54/DF, bem como pela declaração de constitucionalidade do artigo 283 do Código de Processo Penal, que prevê a necessidade de esgotamento recursal para tornar possível o início do cumprimento da pena. Vale dizer, a Suprema Corte entendeu o óbvio: o clamor público e a consciência do intérprete não podem prevalecer sobre a própria autoridade do Direito.
Contudo, a discussão acerca da prisão antecipada não estava finalizada: ganharia novos contornos e ensejaria debates ainda mais intensos.
1.6.5.1 O ataque parlamentar: as PECs n° 199/2019 e nº 5/2019
Imediatamente após o encerramento do julgamento em conjunto das ADCs que declararam a constitucionalidade do artigo 283 do CPP, iniciou-se uma verdadeira “revolta” no âmbito parlamentar em relação ao resultado do julgamento: a busca da viabilidade da execução antecipada tornou-se objeto central de diversas propostas de emendas à constituição.
Destaca-se, nesse sentido, a PEC n° 199/2019[78], elaborada pelo Deputado Federal Alex Manente, para alterar a redação do art. 102 e do art. 105 da Constituição Federal a partir da transformação do recurso especial e extraordinário em ações autônomas revisionais de competência originária do STF e do STJ; bem como a PEC nº 5/2019[79], elaborada pelo Senador Oriovisto Guimarães, para incluir um novo inciso no art. 93 da CF/88, que permitiria, independentemente do cabimento de eventuais recursos, a execução imediata da decisão condenatória emanada por órgãos colegiados.
Não se trata, contudo, de qualquer temática inovadora, eis que em 2018, sob o mesmo pretexto de defesa de ideias abstratos, como o “combate à criminalidade”, o próprio Deputado Federal Alex Manente foi o responsável por apresentar a PEC nº 410, cuja finalidade era promover a alteração do inciso LVII, do art. 5º da Constituição para determinar que: “ninguém será considerado culpado até a confirmação de sentença penal condenatória em grau de recurso”. Ocorre que, diante do conflito existente entre a proposta e a proteção constitucional fornecida pelo constituinte originário as cláusulas pétreas, nos termos do art. 60, §4, da CF/88[80], a PEC não prosperou e foi arquivada.
Assim, de maneira estratégica, parece que tanto a PEC n° 199/2019, como a PEC nº 5/2019, buscaram tornar possível a antecipação da execução da pena, sem que, para isso, fosse necessário interferir diretamente na redação de uma cláusula pétrea. Atualmente ambas se encontram em tramitação e, caso aprovadas, ensejariam, sem dúvidas, uma evidente contradição com aquilo que restou consignado pelos Ministros do STF na ocasião de julgamento das ADCs nº 43/DF, nº 44/DF e nº 54/DF.
1.6.5.2 A tentativa de afastamento da presunção de inocência no Júri
Os ataques a garantia constitucional não se restringiram, contudo, ao âmbito parlamentar. Isso, porque embora o STF tenha declarado a constitucionalidade do artigo 283 do CPP, a possibilidade de execução provisória no âmbito dos processos do Tribunal do Júri tornou-se tema do Recurso Extraordinário 1.235.340 interposto pelo Ministério Público de Santa Catarina contra decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Em síntese, questiona-se: É possível a aplicação da tese proferida no julgamento das ações diretas de constitucionalidade aos julgamentos proferidos pelo Tribunal do Povo? A presunção de inocência e proibição da execução da sentença condenatória ante a pendência recursal se sobrepõem em relação a soberania dos veredictos? As prisões decretas com fundamento unicamente na soberania dos veredictos são legais e excepcionam a presunção de inocência?
Importante destacar, ainda, que a temática já havia sido objeto de reflexão por parte dos Ministros do Supremo na ocasião de julgamento de constitucionalidade do art. 283 do CPP. Por exemplo, o Ministro Dias Toffoli, embora tenha votado pela impossibilidade de executar a prisão-pena antes do exaurimento recursal, ressalvou que, no caso de sentença proferida pelo Tribunal do Júri, em decorrência da soberania de seus veredictos, seria possível excepcionar a exigência constitucional do trânsito em julgado e possibilitar a execução antecipada de condenação recorrível imposta pelo Conselho de Sentença.
Já o Ministro Celso de Mello, em contraposição ao entendimento proferido por Toffoli, entende que seria inaceitável vislumbrar a factibilidade de uma execução provisória, na medida em que o pronunciamento proferido pelo Júri não se reveste de intangibilidade jurídico processual, tampouco é dotado de caráter absoluto.
Sem dúvidas, a temática envolvendo a execução no âmbito do Júri é merecedora de atenção máxima, na medida em que envolve o julgamento de crimes cometidos contra a vida, o mais importante direito fundamental, nos termos do art. 5 da CF/88. Assim, para responder a esse grande imbróglio suscitado pela soberania dos veredictos e entender os fundamentos que embasaram a dissonância entre os Ministros do Supremo, urge necessário, portanto, considerar as peculiaridades inerentes a Instituição do Júri no Capítulo II do presente estudo.
2.1.1 O embrião do tribunal do povo
A busca pela origem do tribunal popular é assunto controverso no âmbito doutrinário. Segundo Diogo Malan, retomando as lições apresentadas por Rogério Lauria Tucci, o embrião da instituição do Júri já poderia ser vislumbrado em Roma, no segundo período evolutivo do seu processo penal, como resposta ao autoritarismo exacerbado dos magistrados provinciais no desenvolvimento e condução do procedimento penal. Nesse sentido, em substituição ao antigo processo comicial romano, anteriormente exercido pelo Senado por meio de um sistema de “assembleias do povo”, emergiu nova modalidade de processo acusatório de natureza pública consubstanciado nas quaestiones perpetuae.[81]
Embora previstas inicialmente para funcionar de modo temporário, em decorrência da tipificação prévia dos crimes em leis próprias e da fixação de uma competência específica para cada tribunal, as quaestiones adquiriram caráter permanente ao longo da história romana e passaram a ganhar cada vez mais espaço. Nesse sentido, para Tucci, pode-se dizer que a instituição já previa, ainda que de modo incipiente, o princípio da reserva legal, segundo o qual não há crime sem lei anterior que o defina. [82]
Em regra, com a nova modalidade de processo e julgamento, todo cidadão romano poderia propor uma acusação dirigida ao quaesitor, que além de exercer um juízo de procedibilidade a partir do exame da acusação, também era responsável pela preparação da composição do Tribunal, apuração dos votos dos jurados (iudices iurati) e pronunciamento do julgamento. Conforme observa Tucci, a sentença era emitida pelo quaesitor com base no respeito absoluto ao voto dos jurados, que eram sorteados para representar o povo romano e, de modo geral, seu veredicto não se sujeitava a qualquer tipo de revisão em razão da soberania existente.[83]
Em síntese, seja pela sua composição popular, escolha aleatória dos jurados, divisão das funções entre juiz e jurados, possibilidade de recusa dos jurados pelas partes envolvidas, e, sobretudo, pela soberania das decisões, as quaestiones perpetuae, sem dúvidas, forneciam ares de uma justiça aparentemente representativa. Soma-se a isso, a forte ligação ao princípio da reserva legal e a introdução de um sistema acusatório a partir do fortalecimento da segurança jurídica.
Ocorre que, na prática, essa narrativa de legitimidade popular não encontrava respaldos. Como bem elucidado por Barros[84], a realidade demonstrava o afastamento da representação do povo nas sessões de julgamento, tendo em vista que o corpo de jurados era majoritariamente composto pela elite da sociedade romana. Soma-se a isso, o fato de que, além da formulação de acusação ser restrita a determinada parcela da população, a condução processual era competência exclusiva do “quaesitor”, cidadão romano investido de poderes para o exercício de um juízo de procedibilidade acerca da acusação recebida.
Por fim, torna-se importante destacar que, embora parte da doutrina sustente que o embrião do Tribunal do Povo encontre-se no segundo período evolutivo do processo penal romano, é inegável que o Júri, tal como conhecido atualmente, teve seus contornos estruturais definidos na Inglaterra, em 1215, após a proibição dos sistemas das Ordálias pelo IV Concilio de Latrão. Nesse sentido, de acordo com José Frederico Marques, a exigência do julgamento pelos pares era uma forma de proteção contra as acusações arbitrárias da Coroa e possuía, inclusive, expressa previsão no artigo 39 da Magna Carta.[85]
2.1.2 O desenvolvimento do princípio no direito brasileiro
Independente da dissonância doutrinária acerca da origem do Tribunal do Povo, Lenio Streck[86] destaca que, no Brasil, o Tribunal do Júri configura-se como instituição anterior à própria independência do país. Contudo, até chegar aos moldes definidos pela Constituição de 1988, competente, portanto, para julgamento exclusivo dos crimes dolosos contra a vida, a Instituição passou por diversas mudanças e, inclusive, foi alvo de ataques em períodos de crises democráticas.
Inicialmente, a partir do Decreto de 18 de junho de 1822, o “Tribunal do Povo” foi previsto para julgamento exclusivo dos crimes de abusos de liberdade de imprensa durante o período imperial. Posteriormente, em 1824, no título 6º da Constituição Política do Império do Brasil, o Júri foi expressamente previsto como integrante do Poder Judiciário e ampliou sua competência para abranger outros crimes, por exemplo, os de contrabando. Além disso, nos termos do artigo 152 do referido diploma legislativo, caberia aos jurados decidir acerca do fato, enquanto a tarefa de aplicação legal seria reservada aos juízes.
É necessário ressaltar que, de acordo com Kurkowski, em razão do regime absolutista monárquico vivenciado na época, a participação popular não se revestia de qualquer anseio democrático, mas, na verdade, era sinônimo de uma mera garantia individual do réu ser julgado pelos seus pares. Para o autor, somente a partir da restrição dos limites e da própria devolutividade recursal, a decisão de mérito do Júri tornar-se-ia, de fato, sinônimo da participação efetiva do povo na administração da Justiça.[87]
Com o advento da onda liberal e seus influxos no direito brasileiro, a Constituição de 1946 representou um grande marco nesse fortalecimento democrático do Tribunal do Povo, na medida em que previu expressamente acerca da soberania dos veredictos dos Jurados. Nesse sentido, em consonância ao novo diploma constitucional, foi editada a Lei nº 263/1948, que revogou a possibilidade de controle de mérito da decisão dos jurados pela justiça togada, na medida em que, diante do provimento excepcional da apelação, o juízo ad quem deveria apenas anular a decisão e devolver a matéria para um novo Conselho de Sentença. [88]
Ocorre que, com a ascensão da ditadura militar em 1964, embora o Tribunal do Juri ainda estivesse previsto no capítulo destinado aos direitos e garantias fundamentais, a Emenda Constitucional nº 1 de 1969 foi responsável por fulminar a sua feição democrática, na medida em que suprimiu a expressão da “soberania dos veredictos”, abrindo verdadeira margem interpretativa para que o poder judiciário pudesse intervir na decisão dos jurados. Para Ansanelli Junior, essa exclusão tornou evidente a intenção ditatorial de restringir a participação democrática no âmbito da Justiça.[89]
Face ao exposto, é possível observar que a força do Tribunal do Povo encontra-se diretamente correlacionada ao nível de democracia do contexto social em que está inserida. Assim, em períodos de fortalecimento progressistas, a promessa de oxigenação da justiça e a soberania dos veredictos foi veementemente reafirmada, enquanto na vigência de contextos prevalentemente autoritários, houve um esvaziamento do potencial garantista da Instituição. [90]
Em síntese, embora presente em toda trajetória constitucional brasileira, sua competência, composição e até mesmo a sua natureza jurídica, sofreram modificações de acordo com o período em que estavam inseridas: ora com competências restritas; ora buscando uma composição representativa e plural; ora sendo previsto como um direito de caráter fundamental, ora como um mero órgão do poder Judiciário.
Ao analisar o histórico do instituto a partir da transmudação de sua competência exclusiva para o julgamento de crimes dolosos contra a vida, principal bem jurídico que o direito penal visa a tutelar, torna-se evidente que o constituinte buscou reforçar o poder da Instituição no ordenamento jurídico interno, tendo em vista a atribuição exclusiva para o julgamento dos ilícitos mais severos de uma sociedade.
Em seguida, ao analisar a composição atual do Tribunal, nos termos do artigo 425, §2º, do CPP[91], também é possível observar que, em contraposição as exigências elitistas presentes na formulação original do Júri, há uma busca pela representatividade da Instituição a partir da previsão de participação de indivíduos dos mais diversos âmbitos da sociedade.
Também é sintomático a própria localização do instituto no diploma constitucional. Isso, porque sob a égide da Constituição da República do Estado do Brasil de 1934, o Júri era previsto apenas como um mero órgão do poder judiciário, e, em decorrência disso, seria possível sustentar sua extinção a partir de uma emenda constitucional.[92] Atualmente, como direito fundamental expressamente previsto no art. 5º, inciso XXXVIII, da Carta Maior, o Júri configura-se como cláusula pétrea, nos termos do art. 60, §4, inciso IV, da CF, sendo, portanto, instituição que não pode ser suprimida e tampouco sujeita a eventuais reformas que diminuam seu poder.
Para o jurista brasileiro José Afonso da Silva, o Tribunal do Júri é, sobretudo, um direito do cidadão de ser julgado apenas pelo juiz competente no caso da prática de um crime doloso contra a vida. Contudo, é necessário que o Tribunal também seja entendido como um direito coletivo da própria comunidade de julgar seus infratores, sendo fruto, portanto, da cronológica necessidade de poder político do povo em relação à aplicação da justiça.[93] No mesmo sentido, nas lições apresentadas por Kurkoeski, para além de um direito social, o Júri configura-se como um “sustentáculo da democracia”, na medida em que está intrinsicamente relacionado ao efetivo exercício de poder pelo povo, seu titular originário.[94]
O inciso XXXVIII do artigo 5ª da Constituição, além de prever a instituição do Júri como competente para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida, consagrou os princípios necessários para sua existência no ordenamento jurídico interno: (a) plenitude da defesa; (b) o sigilo das votações; (c) a soberania dos veredictos e (d) a competência exclusiva para o julgamento.[95]
Convém observar que, embora distintos, são princípios comunicáveis entre si e substancialmente complementares. Por exemplo, não há como vislumbrar a existência de uma soberania dos veredictos sem que, em contraposição a isso, seja assegurado ao réu a plenitude de sua defesa; ou ainda, não há como compatibilizar a competência exclusiva de julgamento do Tribunal sem a devida blindagem da interferência jurisdicional no mérito dos seus veredictos.
Por conseguinte, o presente trabalho buscará definir individualmente o conceito normativo e a extensão dos 4 (quatro) princípios, visando, sobretudo, a assegurar a correta compreensão de seus efeitos no âmbito da constituição do Tribunal do Povo.
A garantia constitucional de uma defesa ampla e efetiva na seara processual possui amparo constitucional no art. 5, inciso LV, da Constituição Federal, que assegura, tanto aos litigantes, como aos acusados em geral, os meios e recursos necessários para assegurar a sua defesa ampla no desenvolvimento processual. [96]
Em decorrência disso, é possível vislumbrar a previsão legislativa de recursos privativos da defesa, vigência da regra do in dubio pro réu e até mesmo a proibição de revisões que culminem na prejudicialidade da situação do réu. Em síntese, há um tratamento diferenciado do acusado a fim de garantir, de modo substancial e efetivo, a concretização do postulado constitucional de sua defesa ampla.
Sob o viés técnico, por força do princípio da ampla defesa, há expressa indisponibilidade da defesa processual específica a ser exercida por profissional detentor de capacidade postulatória, mesmo que em decorrência de expressa manifestação do réu em sentido contrário a constituição de sua defesa. Em consequência disso, de acordo com o art. 261 do CPP, não é possível, sob pena de nulidade absoluta[97], que o réu, ainda que ausente ou foragido, tenha seu julgamento sem a presença de um profissional da advocacia.
Destaca-se, ainda, que além de abranger o supracitado direito a defesa de cunho processual técnico, o princípio também engloba uma autodefesa material específica, exercida pelo próprio réu a partir do seu direito de audiência, presença nos atos de instrução e até mesmo pela previsão da capacidade postulatória autônoma para impetração de determinados recursos e ações no âmbito do processo penal.[98]
Ocorre que, embora parte da doutrina entenda que não há qualquer diferença substancial entre ambos[99], o princípio da “plenitude da defesa”, constitucionalmente assegurado ao Júri, trouxe relevos ainda mais intensos em comparação a garantia genérica de ampla defesa assegurada pelo art. 5, inciso LV, da Constituição Federal.
Assim, no âmbito do Tribunal do Povo, há um dever de aproveitamento de todas as circunstâncias processuais disponíveis, tendo em vista que a defesa não se restringe aos instrumentos previstos em lei, tampouco se limita a utilização de argumentos estritamente jurídicos. [100] Prova disso é que, além da possibilidade de aduzir causas supralegais de exclusão de ilicitude ou de culpabilidade, também é perfeitamente lícito ir além da taxatividade das teses absolutórias dispostas no artigo 386 do CPP.[101]
Em síntese, pode-se dizer que, no âmbito do Tribunal do Povo, não há limitações legais das estratégias defensivas: há uma gama de possibilidades para articular, de fato, a plenitude da defesa no julgamento dos crimes dolosos contra a vida.
Ademais, importante destacar ainda que, nos termos do artigo 497, inciso V, do Código de Processo Penal, a constituição de novo defensor ao acusado considerado indefeso é um verdadeiro poder-dever do juiz presidente do Tribunal do Júri, que poderá, inclusive, dissolver o Conselho e designar novo dia para o julgamento.[102]
2.2.2 Competência para julgamento
Visando a assegurar veredictos, de fato, soberanos, a Constituição estabeleceu, acertadamente, uma competência mínima do Tribunal Popular para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida. De acordo com Kurkowski, a partir dessa previsão, o constituinte originário almejou assegurar um julgamento de cunho mais subjetivo, decorrente dos valores dos próprios cidadãos e, portanto, mais próximo da realidade do acusado. Nesse sentido:
Exemplificativamente, o jurado mais humilde residente em uma comarca do interior de Sergipe, por compreender a realidade que o circunda muito melhor do que um juiz substituto que reside na capital sergipana e é apenas designado para realizar uma sessão do Tribunal do Júri, terá melhores condições de apreciação sobre o crime de homicídio ocorrido nesse interior do que o juiz presidente do júri.[103]
Para Renato Brasileiro, retomando as lições de Nucci, o princípio decorre da necessidade de evitar tentativas de redução da competência do Tribunal pela legislação ordinária e sua condução a um papel meramente simbólico.[104] Assim, o que, de consequência se depreende, é que o direito de o povo participar da administração da justiça tornar-se-ia condicionado, na medida em que, sem a previsão constitucional de competência mínima, o Tribunal estaria à mercê de uma futura e incerta vontade do legislador infraconstitucional em definir os crimes sujeitos a sua jurisdição. [105]
Nesse sentido, tendo em vista que foi conferido ao povo uma parcela de jurisdição para o julgamento do bem jurídico mais elementar do ordenamento (vida), também foi necessário assegurar tal competência a partir do status de cláusula pétrea, nos termos do art. 60, §4, inciso IV, da CF/88. Logo, seu âmbito de aplicação não poderá ser restringido pelo legislador ordinário em razão da sua proteção constitucional máxima.
Destaca-se, contudo, que não há quaisquer empecilhos para uma eventual ampliação da competência do Tribunal, o que, inclusive, já ocorreu em relação a inclusão dos crimes considerados conexos e/ou continentes, nos termos do art. 74, §1, do Código de Processo Penal.[106]
A garantia constitucional do “sigilo das votações”, previsto na alínea b, inciso XXXVIII, art. 5, da CF/88, pretende conferir efetiva proteção aos jurados que irão compor o Conselho de Sentença, garantindo, portanto, uma certa blindagem a fatores externos que possam interferir e deturpar seu senso de justiça no caso concreto. Para Renato Brasileiro[107], essa restrição da publicidade encontra fundamento no fato de que os jurados, embora atuem temporariamente como magistrados, não usufruem das prerrogativas inerentes aos juízes de direito. Com efeito, se torna veementemente necessário a previsão de uma proteção contra eventuais intimidações do público ou do réu.
Não há, ainda, como deixar de abordar o avanço proporcionado pela Lei 11.689 de 2008 no que se refere a efetivação de tal princípio, na medida em que essa reforma legal modificou o art. 483, §1, do CPP para prever o encerramento imediato da votação quando houver 4 (quatro) votos no mesmo sentido, em relação a quesitação de autoria e materialidade.[108] Em síntese, mesmo diante de votação unânime, o sigilo do voto de cada um dos Jurados que compõe o Conselho de Sentença será devidamente preservado.
Destaca-se, ainda, que além da previsão de uma sala secreta e de um rito pautado na contagem não integral dos votos, pode-se inferir a adoção de um sistema de incomunicabilidade dos jurados como corolário decorrente do princípio constitucional do sigilo das votações. Assim, de acordo com o artigo 466, §1º, do CPP[109], será vedado, sob pena de exclusão do Conselho e multa, a comunicação entre os jurados tanto internamente, quanto externamente.
Em síntese, pode-se inferir que tal princípio ostenta, em última análise, um caráter protetivo. Contudo, mesmo sem qualquer previsão constitucional nesse sentido, para parcela da doutrina, o sigilo das votações implicaria, na verdade, na vigência de um sistema de íntima convicção imotivada por parte dos jurados, que não estariam sujeitos a necessidade de expor os fundamentos de suas decisões pois estariam pautados unicamente no seu senso de justiça em relação ao crime cometido. Aqui, urge necessário, portanto, questionar: Seria viável compatibilizar o sistema de convicção imotivada com a exigência expressa de fundamentação dos julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário?
Tal questionamento demonstra-se pertinente, na medida em que, apesar de relevante parcela doutrinária considerar que o Júri seja órgão constitucional autônomo[110], o Tribunal do povo, conforme melhor entendimento, possui natureza jurídica de órgão especial da Justiça Comum (Estadual ou Federal)[111]. Para Renato Brasileiro, a colocação do Júri no art. 5º tratar-se-ia, na verdade, de uma escolha do constituinte originário para evidenciar seu âmbito assecuratório, sem, contudo, ter em vista a sua autonomia em relação aos demais órgãos judiciários.
Assim, embora não esteja expressamente previsto no capítulo do Poder Judiciário, é possível concluir que o Tribunal do Povo também se sujeita as regras relativas aos demais Tribunais, o que implicaria, por conseguinte, na necessidade de motivação de suas decisões, nos termos do artigo 5º, inciso LXI[112] e do artigo 93, inciso IX[113], da Constituição Federal.
Como um dos críticos ferrenhos da existência de um sistema de “certeza moral”, Aury Lopes defende que a ausência de motivação na decisão dos jurados no âmbito do Tribunal do Júri consiste em verdadeira “monstruosidade jurídica”, tendo em vista que o acusado passa a ser julgado a partir de qualquer elemento, inclusive aqueles que sequer constam nos autos. No mesmo sentido, Streck afirma que a condenação ou absolvição do réu encontra-se à mercê de análises simplistas e arbitrárias acerca das características sociais do autor e estão distantes, portanto, do fato criminoso em si.[114]
Com efeito, para ambos ao autores, vislumbrar a livre convicção imotivada como corolário decorrente do sigilo das votações, consistiria, em última análise, na deturpação do próprio núcleo essencial do princípio, que não tem como objetivo afastar a submissão ao preceito do artigo 93, inciso IX, da Constituição, tampouco construir um ambiente fértil a feição solipsista e regressão a um Direito Penal do Autor, sem qualquer espaço em um Estado democrático de Direito.[115] Busca-se, na verdade, resguardar o voto dos jurados a partir da garantia de sua imparcialidade. Assim deve ser entendido o princípio.
2.2.4 Soberania dos veredictos
Como traço mais peculiar do Tribunal do Júri, a “soberania dos veredictos” é o princípio responsável por determinar que a “palavra final” do mérito da acusação caberá ao Conselho de Sentença. Para Mauro Viveiros, tal soberania representaria, em última análise, a própria expressão do desejo do constituinte originário de blindar as decisões do Tribunal do Júri da ingerência de juízes togados, por meio da atribuição de um caráter de inalterabilidade em relação aos seus veredictos.[116] No mesmo sentido, de acordo com Marques “Júri soberano, portanto, é aquele ao qual não se substitui nenhum magistrado para julgar uma questão já decidida pelos jurados”.[117]
Um olhar mais atento para a história do direito brasileiro permite perceber que tal soberania já foi alvo de diversos ataques e, inclusive, suprimida em 1938, por meio do Decreto- Lei 167, que permitiu, de maneira expressa, a interferência dos Tribunais de Apelação em relação ao mérito das decisões emanadas pelo Conselho de Sentença. Nesse sentido:
[..] o Ministro Francisco Campos, na Exposição de Motivos que acompanhava o diploma legal, afirmou a subsistência do tribunal popular, por estar compreendido no preceito genérico do art. 183, da carta de 10 de novembro, que declarava em vigor, enquanto não revogadas, as leis que, explícita ou implicitamente, não contrariassem as disposições da Constituição. O Decreto-lei 167 alterou profundamente o Júri, subtraindo-lhe a chamada soberania dos veredictos, com a instituição da apelação sobre o mérito, desde que houvesse "injustiça da decisão, por sua completa divergência, com as provas existentes nos autos ou produzidas em plenário"[118]
Somente após 8 anos, com o intento de restaurar os ideais democráticos da Instituição, a Constituição de 1946 restabeleceu o atributo da soberania para as decisões emanadas pelo Júri. Em decorrência disso, o artigo 141 da referida Carta Constitucional trouxe a previsão de determinados requisitos obrigatórios para tornar possível, na prática, a preservação da validade dos julgamentos proferidos pelo Conselho de Sentença e, em decorrência disso, da soberania dos veredictos dos jurados: o número de jurados ímpar, a garantia do sigilo das votações e própria plenitude de defesa do réu.[119] Com efeito, o Tribunal Popular foi reinserido no sistema jurídico no âmbito dos direitos e garantias individuais.
Embora a Instituição tenha sido mantida até mesmo durante o período repressivo da ditadura militar, não se pode ignorar que, no âmbito da Constituição de 1967 e da Emenda 1969, não havia qualquer menção expressa à soberania dos veredictos: “mantida a instituição do júri, que terá competência no julgamento dos crimes dolosos contra a vida”. Assim, novamente, havia uma abertura para possíveis interferências do Poder Judiciário em relação aos veredictos proferidos pelo Conselho de Sentença.
A partir da Constituição Federal de 1988, conforme leciona Kurkowski, a reafirmação expressa do caráter soberano dos veredictos foi fundamental para o reconhecimento do Júri como uma “tríplice garantia”: individual, política e coletiva. Sob a ótica individual, a soberania dos veredictos implica na necessária preservação e proteção do direito do réu em ser julgados por seus semelhantes. Enquanto garantia política, o princípio é responsável por reafirmar o direito da sociedade em participar diretamente da administração da sua Justiça. Por fim, em seu âmbito coletivo, a soberania dos veredictos demonstra-se uma garantia da própria sociedade julgar o réu nos crimes dolosos contra a vida.[120]
Para Rodrigues, a soberania dos veredictos possui, ainda, relevante papel na definição do momento inicial de cumprimento das penas impostas pelo Tribunal do Júri. Isso, porque caso não haja impugnação pelas partes acerca da decisão de mérito proferida pelo Júri, haveria a formação sui generis de uma coisa julgada parcial desde a primeira instância.[121] De acordo com o autor, somente em casos excepcionais as Cortes Revisoras analisarão o mérito daquela acusação em questão, sendo certo, portanto, que os efeitos da coisa julgada em relação aos fatos decididos deve ser reconhecido, ante a impossibilidade de adentrar no âmbito da soberania dos jurados do Conselho de Sentença e reformar aquilo que por eles restou consignado.[122]
No mesmo sentido, para Kurkowski, considerando que a última palavra sempre caberá “aos pares”, após a decisão do Conselho de Sentença, haveria um trânsito em julgado do capítulo sentencial da culpa do réu. Logo, de acordo com o autor, o cumprimento imediato da pena se traduz, por derradeiro, como representativo do próprio caráter democrático do Tribunal do Povo e da necessidade de respeito a vontade dos jurados. [123]
Embora o presente estudo não defenda uma análise das decisões do Júri a partir da ótica de um elitismo democrático[124], tampouco paute-se na desconfiança acerca da competência do povo para o exercício da soberania, considera necessário que a previsão do princípio da “soberania dos veredictos” seja acompanhado de um reforço efetivo na garantia de justiça oriunda de suas decisões colegiadas, tendo em vista a sua composição por indivíduos que não detêm conhecimento jurídicos e, invariavelmente, são mais suscetíveis as artimanhas e tecnicidades argumentativas daqueles atores processuais que ocupam o espaço da acusação e exercício da defesa em um verdadeiro duelo de oratória.[125]
De acordo com Nelson Hungria o “Tribunal do Povo” consistiria, na verdade, em um mero espetáculo destinado ao entretenimento público, sendo, portanto, um verdadeiro duelo de oratória marcado por artimanhas e uso de técnicas oportunistas para manipular aqueles que não detém conhecimento jurídicos necessários para analisar objetivamente as provas apresentadas ao longo do processo penal.[126] No mesmo sentido, Alexandre Morais da Rosa, aduz que o plenário do Júri é, ao invés de uma arena verdadeiramente argumentativa, uma mera “arena de manipulação”.[127]
Pelo exposto, visando a assegurar uma proteção necessária em razão da soberania dos veredictos, fez bem o legislador ao prever uma estrutura específica bipartida no procedimento do júri: uma fase preliminar, o judicium accusationis, em que é realizado um juízo de admissibilidade pautado em evidências acerca da materialidade e autoria delitiva; bem como uma fase secundária, o judicium causae, após a filtragem jurisdicional. Em síntese, a partir da previsão de um juízo prévio acusatório busca-se, sobretudo, garantir que somente as acusações factíveis realizadas pelo Parquet cheguem a julgamento colegiado pelo Júri, sendo, portanto, um verdadeiro mecanismo disponibilizado pelo Estado Juiz contra a “sanha persecutória” do Ministério Público.[128]
Ademais, embora o veredicto proferido pelos jurados seja constitucionalmente soberano, nos termos do artigo 593, alínea d, inciso III, do Código de Processo Penal, é plenamente possível que uma decisão manifestamente contrária às provas dos autos seja recorrível e objeto de cassação pelo Tribunal.[129] Assim, embora o juízo ad quo não possa reformar o teor do veredicto, é possível vislumbrar a factibilidade de um juízo rescindente no julgamento da apelação, ou seja, a determinação jurisdicional de um novo julgamento pelo Júri.
Nas palavras de José Frederico Marques, a condicio sine qua non para que haja a soberania dos veredictos oriundos do Tribunal do Júri é a garantia do jus libertatis, ou seja, não há como vislumbrar a prevalência absoluta de um veredicto, tampouco a imutabilidade de suas decisões. [130]
Nesse sentido, além da previsão do cabimento do recurso de apelação, o legislador também conferiu a possibilidade de impugnação por meio da ação autônoma de revisão criminal, em que o Tribunal de Justiça poderá, inclusive, absolver o acusado caso a sentença condenatória seja fundada em provas comprovadamente falsas. Por isso, para Melchior, não há, de fato, um direito de participação direta do cidadão na administração da justiça para julgar os seus pares e decidir o mérito da causa, na medida em que o procedimento do Júri consiste apenas em uma modificação parcial da atividade judicante, que continua sendo exercida e instaurada pelo poder estatal. [131]
Em síntese, embora deva haver a prevalência da vontade da comunidade sobre o interesse do Judiciário togado, a soberania dos veredictos não pode ser considerada absoluta, tendo em vista que deve conviver com os demais direitos fundamentais constitucionalmente assegurados ao acusado.[132]
Ocorre que, tanto o juízo de admissibilidade prévio, como a previsão de ingerência judiciária a posteriori, que, em tese, deveriam reforçar a segurança do Tribunal do Povo, na prática, demonstram-se insuficientes.
No que se refere ao judicium accusationis é comum que tal decisão preliminar, ao invés de garantir uma necessária filtragem acusatória por um juiz togado, consista apenas em uma mera fase burocrática e automatizada do procedimento. Isso, em razão da temerária construção jurisprudencial de prevalência do princípio do “in dubio pro societate” na fase preliminar do procedimento acusatório no Júri (judicium accusationis), que resulta, na maioria dos casos, na invariável decisão de pronúncia do acusado no processo ante a existência de eventuais dúvidas acerca da materialidade e autoria delitiva no caso concreto.[133]
Já em relação ao controle a posteriori das decisões proferidas pelo Conselho de Sentença, em decorrência da soberania dos veredictos, a atuação jurisdicional encontra entraves cognitivos tão consideráveis, que o exercício do juízo rescindente pelo Tribunal de segundo grau, tornou-se, em última análise, uma medida raríssima e extremamente excepcional. Prova disso é a pesquisa realizada pelo programa de Mestrado da Universidade Federal de Alagoas, que demostra o percentual irrisório de 7% de anulação das condenações recorridas diante de um espaço amostral de 470 apelações referentes a condenações interpostas contra decisões do Tribunal do Júri no Estado de Alagoas entre um período de 5 anos, referente ao intervalo de 2013 até 2017.[134]
3.O PACOTE ANTICRIME E A EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA NO JÚRI
3.1 A literalidade do Art. 492, inciso I, alínea “e”, do Código de Processo Penal
Não obstante o tema da execução antes do trânsito em julgado já tenha sido objeto de inúmeros debates e modificações de precedentes no âmbito dos Tribunais Superiores, a Lei 13.964/2019, popularmente intitulado como “Pacote Anticrime”, trouxe novos contornos à discussão.[135] Ante a peculiaridade inerente a previsão constitucional da soberania dos veredictos, o art. 492, inciso I, alínea “e”, do CPP passou a determinar a possibilidade legal de execução provisória da pena em casos de condenações superiores a 15 (quinze) anos de reclusão proferidas pelo Tribunal do Júri. Nestes termos:
Art. 492. Em seguida, o presidente proferirá sentença que:
e) mandará o acusado recolher-se ou recomendá-lo-á à prisão em que se encontra, se presentes os requisitos da prisão preventiva, ou, no caso de condenação a uma pena igual ou superior a 15 (quinze) anos de reclusão, determinará a execução provisória das penas, com expedição do mandado de prisão, se for o caso, sem prejuízo do conhecimento de recursos que vierem a ser interpostos
Entretanto, excepcionalmente, o Juiz Presidente poderá deixar de determinar a decretação dessa prisão diante de eventual questão substancial que, em sua concepção, possa ensejar uma revisão do julgamento[136]. Ademais, nos termos do §5, o Tribunal poderá, ainda, atribuir efeito suspensivo ao recurso de apelação quando verificar, cumulativamente, que além de não possuir intuito “meramente protelatório”, se refere a questão substancial com potencial de tornar possível revisão da condenação e até mesmo absolvição do réu. In verbis:
§ 5º Excepcionalmente, poderá o tribunal atribuir efeito suspensivo à apelação de que trata o § 4º deste artigo, quando verificado cumulativamente que o recurso:
I - não tem propósito meramente protelatório; e
II - levanta questão substancial e que pode resultar em absolvição, anulação da sentença, novo julgamento ou redução da pena para patamar inferior a 15 (quinze) anos de reclusão. (Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019)
Contudo, para Aury Lopes, ainda que haja uma previsão excepcional de atribuição de eficácia suspensiva ao recurso de apelação, trata-se de uma ressalva meramente ilusória.[137] Isso, porque além da determinação da execução antecipada consistir na regra geral ventilada pelo Pacote Anticrime, a própria exposição dos motivos da lei é capaz de expor a aspiração de punições imediatistas por detrás de sua elaboração.
Assim, partindo dessa crítica e em busca de analisar a validade da novidade legislativa introduzida pelo Pacote Anticrime, o presente trabalho realizará, nessa seção final, um estudo acerca da sua constitucionalidade. Contudo, também será abordado a sua adequação convencional ao Pacto de São José da Costa Rica, eis que, consoante entendimento proferido no julgamento do RE nº 466.343/SP, trata-se de uma norma supralegal, sendo, portanto, parâmetro de controle em relação a legislação infraconstitucional.[138]
Preliminarmente, será realizado uma exposição do atual estado da matéria no âmbito do STF, que além de necessitar julgar as ações diretas de inconstitucionalidade promovidas, também se sobrepõe acerca da temática no âmbito do RE nº1.235.340, em que se discute a possibilidade de a soberania dos vereditos do Tribunal do Júri autorizar a imediata execução de qualquer pena imposta pelo Conselho de Sentença.
3.2 As ADIs 6.735-DF e 6.783-DF
O polêmico artigo introduzido pelo Pacote Anticrime tornou-se alvo de duas ações diretas de inconstitucionalidade. A ADI 6.735-DF ajuizada pela Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas (ABRACRIM), liminarmente, pugnou pela suspensão da eficácia do art. 492, I, “e”, e §§ 3º, 4º, 5º e 6º, do CPP. No mérito, consignou que a atual redação do artigo, além de contrariar a tese firmada pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal nas ADCs 43, 44 e 54, no sentido da inconstitucionalidade da prisão automática do condenado, também violaria o princípio constitucional da “presunção de não culpabilidade”. [139]
Em adição aos fundamentos já apresentados, a ADI 6.783-DF ajuizada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (CFOAB), afirmou, ainda, que a redação do artigo também seria responsável por violar a isonomia e a proporcionalidade (CF/88, art. 5º, caput e LIV), tendo em vista que ensejaria um tratamento diferenciado entre os acusados de cometer crimes dolosos contra a vida. Ademais, destacou que o Pacto de São José da Costa Rica, nos termos do art. 5º, § 3º da CF, possui “força paralisante” em relação a atos normativos infraconstitucionais que violem os seus preceitos. [140]
3.3 Recurso Extraordinário 1.235.340
No Leading case do recurso, tratar-se-ia de réu pronunciado por homicídio triplamente qualificado, cometido contra sua ex-esposa por razões de gênero. Após sua condenação pelo Tribunal do Júri da Comarca de Chapecó/SC a uma pena de 26 anos e 8 meses de reclusão, pela prática dos crimes previstos no art. 121, §2º, I, IV e VI, do CP e a 1 ano de detenção e 10 dias-multas, pela prática do crime previsto no art. 12 da Lei 10.826/2003, o Magistrado da causa, com base no que restou consignado pelo STF no julgamento do HC 118.770/SP, negou a possibilidade de o réu recorrer em liberdade por tratar-se de condenação amparada pela soberania dos veredictos do júri e, por consequência disso, imune à recorribilidade plena.
Inicialmente, a defesa impetrou habeas corpus no Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ/SC) visando a assegurar o direito do réu de recorrer em liberdade até o trânsito em julgado de sua sentença. Contudo, com a superveniente denegação do remédio constitucional pelo Tribunal, foi interposto o RHC 111.960/SC no STJ. Em 02/05/2019, o recurso foi liminarmente provido pelo Ministro Nefi Cordeiro. Visando a atacar a decisão monocrática proferida, o Ministério Público de Santa Catarina interpôs agravo regimental, que, em 04/06/2019, foi desprovido, de maneira unânime, pela Sexta Turma do STJ.
Inconformado com o acordão que entendeu pela ilegalidade das prisões fundadas unicamente no veredicto condenatório do júri, o MP-SC manejou com base no art. 102, III, alínea a, da CF/88, o Recurso Extraordinário nº1.235.340. Em suas razões de mérito, sustentou, em síntese, que além do acordão recorrido ter violado o art. 5º, inciso XXXVII, c, da CF/88, contrariou o próprio entendimento proferido pelo STF no julgamento do HC 118.770/SP, em que passou a ser admitida a execução provisória da pena no âmbito do júri.
O Relator, Ministro Roberto Barroso, sob à luz do art. 5º, inciso XXXVIII, alínea c, da Constitucional Federal, deu provimento ao Recurso Extraordinário para negar provimento ao recurso ordinário em habeas corpus, assentando, para tanto, a seguinte tese de julgamento: "A soberania dos veredictos do tribunal do júri autoriza a imediata execução de condenação imposta pelo corpo de jurados, independentemente do total da pena aplicada".
No seu voto, antes de adentrar propriamente no julgamento da questão jurídica, o Relator buscou ressaltar o panorama atual brasileiro de déficit de proteção à vida humana. Para tanto, apresentou um Diagnóstico das ações penais de competência do Tribunal do Júri, elaborado no âmbito do Conselho Nacional de Justiça, no ano de 2019, em que se demonstra que os casos submetidos ao conhecimento do poder judiciário representam menos que a metade dos casos de homicídios, de fato, ocorridos.
Para sustentar sua tese de execução imediata da pena, o Ministro destacou que o Tribunal do Júri é um órgão colegiado constitucionalmente dotado de soberania em relação aos seus veredictos. Nesse sentido, de acordo com Barroso, embora trate-se de uma jurisdição de primeiro grau, não se reveste da precariedade inerente a decisões recorríveis proferidas por juízes singulares. Prova disso é a própria devolutividade restrita de apelações interpostas, tendo em vista que o mérito da decisão deverá ser sempre preservado da interferência de um tribunal ad quem. Ademais, mesmo em tais casos, há um ínfimo percentual de modificação das decisões condenatórias do Júri. [141]
Em seguida, o Ministro enfatizou a necessidade de interpretar o art. 597 do CPP[142] conforme a Constituição, de modo a compatibilizar a previsão de efeito suspensivo das apelações com o princípio constitucional da soberania dos veredictos e da própria efetividade do sistema de justiça criminal. Destacou, ainda, que a nova orientação firmada pelo STF na ocasião de julgamento das ADCs 43, 44 e 54 não implica na vedação a execução imediata das penas no âmbito do júri, eis que a declaração de constitucionalidade do art. 283 do CPP não é capaz de interferir na cláusula pétrea que estipula a soberania do Júri.
Sustentou, em sentido similar ao seu voto proferido no julgamento das ADCs 43,44 e 54, a necessidade de desconstruir a visão absoluta da presunção de inocência, na medida em que se trata, na verdade, de um princípio constitucional. Assim, diante de uma eventual colisão com outros princípios ou bens jurídicos também assegurados constitucionalmente, é plenamente factível e, sobretudo, razoável, que seja realizado uma ponderação a fim de assegurar a harmonia do ordenamento jurídico como um todo. Nesse sentido:
No caso específico da condenação pelo Tribunal do Júri, na medida em que a responsabilidade penal do réu já foi assentada soberanamente pelo Conselho de Sentença, e o Tribunal de segundo grau não pode substituir-se à deliberação dos jurados (CF/1988, art. 5º, XXXVIII, “c”), o princípio da presunção de inocência adquire menor peso ao ser ponderado com o interesse constitucional na efetividade da lei penal, em prol dos bens jurídicos a que ela visa resguardar (CF/1988, arts. 5º, caput e LXXVIII, e 144), notadamente a vida humana. Noutros termos: interpretação que interdite a prisão como consequência da condenação pelo Tribunal do Júri representa proteção insatisfatória de direitos fundamentais de especial relevância no quadro de valores constitucionais, tais como a vida, a dignidade humana e a integridade física e moral das pessoas. Isso significa dizer que a prisão de réu condenado por decisão do Tribunal do Júri, ainda que sujeita a recurso, não viola o princípio constitucional da presunção de inocência ou da não culpabilidade. (GRIFOS NOSSOS)
O Ministro salientou que, embora o Pacto de San José da Costa Rica estabeleça o duplo grau jurisdicional como uma verdadeira garantia judicial do acusado, a incidência do princípio constitucional da soberania dos veredictos não poderá ser afastada por uma norma de natureza supralegal. Justificou, ainda, que além do recolhimento imediato do réu não impedir eventual interposição de recurso posterior, a própria Suprema Corte, na ocasião de julgamento da AP 470 e ao RHC 79.785, consignou que a Constituição prevê determinadas exceções ao duplo grau jurisdicional.
Por fim, ao analisar a constitucionalidade do art. 492 do CPP, introduzido pela Lei nº 13.964/2019, Barroso destacou a necessidade de ser conferida interpretação conforme à Constituição, com redução de texto, para excluir a limitação temporal prevista na: (i) alínea “e” do inciso I; ( ii) parte final do § 4º; (iii) parte final do inciso II do § 5º. Para sustentar seu posicionamento, o Ministro destacou que a restrição da execução imediata para os crimes de penas inferiores a 15 anos, além de ir de encontro ao princípio da isonomia, ao conferir tratamento distinto a pessoas em situações equivalentes, consistiria, em última análise, em verdadeira relativização da soberania dos veredictos.
O voto do Relator foi acompanhado pelo Ministro Dias Toffoli, que manteve o seu posicionamento já proferido na ocasião de julgamento das ADCs 43,44 e 54, no sentido de que “o princípio constitucional da soberania dos veredictos confere à decisão dos jurados, em tese, um caráter de intangibilidade quanto a seu mérito”. O Ministro afirmou, em seguida, que a execução imediata da condenação não afrontaria o princípio da presunção de inocência, tampouco seria responsável por violar a garantia do duplo grau de jurisdição, eis que a decisão proferida pelos tribunais não pode ser substituída pelos juízes togados. No mesmo sentido, para o Ministro Alexandre de Moraes e para a Ministra Cármen Lúcia, a soberania dos vereditos do Tribunal do Júri autoriza a imediata execução de pena imposta pelo Conselho de Sentença.
Em contraponto, o Ministro Gilmar Mendes abriu uma importante divergência ao voto do Relator e considerou que, embora a prisão preventiva do réu possa ser decretada pelo Juiz Presidente com base nos fatos e fundamentos emanados pelo Júri, a execução imediata da pena não encontra fundamento no ordenamento jurídico interno. Isso, porque além da Convenção Americana de Direitos Humanos assegurar o direito de recurso do condenado, nos termos do art. 8.2.h, a própria Constituição Federal também consagra expressamente a presunção de inocência. Nesse sentido, apesar de haver um rol restrito de cabimento de apelação contra as decisões proferidas pelo Júri, tais veredictos não podem ser considerados absolutos, sob pena de comprometer garantias fundamentais.
Em consequência disso, o Ministro negou provimento ao recurso extraordinário e declarou, portanto, a inconstitucionalidade material da nova redação determinada pela Lei 13.964/2019 ao art. 492, I, e, do CPP.
Aderindo integralmente à tese proposta no voto divergente do Ministro Gilmar Mendes, os Ministros Ricardo Lewandowski e Rosa Weber também votaram pela impossibilidade da execução imediata.
Em 10/11/2022, o Ministro André Mendonça solicitou vista aos autos.
3.4 Convencionalidade do art. 492, inciso I, alínea “e”, do Código de Processo Penal
Como componente essencial de um “bloco de constitucionalidade” [143], e, portanto, integrante do ordenamento jurídico interno, os instrumentos internacionais do Sistema Interamericano, sobretudo a CADH, consistem em um significativo parâmetro de controle em relação a legislação infraconstitucional. Ademais, destaca-se que a verificação da compatibilidade material em relação as normas previstas na Convenção é uma obrigação atribuída aos tribunais locais e demais autoridades públicas dos países signatários, que não podem invocar sua legislação interna para se imiscuir da obrigação anteriormente ratificada.
Assim, embora a novidade legislativa ventilada pelo Pacote Anticrime não tenha sido diretamente objeto de análise convencional dos órgãos da CADH, é possível vislumbrar, por meio dos diversos pronunciamentos emitidos anteriormente, sua evidente dissonância em relação aos limites envolvendo a restrição provisória da liberdade e da presunção de inocência no âmbito do Sistema Interamericano.
Sem dúvidas, a análise do discurso jurídico que antecede a criação de determinado diploma legislativo é capaz de revelar não apenas a sua finalidade, mas também destrinchar os anseios responsáveis por sua elaboração e ainda revelar as esperanças depositadas em relação àquela norma.[144] Em sua exposição de motivos, o ex-Ministro da Justiça Sérgio Moro determinou que a mudança do art. 492 do CPP[145] seu deu em razão da “gravidade em concreto” envolvendo os crimes dolosos a serem julgados pelo Tribunal Popular, bem como da veemente necessidade de reafirmar o princípio da soberania dos veredictos no atual contexto de impunidade vivenciado no país.
Não há razão, contudo, para sustentar tal fundamento apresentado. De acordo com o Informe nº 35/07 e 86/09, referente ao caso Peirano Basso vs. Uruguai, emitido pela CIDH, independentemente da grande repercussão pública envolvendo o caso, ou mesmo da sua alegada gravidade em concreto, a espécie de delito imputado não pode configurar-se como fundamento apto a justificar a restrição provisória de liberdade no decurso processual.
Essa mesma argumentação já havia sido anteriormente ventilada no paradigmático caso Suárez Rosero vs. Ecuador[146], em que a Corte IDH, além de reafirmar o caráter de excepcionalidade da prisão processual, assentou que, em nome da presunção de inocência, a restrição de liberdade somente se justificaria diante da necessidade de assegurar a eficácia do desenvolvimento das investigações e a ação da justiça.
Assim, a previsão do artigo em questão parece subverter a própria natureza da prisão processual, na medida em que se baseia em critérios meramente subjetivos como a “gravidade em concreto” e a existência de um “alarme social”.
Em síntese, é possível observar que antecipar a execução em decorrência da natureza do crime e do quantum condenatório, além de contrariar o art. 8.2 da Convenção Americana de Direitos Humanos, viola também o direito fundamental à liberdade pessoal prevista no art. 7 dessa Convenção, que determina a necessidade de uma legalidade estrita e proíbe juízos arbitrários casuísticos. [147]
Ademais, a ausência de critério objetivos para aferição do que seria, de fato, a usual “gravidade em concreto” alegada pelo Ex-ministro traduz uma técnica legislativa deficiente, na medida em que incorre nos mesmos fundamentos idôneos a ensejar eventual decretação de uma prisão preventiva em qualquer fase processual.[148] Ora, caso a garantia da manutenção de uma ordem pública estivesse, de fato, comprometida, caberia, nos termos da Constituição, promover a segregação de caráter cautelar e não a execução antecipada de uma pena, que, reprisa-se, não possui qualquer respaldo na Carta Maior.
Destaca-se, ainda, que embora a desconstituição do princípio da presunção de inocência não possa ser necessariamente atrelada ao momento do trânsito em julgado da sentença no âmbito do Sistema Interamericano, a regra definida pelo ordenamento jurídico interno brasileiro, nos termos da legislação infraconstitucional e da própria Constituição, veda expressamente a prisão antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória.
De acordo com Lima[149], a definição do marco temporal para a execução passou a ser interpretada, em uma análise, a partir de uma visão partidária, em que a decisão individual passou a se tornar mais valiosa que a decisão em sede abstrata, capaz de definir um padrão decisório e, como consequência disso, tornar possível a existência de uma segurança jurídica no ordenamento.
3.5 Constitucionalidade do art. 492, inciso I, alínea “e” do Código de Processo Penal
Como bem leciona Aury Lopes, o ordenamento jurídico pátrio, em consonância com os postulados da Convenção Americana de Direitos Humanos, adota uma concepção de culpabilidade normativa, em que somente será factível considerar um réu culpado após o fim de todo o seu processo criminal e sua condenação definitiva.[150] Com efeito, torna-se necessário promover a proteção do acusado a partir do controle integral e efetivo de todas as suas garantias processuais até que a sua responsabilidade penal esteja juridicamente resolvida e não apenas “faticamente determinada”. [151]
Sem dúvidas, ao atribuir a legitimidade popular para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida e instituir o próprio Júri, o constituinte originário considerou necessário uma tratativa diferenciada em relação aos crimes cometidos contra a vida. Ocorre que, conforme as lições apresentadas por Diogo Malan, o procedimento especial do Tribunal Popular foi previsto com a finalidade de assegurar a maximização da proteção do acusado, a partir da garantia da plenitude da sua defesa e do seu julgamento pela sociedade.[152]
Assim, independentemente do quantum condenatório, a soberania dos veredictos não pode servir como um subterfúgio apto a justificar a ampliação do poder punitivo estatal a partir da execução antecipada no âmbito do Júri. O princípio, na verdade, deve ser compreendido como uma garantia do réu em ser julgado pelos seus pares, a partir do seu potencial assecuratório da competência do Tribunal para o julgamento de crimes dolosos contra a vida e conexos.[153]
No mais, além de violar a presunção de não culpabilidade do réu, a regra geral da execução antecipada no âmbito do Júri também foi responsável por fulminar o princípio da isonomia[154], na medida em que parte de uma premissa simplista de que um réu condenado por um crime doloso contra a vida seria “mais culpado” que os demais. Em síntese, a supressão do efeito suspensivo das apelações pelo Pacote Anticrime foi responsável por criar uma distinção sem qualquer plausibilidade objetiva entre os condenados: de um lado, sentenciados que possuem a garantia de aguardar o trânsito em julgado de suas sentenças condenatórias inferiores a 15 (quinze) anos; e, do outro, sentenciados a pena igual ou superior a 15 (quinze) anos, que não poderão gozar da garantia de serem presumidamente inocentes.
Há a considerar, ainda, que o uso ilegítima da prisão processual como instrumento de tutela dos interesses sociais, nos termos do art. 492, inciso I, alínea “e” do Código de Processo Penal, também afeta a própria coerência interna do Pacote Anticrime, na medida em que se demonstra incompatível com o art. 313, §2 do CPP[155], cuja redação, dada pela Lei nº 13.964/2019, determina expressamente a impossibilidade de decretação de uma prisão preventiva com finalidade de antecipação do cumprimento de pena.
Ademais, a novel previsão introduzida pelo Pacote Anticrime também parece ignorar o efeito vinculante e a própria eficácia erga omnes da declaração de constitucionalidade do art. 283 do CPP pelo Supremo Tribunal Federal na ocasião de julgamento das ADCs nº 43,44, 54, em que restou consignado, por maioria dos votos, a impossibilidade do início do cumprimento da pena antes do efetivo trânsito em julgado da sentença condenatória, tanto dos Juízes singulares, quanto àquelas proferidas pelo Tribunal do Júri.
É importante frisar que, embora a própria exposição de motivos da alteração legislativa cite precedentes do STF para embasar a factibilidade da execução antecipada no âmbito do Júri (HC 118.770 – SP[156] e HC 140.449-RJ[157]), não é possível vislumbrar, na prática, uma Jurisprudência uníssona em relação ao tema. Isso, porque além de tratar-se de questão ainda pendente de julgamento pelo Pleno do STF, a Segunda Turma do STF proferiu julgados unânimes que entendiam pela impossibilidade de tal execução no primeiro grau de jurisdição, em razão da necessidade de preservação da presunção de inocência do réu até o trânsito em julgado de sua sentença condenatória.
Nesse sentido, destaca-se o julgamento proferido no HC 174.759-CE, de relatoria do Ministro Celso de Mello, em que se buscou, em apartada síntese, assegurar ao réu o direito de aguardar em liberdade o julgamento do seu recurso de apelação no âmbito do Tribunal do Júri. No caso, a Segunda Turma da Suprema Corte, por unanimidade, concedeu a ordem postulada e, como consequência disso, resguardou o direito de o réu não sofrer a execução provisória da condenação penal imposta por provimento condenatório recorrível. Nos termos do voto do Relator, o Ministro Celso de Mello, além da impossibilidade de “reformatio in pejus” no âmbito de recurso exclusivo da Defesa, não é possível, sem que haja a presença dos requisitos excepcionais autorizadores de eventual segregação cautelar, afastar o direito de o réu recorrer em liberdade.
3.6 A execução antecipada como reflexo do “delírio de grandeza” penal
Embora as leis ordinárias devam ser lidas a partir de uma filtragem de dupla conformidade, predomina-se no direito brasileiro um verdadeiro “delírio de grandeza”, em que as leis penais e processuais penais, tornaram-se, em última análise, verdadeiras fontes primárias de direito.[158] Com efeito, há uma banalização do direito penal como remédio salvador de uma democracia tão insegura e, em decorrência disso, o crescente comprometimento de garantias fundamentais.
Um bom exemplo disso, ainda no âmbito do Tribunal do Júri, é o Projeto de Lei n° 1192/22[159], sob iniciativa do Senador Marcos do Val (PODEMOS/ES), que busca alterar o Código de Processo Penal e “aprimorar” o Pacote Anticrime, a partir da previsão de execução provisória, independentemente da quantidade de pena imposta. Em sua fundamentação, argumenta-se que o veredicto do Júri é soberano por força constitucional e, em decorrência da competência do Júri para julgamento de crimes dolosos contra a vida, graves por natureza, não há qualquer “imperativo racional” que justifique limitar a execução provisória somente a penas de 15 anos.
Sem dúvidas, a banalização de leis contrárias aos corolários da própria Constituição evidencia uma resposta Estatal aos anseios sociais. Entretanto, o que se observa na prática é que a exasperação das penas decorrente de políticas criminais essencialmente populistas, não se demonstra, de fato, efetiva. Isso, porque embora o legislador brasileiro tenha elaborado cerca de 80% das leis penas mais rigorosas do mundo, o Brasil ocupa a posição de 3º pais do mundo com a maior população carcerária existente.[160]
“Onde houver pecador (criminoso) haverá moralistas (...). Quanto mais regras, mais o pecado (crime) se dissemina. Quanto mais o crime se dissemina, mais regras queremos. É assim que nós purificados moralistas conquistamos a sensação de distantes dos malvados “pecadores”. [161]
Nesse sentido, em decorrência do exposto, independentemente da posição a ser adotada pelos Ministros do Supremo no julgamento do RE nº 1.235.340 e nas ADIs movidas em face da lei nº 13.964/2019, fato é que a execução antecipada das sentenças de 1º grau nas condenações do Tribunal do Júri, ainda que limitada aos casos em que a pena alcance 15 anos de reclusão, não pode ser vislumbrada como um corolário decorrente da prevalência da soberania e da própria participação popular. Trata-se, na verdade, de uma evidente violação do princípio da presunção de inocência e do próprio entendimento consignado pelo Supremo Tribunal na ocasião de julgamento das ADC’s n.º 43 e 44 e 54.
O presente trabalho buscou analisar a novidade legislativa introduzida pelo “Pacote Anticrime” do artigo 492, do Código de Processo Penal, alínea “e”, inciso I, que prevê a possibilidade de prisões imediatas logo após a condenação pelo Tribunal de Júri a pena igual ou superior a 15 (quinze) anos de reclusão.
Para tanto, buscou-se, em primeiro plano, compreender a trajetória histórica do princípio da presunção de inocência, revisitando, sobretudo, suas origens no âmbito do ordenamento pátrio e internacional, e, ainda, sua própria relação com a prisão processual no âmbito da Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.
Evidenciou-se, a partir desse resgate histórico, que a transposição da tradição jurídica autoritária italiana criou profundas raízes na legislação infraconstitucional brasileira, na doutrina, na jurisprudência e até mesmo na própria política criminal atualmente vigente. Assim, nem mesmo em períodos predominantemente considerados democráticos, foi possível vislumbrar uma realidade livre de tais heranças fascistas, que se perpetuaram de maneira transversal aos demais institutos do processo penal brasileiro.
Em um segundo momento, visando a compreender a possibilidade de coexistência da soberania dos veredictos com o princípio da presunção de inocência, buscou-se desvendar a origem e o contexto do surgimento do Tribunal do Júri no ordenamento jurídico pátrio, bem como os princípios formadores da instituição e o funcionamento prático de sua estrutura.
Sem dúvidas, pode-se perceber que as peculiaridades inerentes desse “Tribunal do Povo” despertaram, e ainda despertam, amplos debates na doutrina: de um lado críticos ferrenhos que defendem a necessidade de sua abolição ante a inadequação a um processo penal que se pretenda acusatório, do outro, defensores da instituição como o próprio cerne de uma justiça oxigenada e, de fato, assecuratória de direitos fundamentais.
Longe de qualquer extremismo, pode-se perceber o papel do Júri como uma verdadeira garantia decorrente da necessidade cronológica de superar um processo penal inquisitório e fortalecer o poder político do povo em relação à aplicação da justiça.[162] Sem dúvidas, seja pela previsão de soberania de seus veredictos ou pela própria garantia do sigilo das votações, foi possível vislumbrar o grande poder conferido ao Tribunal do Povo pelo constituinte originário.
Contudo, tais características não foram previstas para assegurar o direito coletivo da sociedade em participar de julgamentos, tampouco constituem-se como fundamento apto para legitimar a execução imediata da pena. Na verdade, a soberania dos veredictos deve ser interpretada como um instrumento hábil a fortalecer a proteção dos direitos e garantias processuais do acusado, não o oposto.
Não é demais afirmar, portanto, que uma interpretação isolada do Júri como um direito social, certamente culminaria em uma busca desenfreada de mecanismos autoritários aptos a tornar o processo cada vez mais sumário e unicamente em prol da garantia de “ordem” clamada pela população. Por outro lado, uma análise do Júri exclusivamente como um direito individual implicaria num retrocesso da própria essência de participação popular do Tribunal.
Em síntese, o instituto deve ser entendido a partir de uma natureza dúplice: direito fundamental do réu e um direito coletivo social. Não há, portanto, como vislumbrar que o interesse da comunidade na aplicação da pena seja preponderante em relação ao âmbito da garantia individual do acusado de ser julgado pelos seus pares.
Na sequência, o capítulo terceiro expôs um estudo crítico acerca da temática da execução imediata no âmbito do júri e buscou desvendar os fundamentos que embasam antecipação do trânsito em julgado após a sentença condenatória proferida pelo Conselho de Sentença. Para tanto, o presente trabalho recorreu aos fundamentos apresentados pelos Ministros da Suprema Corte no julgamento do Recurso Extraordinário 1.235.340, bem como aos célebres ensinamentos de Rodrigues a partir da sua tese de “coisa julgada parcial” [163] em relação aos fatos e provas no âmbito do Júri.
Em seguida, o capítulo abordou a novidade legislativa do art. 492, I, alínea “e” do CPP e buscou analisar a sua validade substancial em relação ao ordenamento jurídico como um todo. Contudo, o que se pode perceber é que a prisão automática, ainda que limitada aos casos em que a pena alcance 15 anos de reclusão, não pode ser vislumbrada como um corolário decorrente da prevalência da soberania e da própria participação popular. Na verdade, deve ser interpretada como sinônimo de ampliação do poder punitivo estatal a partir da supressão da garantia política do cidadão de gozar do seu estado jurídico de inocente, até que se prove o contrário.
Demonstrou-se, nesse sentido, sua incompatibilidade em relação a Constituição Federal, a Convenção Americana de Direitos do Homem e até mesmo em relação a própria Lei nº. 13.964/2019. Frisou-se, ainda, que a partir da banalização do direito penal como remédio salvador de uma democracia insegura, ecoam projetos de lei como o Pacote Anticrime, que mesclam ranços autoritários de uma “presunção de culpa” e mascaram, em última análise, graves violações de direitos fundamentais a partir da deturpação do discurso garantista.
Entretanto, o que não deve, e nem pode ser esquecido, é que o estado democrático se destina a uma maximização de liberdades a partir da minimização e submissão de poderes.[164] Usar a soberania dos veredictos para tornar factível a execução imediata da sentença condenatória proferida pelo Conselho de Sentença, além de instrumentalizar a feição repressiva e autoritária do processo penal, é responsável, em última análise, por fulminar o basilar princípio da presunção de inocência.
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[1] Não se pode negar a existência de uma força vinculante em relação aos precedentes firmados pelo Supremo, tendo em vista que, independentemente da possibilidade de eventual desconstituição futura, há um verdadeiro caráter coercitivo capaz de manter a própria coerência e isonomia do sistema jurídico como um todo. Nesse sentido: LIMA, Carlos Augusto da Silva Moreira. Execução Provisória da Sentença Penal. Grupo Almedina, 2021.
[2] Disponível em www.STF.com.br. Acesso em 23/01/2022.
[3] Destaca-se que, até a data de finalização do presente trabalho, o Recurso Extraordinário com Repercussão Geral nº. 1235340/SC ainda se encontra pendente de julgamento.
[4] ZANOIDE DE MORAES, Maurício. Presunção de inocência no processo penal brasileiro: análise de sua estrutura normativa para a elaboração legislativa e para a decisão judicial. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 531.
[5] DECLARAÇÕES, Universais. Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão. São Paulo: Direitos Humanos na Internet. Disponível em:< www. dhnet. org. br/direitos/anthist/dec1789. htm> Acesso em 20 de julho de 2022.
[6] DO HOMEM, Declaração Universal dos Direitos. Declaração Universal dos Direitos do Homem. Disponível em: <http://www.onu.org.br/img/2014/09/DUDH.pdf>. Acesso em 20 de julho de 2022.
[7] GOMES, Magno Federici; TRINDADE, Hugo Vidal. A compatibilidade entre a presunção da inocência e a prisão preventiva. Revista IOB de Direito Penal e Processual Penal, Porto Alegre, v. 9, n. 53, p. 18-33, dez./jan.. 2009. Disponível em: http://200.205.38.50/biblioteca/index.asp?codigo_sophia=69923. Acesso em: 23 junho de 2022.
[8] Decreto nº 678, de 6 de novembro de 1992. Promulga a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), de 22 de novembro de 1969. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 09, nov. de 1992. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d0678.htm. Acesso em: 28, jun. 2022.
[9] Art. 8.2 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos: “Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas”
[10] Art. 62.1 da CADH: Todo Estado-Parte pode, no momento do depósito do seu instrumento de ratificação desta Convenção ou de adesão a ela, ou em qualquer momento posterior, declarar que reconhece como obrigatória, de pleno direito e sem convenção especial, a competência da Corte em todos os casos relativos à interpretação ou aplicação desta Convenção.
[11] LEGALE, Siddharta; CAUSANILHAS, Tayara. O caso Schmidt, a liberdade de expressão e a rivalidade entre a comissão e Corte Interamericana de Direitos Humanos nos anos 1980. Inter: Revista de direito internacional e Direitos Humanos da UFRJ, v. 1, n. 1.
[12] Art. 62.3 da CADH: A Corte tem competência para conhecer de qualquer caso relativo à interpretação e aplicação das disposições desta Convenção que lhe seja submetido, desde que os Estados-Partes no caso tenham reconhecido ou reconheçam a referida competência, seja por declaração especial, como prevêem os incisos anteriores, seja por convenção especial; Art. 63.1 da CADH: Quando decidir que houve violação de um direito ou liberdade protegido nesta Convenção, a Corte determinará que se assegure ao prejudicado o gozo do seu direito ou liberdade violados. Determinará também, se isso for procedente, que sejam reparadas as conseqüências da medida ou situação que haja configurado a violação desses direitos, bem como o pagamento de indenização justa à parte lesada.
[13] CORTE INTERAMERICANA DE DIREITO HUMANOS. Caso Suárez Rosero Vs. Ecuador. Sentencia de 12 de noviembre de 1997 (Fondo). Costa Rica. Disponível em: http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_35_esp.pdf. Acesso em: 10/11/2022
[14] Além do artigo 8 que dispõe acerca das garantias judiciais, também se alegava a violação do art. 5 (direito à integridade pessoal); 7 (direito à liberdade pessoal), e 25 (proteção judicial) da Convenção Americana.
[15] BARLETTA, Junya Rodrigues; Assy, Bethânia de Albuquerque. A Prisão Provisória como Medida de Castigo e seus Parâmetros de Intolerabilidade à Luz dos Direitos Humanos. Rio de Janeiro, 2014. 435p. Tese de Doutorado – Departamento de Direito, PUC-RJ. Disponível em: < https://www.dbd.puc-rio.br/pergamum/tesesabertas/0921361_2014_completo.pdf>. Acesso em: 20/11/2022.
[16] CORTE INTERAMERICANA DE DIREITO HUMANOS. Caso Tibi vs. Ecuador. Excepciones Preliminares, Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 7 de septiembre de 2004. Serie C, n. 114. Disponível em: http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_114_esp.pdf. Acesso em: 10/11/2022
[17] CORTE INTERAMERICANA DE DIREITO HUMANOS. Caso Acosta Calderón vs. Ecuador. Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 24 de junio de 2005. Serie C, n. 129. Disponível em: http:// www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_129_esp1.pdf. Acesso em: 11/11/2022
[18] CORTE INTERAMERICANA DE DIREITO HUMANOS. Caso Lori Berenson Mejía Vs. Peru. Sentencia de 25 de noviembre de 2004 (Fondo, Reparaciones y Costas). Costa Rica. Disponível em: http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_119_esp.pdf. Acesso em: 11/09/2021.
[19] CORTE INTERAMERICANA DE DIREITO HUMANOS. Caso Ricardo Canese vs. Paraguai. Sentencia de 31 de agosto de 2004. Disponível em: https://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_111_por.pdf. Acesso em: 11/11/2022
[20] CIDH. Informe de Fondo nº 86/09. Caso 12.553, Jorge, José y Dante Peirano Basso. Disponível em http://www.oas.org/es/cidh/decisiones/fondos.asp, acesso em 01-09-2012.
[21] GARCÍA, Luis M. El derecho internacional de los derechos humanos. Los derechos humanos em el proceso penal, Buenos Aires: Editorial Ábaco de Rodolfo Depalma, 2002, p. 105 e ss.
[22] Como na ocasião em que proferiu o Informe nº 2/97, referente ao caso nº 11205 (Argentina).
[23] CORTE INTERAMERICANA DE DIREITO HUMANOS. Caso Bayarri Vs. Argentina. Voto Concurrente del Juez Sergio García Ramírez, parágrafo 1. Sentencia de 30 de octubre de 2008. Serie C No. 187 apud BARLETTA, Junya Rodrigues; Assy, Bethânia de Albuquerque. A Prisão Provisória como Medida de Castigo e seus Parâmetros de Intolerabilidade à Luz dos Direitos Humanos. Rio de Janeiro, 2014. 435p. Tese de Doutorado – Departamento de Direito, PUC-RJ. Disponível em: < https://www.dbd.puc-rio.br/pergamum/tesesabertas/0921361_2014_completo.pdf>. Acesso em: 20/11/2022
[24] TORRES, Jaime Vegas. Presunción de inocencia y prueba en el proceso penal. La Ley, Madri, 1993, p. 23-24 apud GOMES, Luiz Flávio. Sobre o conteúdo processual tridimensional do princípio da presunção de inocência. Revista dos Tribunais, São Paulo: Thomson Reuters, 1996, p. 2.
[25] MANZINI, Vincenzo; MELENDO, Santiago Sentis; REDIN, Marino Ayerra. Tratado de derecho penal: segunda parte, de los delitos en especial. Ediar, 1957 apud LOPES JÚNIOR, Aury. Direito Processual Penal. 19ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2022, p. 103.
[26] De acordo com a doutrina de Frosali, a Constituição Italiana seria responsável por assegurar uma mera formulação negativa de “não presunção de culpabilidade”. Nesse sentido: GOMES, Luiz Flávio. Sobre o conteúdo processual tridimensional do princípio da presunção de inocência. Revista dos Tribunais, São Paulo: Thomson Reuters, 1996, p. 3.
[27] TORRES, Jaime Vegas. Presunción de inocencia y prueba en el proceso penal. La Ley, Madri, 1993, p. 31-32 apud GOMES, Luiz Flávio. Sobre o conteúdo processual tridimensional do princípio da presunção de inocência. Revista dos Tribunais, São Paulo: Thomson Reuters, 1996, p. 2.
[28] CAMPOS, Francisco. O Estado Nacional. São Paulo: EbooksBrasil, 2002, p. 166.
[29] MELCHIOR, Antonio Pedro et al. Autoritarismo e processo penal brasileiro. Ed. Lumen Juris, 2015, p. 46.
[30] PEREIRA, Rodrigo Faucz et al. Estudos em Homenagem aos 200 anos do Tribunal do Júri no Brasil. São Paulo: Thomson Reuters, 2022, p.134
[31] GOMES, Luiz Flávio. Sobre o conteúdo processual tridimensional do princípio da presunção de inocência. Revista dos Tribunais, São Paulo: Thomson Reuters, 1996, p. 1-2.
[32] Artigo 8.2 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica): “Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas”
[33] Art. 5, parágrafo II da CF: “§ 2º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.”
[34] Decreto nº 678, de 6 de novembro de 1992. Promulga a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), de 22 de novembro de 1969. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 09, nov. de 1992. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d0678.htm. Acesso em: 28, jun. 2022.
[35] NOVELINO, Marcelo. Curso de Direito Constitucional. 16ª edição. Salvador: Editora JusPodivm, 2021, p. 352-355
[36] Decreto nº 678, de 6 de novembro de 1992. Promulga a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), de 22 de novembro de 1969. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 09, nov. de 1992. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d0678.htm. Acesso em: 28, jun. 2022.
[37] LOPES JR, Aury. Fundamentos do processo penal–Introdução crítica. Saraiva Educação SA, 2019.
[38] GOMES, Luiz Flávio. Sobre o conteúdo processual tridimensional do princípio da presunção de inocência. Revista dos Tribunais, São Paulo: Thomson Reuters, 1996, p. 9.
[39] LOPES JÚNIOR, Aury. Direito Processual Penal. 19ª Ed. São Paulo: Saraiva, p. 105, 2022.
[40] Adotaremos a concepção de Gustavo Badaró, em que a distinção entre presunção de inocência e não culpabilidade não se demonstra útil e nem sequer factível no desenvolvimento do processo penal. No presente trabalho, portanto, serão tratadas como sinônimos. Nesse sentido: BADARÓ, Gustavo Henrique. Ônus da prova no processo penal. Editora Revista dos Tribunais. São Paulo: 2003, p. 283.
[41] LIMA, Renato Brasileiro. Manual de Processo Penal. 10ª ed. Salvador: Ed. Juspodivm, 2021, p.49.
[42] BUENO DE CARVALHO, Amilton. Lei, para que (m). Escritos de Direito e Processo Penal em Homenagem ao Professor Paulo Cláudio Tovo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001, p. 51.
[43] LIMA, Renato Brasileiro. Manual de Processo Penal. 10ª ed. Salvador: Ed. Juspodivm, p. 50, 2021.
[44] BRASIL, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RE n. 591.054-SC, rel. Min. Rel. Min. Marco Aurélio. Tribunal Pleno, julgado em 17/12/2014, DJe de 26/02/2015.
[45] LOPES JÚNIOR, Aury. Direito Processual Penal. 19ª Ed. São Paulo: Saraiva, p. 49, 2022.
[46] LOPES JÚNIOR, Aury. Direito Processual Penal. 19ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2022, p. 107.
[47] DINAMARCO, Cândido Rangel. Instrumentalidade do processo. 1986, p. 415 apud GOMES FILHO, Antonio Magalhaes. Princípio da presunção de inocência na constituição de 1988 e na convenção americana sobre direitos humanos (pacto de São José da Costa Rica). Revista do advogado, n. 42, p. 30-4, 1994.
[48] GOMES FILHO, Antonio Magalhaes. Princípio da presunção de inocência na constituição de 1988 e na convenção americana sobre direitos humanos (pacto de São José da Costa Rica). Revista do advogado, n. 42, p. 30-4, 1994.
[49] Art. 5º da Constituição Federal [...] LXIII – “o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado.”
[50] OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. Belo Horizonte: Del Rey, 2005, p.31
[51] LIMA, Renato Brasileiro. Manual de Processo Penal. 10ª ed. Salvador: Ed. Juspodivm, 2021, p. 48-49.
[52] LOPES JÚNIOR, Aury. Direito Processual Penal. 19ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2022, p. 107.
[53] GOMES, Magno Federici; TRINDADE, Hugo Vidal. A compatibilidade entre a presunção da inocência e a prisão preventiva. Revista IOB de Direito Penal e Processual Penal, Porto Alegre, v. 9, n. 53, p. 18-33, dez./jan 2009. Disponível em: http://200.205.38.50/biblioteca/index.asp?codigo_sophia=69923. Acesso em: 23 junho de 2022
[54] Art. 312 do CPP: “A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria e de perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado.”
[55] BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A prisão preventiva e o princípio da proporcionalidade: proposta de mudanças legislativas. Revista da Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, v. 103, 2008, p. 381-408.
[56] Art. 283 do CPP: “Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de prisão cautelar ou em virtude de condenação criminal transitada em julgado.” (GRIFOS NOSSOS)
[57] LOPES JR, Aury. Fundamentos do processo penal–Introdução crítica. Saraiva Educação SA, 2019, p.118.
[58] SANTOS FONSECA, David. Assumindo riscos: a importação de estratégias de punição e controle social no Brasil. Ambivalência, contradição e volatilidade no sistema penal: leituras contemporâneas da sociologia da punição, 2012, p. 297-338.
[59] BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal 1 Parte Geral. Saraiva Educação SA, 2018.
[60] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 84.078/MG. Tribunal Pleno. Relatoria: Min. Eros Grau. Brasília, 5 de fev. de 2009. Disponível em: <https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur173893/false> Acesso em 29, jun. 2022.
[61] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 126.292/SP. Tribunal Pleno. Relator: Min. Teori Zavascki. Brasília, 17 de fev. de 2016. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=10964246>. Acesso em: 29, jun. 2022.
[62] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADC 43, 44 e 54. Tribunal Pleno. Relatoria: Min. Marco Aurélio. Brasília, 7 de nov. de 2019. Disponível em: <https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur436271/false> Acesso em: 29, jun. 2022.
[63] Nesse sentido, cita-se o seguinte precedente: “PRESUNÇÃO DE NÃO CULPABILIDADE. EXECUÇÃO PENAL PROVISÓRIA E PRESUNÇÃO DE NÃO CULPABILIDADE. A jurisprudência assente do Tribunal é no sentido de que a presunção constitucional de não culpabilidade - que o leva a vedar o lançamento do nome do réu no rol dos culpados - não inibe, porém, a execução penal provisória da sentença condenatória sujeita a recursos despidos de efeito suspensivo, quais o especial e o extraordinário: aplicação da orientação majoritária, com ressalva da firme convicção em contrário do relator” (STF, Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, HC 80535/SC, Relator (a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Julgamento: 12/12/2000, Órgão Julgador: Primeira Turma).
[64] Art. 27, § 2º da Lei nº 8.038/90: “Os recursos extraordinário e especial serão recebidos no efeito devolutivo.”
[65] O art. 637 do CPP estabelece que “o recurso extraordinário não tem efeito suspensivo, e uma vez arrazoados pelo recorrido os autos do traslado, os originais baixarão à primeira instância para a execução da sentença”
[66]BRASIL. Lei nº 7.209, de 11 de julho de 1984. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L7210.htm>. Acesso em 20 de nov. de 2022.
[67] HABEAS CORPUS. PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS. EXECUÇÃO ANTES DO TRÂNSITO EM JULGADO. IMPOSSIBILIDADE. O artigo 147 da Lei de Execução Penal é claro ao condicionar a execução da pena restritiva de direitos ao trânsito em julgado da sentença condenatória. Precedentes. Ordem concedida. (STF, HC n. 86.498, 2a Turma, Eros Grau, DJ de 19/05/2006).
[68] STF. HC 85.886/RJ. Rel.ª Min.ª Ellen Gracie. Segunda Turma, julgado em 06.09.05, publicado em 28.10.05.
[69] Súmula 716: “Admite-se a progressão de regime de cumprimento da pena ou a aplicação imediata de regime menos severo nela determinada, antes do trânsito em julgado da sentença condenatória.”
[70] Súmula 717: “Não impede a progressão de regime de execução da pena, fixada em sentença não transitada em julgado, o fato de o réu se encontrar em prisão especial.”
[71] STRECK, Lenio; BREDA, JULIANO. O dia em que a Constituição foi julgada: a história das ADCs 43, 44 e 54. São Paulo: Thomson Reuters, 2020, p.96.
[72] DOS SANTOS ROSA, Moisés; JÚNIOR, Hamilton da Cunha Iribure. Relativização da presunção de inocência sobre o prisma da integridade e coerência de Ronald Dworkin. Revista de Direito Penal, Processo Penal e Constituição, v. 4, n. 1, p. 45-67, 2018.
[73] LOPES JR, Aury. Fundamentos do processo penal–Introdução crítica. Saraiva Educação SA, 2019. págs.42-59.
[74] DWORKIN, Ronald M.; CAMARGO, Jefferson Luiz; RIOS, Gildo. O império do direito. Martins Fontes, 2007, p. 275.
[75] STRECK, Lenio; BREDA, JULIANO. O dia em que a Constituição foi julgada: a história das ADCs 43, 44 e 54. São Paulo: Thomson Reuters, 2020, p.96.
[76] A polêmica tese de “normas constitucionais inconstitucionais” elaborada por Otto Bachof no contexto pós segunda guerra mundial nunca foi reconhecida pelo direito brasileiro, seja pela jurisprudência, seja pela própria doutrina constitucional. Nesse sentido: STRECK, Lenio; BREDA, JULIANO. O dia em que a Constituição foi julgada: a história das ADCs 43, 44 e 54. São Paulo: Thomson Reuters, 2020, p.37-38.
[77] Art. 97 da CF/88: “Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público”.
[78]BRASIL. Câmara dos Deputados. PEC 199/2019. Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2229938. Acesso em: 15 nov. 2022.
[79] BRASIL. Senado Federal. PEC 5/2019. Disponível em: https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/135253. Acesso em: 15 nov. 2022.
[80] Art. 60 da CF/88: “A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: (...) § 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: (...) IV - os direitos e garantias individuais.”
[81] MALAN, Diogo Rudge. Defesa penal efetiva. Ciências Penais: Revista da Associação Brasileira de Professores de Ciências Penais, São Paulo, v. 3, n. 4, p. 253-277, 2006.
[82] BARROS, Marco Antônio de. Procedimento penal acusatório das" Quaestiones Perpetuae": fonte da soberania dos veredictos do tribunal do júri. Justitia, 1997.
[83] TUCCI, Rogério Lauria et al. Tribunal do júri: estudo sobre a mais democrática instituição jurídica brasileira. São Paulo: Revista dos Tribunais, v. 1, 1999.
[84] BARROS, Marco Antônio de. Procedimento penal acusatório das"Quaestiones Perpetuae": fonte da soberania dos veredictos do tribunal do júri. Justitia, 1997.
[85] MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. Edição Saraiva, 1963, p.73
[86] STRECK, Lenio Luiz. Tribunal do júri: símbolos &rituais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998 p. 73.
[87] KURKOWSKI, Rafael Schwez. Execução provisória da pena no júri: fundamentos jurídicos e políticos. Belo Horizonte: Editora D’ Plácido, 2019, p.51.
[88] Ibidem, p. 60.
[89] JÚNIOR, Angelo Ansanelli. O tribunal do júri e a soberania dos veredictos. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p.40.
[90] Embora não estivesse expressamente prevista na Constituição Polaca de 1937, o Decreto – Lei nº 167 disciplinou o Tribunal do Juri, provando, portanto, sua existência até mesmo durante a vigência do Estado Novo. Nesse sentido: “[...] o Ministro Francisco Campos, na Exposição de Motivos que acompanhava o diploma legal, afirmou a subsistência do tribunal popular, por estar compreendido no preceito genérico do art. 183, da Carta de 10 de novembro, que declarava em vigor, enquanto não revogadas, as leis que, explícita ou implicitamente, não contrariassem as disposições da Constituição. O Decreto-lei 16 alterou profundamente o Júri, subtraindo-lhe a chamada soberania dos veredictos, com a instituição da apelação sobre o mérito, desde que houvesse injustiça da decisão, por sua completa divergência, com as provas existentes nos autos ou produzidas em plenário”. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. Edição Saraiva, 1963, p.53
[91] Art. 425 do CPP: “Anualmente, serão alistados pelo presidente do Tribunal do Júri de 800 (oitocentos) a 1.500 (um mil e quinhentos) jurados nas comarcas de mais de 1.000.000 (um milhão) de habitantes, de 300 (trezentos) a 700 (setecentos) nas comarcas de mais de 100.000 (cem mil) habitantes e de 80 (oitenta) a 400 (quatrocentos) nas comarcas de menor população. § 2º O juiz presidente requisitará às autoridades locais, associações de classe e de bairro, entidades associativas e culturais, instituições de ensino em geral, universidades, sindicatos, repartições públicas e outros núcleos comunitários a indicação de pessoas que reúnam as condições para exercer a função de jurado.”
[92] KURKOWSKI, Rafael Schwez. Execução provisória da pena no júri: fundamentos jurídicos e políticos. Belo Horizonte: Editora D’ Plácido, 2019, p.50.
[93] SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 24. ed. Ver. e atual. nos termos da reforma constitucional (até a Emenda Constitucional n. 45, de 8.12.2004, publicada em 31.12.2004). São Paulo: Malheiros, 2005.
[94] KURKOWSKI, Rafael Schwez. O cumprimento imediato da sentença condenatória justificado pelo caráter democrático do júri. Revista Direito e Liberdad, Natal, v. 21, n. 3, р.267-315, set./dez.2019. Disponível em: <http://ww2.esmarn.tjrn.jus.br/revistas/index.php/revistadireitoeliberdade/article/view/1890>. Acesso em: 09 set. 2022.
[95] Art. 5º, inciso XXXVIII, da CF/88: “é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei [...]”
[96] Art. 5º da CF/88: “(...) LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”
[97] Art. 564 do CPP: “A nulidade ocorrerá nos seguintes casos: III - por falta das fórmulas ou dos termos seguintes: c) a nomeação de defensor ao réu presente, que o não tiver, ou ao ausente, e de curador ao menor de 21 anos.”
[98] LIMA, Renato Brasileiro. Manual de Processo Penal. 10ª ed. Salvador: Ed. Juspodivm, p. 1239, 2021
[99] Nesse sentido: OLIVEIRA, Marcus Vinícius Amorim de. Tribunal do Júri Popular na ordem jurídica constitucional. 5ª Ed. Curitiba: Juruá, 2020. p. 94-95.
[100]LIMA, Renato Brasileiro. Manual de Processo Penal. 10ª ed. Salvador: Ed. Juspodivm, p. 1239, 2021.
[101] Art. 386 do CPP: “O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça: I - estar provada a inexistência do fato; II - não haver prova da existência do fato; III - não constituir o fato infração penal; IV – estar provado que o réu não concorreu para a infração penal; V – não existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal; VI – existirem circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de pena (arts. 20, 21, 22, 23, 26 e § 1º do art. 28, todos do Código Penal), ou mesmo se houver fundada dúvida sobre sua existência; VII – não existir prova suficiente para a condenação.”
[102] Art. 497 do CPP: “São atribuições do juiz presidente do Tribunal do Júri, além de outras expressamente referidas neste Código: [...] V – nomear defensor ao acusado, quando considerá-lo indefeso, podendo, neste caso, dissolver o Conselho e designar novo dia para o julgamento, com a nomeação ou a constituição de novo defensor.”
[103] KURKOWSKI, Rafael Schwez. Execução provisória da pena no júri: fundamentos jurídicos e políticos. Belo Horizonte: Editora D’ Plácido, 2019, p.126.
[104] LIMA, Renato Brasileiro. Manual de Processo Penal. 10ª ed. Salvador: Ed. Juspodivm, p. 1245, 2021.
[105] KURKOWSKI, Rafael Schwez. Execução provisória da pena no júri: fundamentos jurídicos e políticos. Belo Horizonte: Editora D’ Plácido, 2019, p.56.
[106] Art. 74 do CPP: “A competência pela natureza da infração será regulada pelas leis de organização judiciária, salvo a competência privativa do Tribunal do Júri: § 1º Compete ao Tribunal do Júri o julgamento dos crimes previstos nos arts. 121, §§ 1º e 2º, 122, parágrafo único, 123, 124, 125, 126 e 127 do Código Penal, consumados ou tentados.”
[107] LIMA, Renato Brasileiro. Manual de Processo Penal. 10ª ed. Salvador: Ed. Juspodivm, p. 1245, 2021.
[108] Art. 483 do CPP: “Os quesitos serão formulados na seguinte ordem, indagando sobre: [...] §1º A resposta negativa, de mais de 3 (três) jurados, a qualquer dos quesitos referidos nos incisos I e II do caput deste artigo encerra a votação e implica a absolvição do acusado.”
[109] Art. 466 do CPP: “Antes do sorteio dos membros do Conselho de Sentença, o juiz presidente esclarecerá sobre os impedimentos, a suspeição e as incompatibilidades constantes dos arts. 448 e 449 deste Código: § 1º O juiz presidente também advertirá os jurados de que, uma vez sorteados, não poderão comunicar-se entre si e com outrem, nem manifestar sua opinião sobre o processo, sob pena de exclusão do Conselho e multa, na forma do § 2º do art. 436 deste Código.”
[110] Para Aramis Nassif, o tribunal do Juri seria um órgão autônomo do Poder Judiciário, na medida em que além de não estar previsto no art. 92 da Carta Constitucional, não estaria submetido a necessidade de motivação das decisões proferidas. Nesse sentido: NASSIF, Aramis. O novo júri brasileiro: conforme a Lei 11,689/08. Livraria do Advogado Editora, 2009.
[111] LIMA, Renato Brasileiro. Manual de Processo Penal. 10ª ed. Salvador: Ed. Juspodivm, p. 1239, 2021.
[112] Art. 5º da Constituição Federal (...) LXI – “ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei;”
[113] Art. 93 da Constituição Federal: “Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios: (...) IX - todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação.”
[114] STRECK, Lenio Luiz. Tribunal do júri: símbolos & rituais. 3. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998. p. 118.
[115] LOPES JÚNIOR, Aury. Direito Processual Penal. 10ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2018, p. 1063-1064
[116] VIVEIROS, Mauro. Tribunal do júri na ordem constitucional brasileira: um órgão da cidadania. são Paulo: juarez de Oliveira, 2003, p. 23 apud KURKOWSKI, Rafael Schwez. Execução provisória da pena no júri: fundamentos jurídicos e políticos. Belo Horizonte: Editora D’ Plácido, 2019, p.50.
[117] MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. Campinas: Bookseller, 1997.
[118] Ibidem, p. 51
[119] CARVALHO, Cláudia Fernanda Souza de. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO TRIBUNAL DO JÚRI. Revista Jurídica (FURB), [S.l.], v. 13, n. 26, p. 95-104, jun. 2010. ISSN 1982-4858. Disponível em: <https://bu.furb.br/ojs/index.php/juridica/article/view/1887>. Acesso em: 23 nov. 2022.
[120] KURKOWSKI, Rafael Schwez. Execução provisória da pena no júri: fundamentos jurídicos e políticos. Belo Horizonte: Editora D’ Plácido, 2019, p.62.
[121] RODRIGUES, Paulo Gustavo. Redefinindo o trânsito em julgado a partir da soberania dos veredictos: a coisa julgada parcial no tribunal do júri. Revista Brasileira de Direito Processual Penal, v. 6, n. 2, p. 902, 2020.
[122] “Como toda regra geral, obviamente que pode haver exceções, notadamente nos casos de recursos especial ou extraordinário que apresentem discussão jurídica com a potencialidade de eventualmente anular a sessão de julgamento ou permaneça questão de divergência interna na decisão dos julgadores (togado e leigo), hipótese em que esta eficácia preclusiva não se verificará em qualquer dos capítulos, sendo premente a espera da manifestação das Cortes Supremas”. RODRIGUES, Paulo Gustavo. Redefinindo o trânsito em julgado a partir da soberania dos veredictos: a coisa julgada parcial no tribunal do júri. Revista Brasileira de Direito Processual Penal, v. 6, n. 2, p. 902, 2020.
[123] KURKOWSKI, Rafael Schwez. Execução provisória da pena no júri: fundamentos jurídicos e políticos. Belo Horizonte: Editora D’ Plácido, 2019, p.51.
[124] SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 26ª ed. São Paulo: Malheiros, 2006
[125] PEREIRA, Rodrigo Faucz et al. Estudos em Homenagem aos 200 anos do Tribunal do Júri no Brasil. São Paulo: Thomson Reuters, p. 41, 2022.
[126] Entendimento proferido por Nelson Hungria em conferência reportada por Lima. LIMA, Alcides de Mendonça. Júri: instituição nociva e arcaica. Revista Forense, v. 196, 1961.
[127] PEREIRA, Rodrigo Faucz et al. Estudos em Homenagem aos 200 anos do Tribunal do Júri no Brasil. São Paulo: Thomson Reuters, p. 28, 2022.
[128] RANGEL, Paulo. Tribunal do júri: visão lingüística, histórica, social e jurídica. Editora Lumen Juris, 2009.
[129] Art. 593 do CPP: “Caberá apelação no prazo de 5 (cinco) dias:III - das decisões do Tribunal do Júri, quando: d) for a decisão dos jurados manifestamente contrária à prova dos autos.”
[130] MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. Edição Saraiva, 1963.
[131] MELCHIOR, Antonio Pedro. Crítica científica de "Redefinindo o trânsito em julgado a partir da soberania dos veredictos: a coisa julgada parcial no tribunal do júri”. Revista Brasileira de Direito Processual Penal, v. 6, n. 2, p. 1059-1078, 2020.
[132] RODRIGUES, Paulo Gustavo. Redefinindo o trânsito em julgado a partir da soberania dos veredictos: a coisa julgada parcial no tribunal do júri. Revista Brasileira de Direito Processual Penal, v. 6, n. 2, p. 886, 2020.
[133] Sobre o tema, leciona Aury Lopes: “Em que pese todo o esforço da Teoria do Garantismo Penal e das constituições dos Estados de direito modernos, inclusive a brasileira, em fazer valer os axiomas fundamentais garantistas, principalmente no que se refere ao estado de inocência do acusado e à limitação do jus puniendi estatal, a prática forense ignorou por completo tais disposições, criando o in dubio pro societate, inserido indevidamente no ordenamento jurídico por meio da jurisprudência, como se princípio fosse, mas sem qualquer alicerce legal que o sustente” LOPES JÚNIOR, Aury. Direito Processual Penal. 15 ed. São Paulo: Saraiva, 2018, p. 359.
[134] RODRIGUES, Paulo Gustavo Lima e Silva. Os efeitos da soberania dos veredictos na definição do momento inicial de cumprimento das penas impostas pelo Tribunal do Júri. 2018. Dissertação (Mestrado em Direito Público). Faculdade de Direito da Universidade Federal de Alagoas, Maceió, 2018. Disponível em: <http://www.repositorio.ufal.br/handle/riufal/3250>. Acesso em: 20 de nov. de 2022.
[135]BRASIL. Lei nº. 13.964, de 24 de dezembro de 2019. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13964.html>
[136] Art. 492, inciso I, alínea “e”, § 3º, do CPP: O presidente poderá, excepcionalmente, deixar de autorizar a execução provisória das penas de que trata a alínea e do inciso I do caput deste artigo, se houver questão substancial cuja resolução pelo tribunal ao qual competir o julgamento possa plausivelmente levar à revisão da condenação.
[137] LOPES JÚNIOR, Aury. Direito Processual Penal. 19ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2022, p. 958.
[138] NOVELINO, Marcelo. Curso de Direito Constitucional. 16ª edição. Salvador: Editora JusPodivm, 2021, p. 352-355
[139] STF, Pleno, ADI 6.735-DF, Rel. Min. Luiz Fux
[140] STF, Pleno, ADI 6.783-DF, Rel. Min. Luiz Fux
[141] O Ministro destaca em seu voto que, entre janeiro de 2017 e outubro de 2019, foram proferidas 15.411 sentenças pelo Tribunal do Júri, no estado de São Paulo. Contudo, de todas as decisões proferidas pelo Júri, em apenas 1,97% dos casos houve a intervenção do Tribunal de segundo grau para, a pedido do réu, devolver a matéria para a análise do Júri.
[142] Art. 597 do CPP: “A apelação de sentença condenatória terá efeito suspensivo, salvo o disposto no artigo 393, a aplicação provisória de interdições de direitos e de medidas de segurança (artigos 374 e 378), e o caso de suspensão condicional de pena.”
[143] BARLETTA, Junya Rodrigues; Assy, Bethânia de Albuquerque. A Prisão Provisória como Medida de Castigo e seus Parâmetros de Intolerabilidade à Luz dos Direitos Humanos. Rio de Janeiro, 2014. 435p. Tese de Doutorado – Departamento de Direito, PUC-RJ. Disponível em: < https://www.dbd.puc-rio.br/pergamum/tesesabertas/0921361_2014_completo.pdf>. Acesso em: 20/11/2022
[144] BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal 1: Parte Geral. Saraiva Educação SA, 2018, p. 151.
[145] O artigo revogado, incluído pela Lei nº 11.689, de 2008, somente previa a possibilidade de execução provisória da sentença condenatória diante da presença de requisitos excepcionais. Nesse sentido: “Art. 492. Em seguida, o presidente proferirá sentença que: (...) e) mandará o acusado recolher-se ou recomendá-lo-á à prisão em que se encontra, se presentes os requisitos da prisão preventiva.” (grifos nossos)
[146] CORTE INTERAMERICANA DE DIREITO HUMANOS. Caso Suárez Rosero Vs. Ecuador. Sentencia de 12 de noviembre de 1997 (Fondo). Costa Rica. Disponível em: http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_35_esp.pdf. Acesso em: 10/11/2022
[147] PEREIRA, Rodrigo Faucz et al. Estudos em Homenagem aos 200 anos do Tribunal do Júri no Brasil. São Paulo: Thomson Reuters, 2022, p.127-145
[148] Ibidem, p.127-145.
[149] LIMA, Carlos Augusto da Silva Moreira. Execução Provisória da Sentença Penal. Grupo Almedina, 2021.
[150] LOPES JR, Aury. Direito Processual Penal. 19ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2022.
[151] Ibidem.
[152] PEREIRA, Rodrigo Faucz et al. Estudos em Homenagem aos 200 anos do Tribunal do Júri no Brasil. São Paulo: Thomson Reuters, 2022, p.127-145.
[153]MELCHIOR, Antonio Pedro. Crítica científica de "Redefinindo o trânsito em julgado a partir da soberania dos veredictos: a coisa julgada parcial no tribunal do júri”. Revista Brasileira de Direito Processual Penal, v. 6, n. 2, p. 1059-1078, 2020.
[154] O postulado da igualdade advém da própria noção de racionalidade, tendo em vista que não é coerente, tampouco justificável sob o ponto de vista logico, atribuir um tratamento desigual para pessoas que se encontram em situações objetivamente semelhantes. Nesse sentido: LIMA, Carlos Augusto da Silva Moreira. Execução Provisória da Sentença Penal. Grupo Almedina, 2021.
[155] Art. 313 do CPP: “Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão preventiva: § 2º Não será admitida a decretação da prisão preventiva com a finalidade de antecipação de cumprimento de pena ou como decorrência imediata de investigação criminal ou da apresentação ou recebimento de denúncia. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)”
[156] Trata-se de relevante precedente em que a primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, em um Habeas Corpus de relatoria do Ministro Marco Aurélio, firmou, por maioria dos votos, o entendimento de que a prisão de um réu condenado pelo Conselho de Sentença, ainda que sujeita a eventuais recursos posteriores, estaria em plena consonância com o princípio assecuratório da presunção de inocência. Na ocasião, a partir da divergência apresentada pelo Ministro Luís Roberto Barroso, acompanhada pelos Ministros Rosa Weber e Luiz Fux, restou consignado, que, independentemente da pendência do julgamento de recursos interpostos pelo réu, é possível a execução da condenação proferida pelo Conselho de Sentença em razão da soberania dos veredictos e impossibilidade de reanálise jurisdicional acerca dos fatos e provas. Nesse sentido: BRASIL. Supremo Tribunal Federal (1ª Turma). Habeas Corpus n º 118. 770/SP, [...] CONDENAÇÃO PELO TRIBUNAL DO JÚRI. SOBERANIA DOS VEREDICTOS. INÍCIO DO CUMPRIMENTO DA PENA. POSSIBILIDADE. [...] Tese de julgamento: “A prisão de réu condenado por decisão do Tribunal do Júri, ainda que sujeita a recurso, não viola o princípio constitucional da presunção de inocência ou não-culpabilidade.” [...], Relator: Ministro Marco Aurélio, 07 de março de 2017. Disponível em: http://www.criminal.mppr.mp.br/arquivos/File/HC_118_770_10mar2017.pdf. Acesso em: 27, jun. 2022. (GRIFOS NOSSOS)
[157] Destaca-se que o precedente firmado pela Primeira Turma do STF, na ocasião de julgamento do HC nº 118.770/SP, embora sem efeito vinculante, foi invocado como fundamento no HC nº 140.449/RJ. Nesse sentido: BRASIL. Supremo Tribunal Federal (1ª Turma). Habeas Corpus n º140.449/RJ [...] Execução provisória da pena. Possibilidade. Inadequação da via eleita. [...] 2. A orientação firmada pelo Plenário do STF, no julgamento do HC 126.292 e do ARE 964.246-RG, ambos da relatoria do Min. Teori Zavascki, é no sentido de que a execução provisória da pena não compromete o princípio da presunção de inocência. Ademais, o julgamento condenatório em segundo grau de jurisdição impõe a prisão preventiva como medida de garantia da ordem pública. [...], Relator: Ministro Marco Aurélio, 06 de novembro de 2018. Disponível em: http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=748979180. Acesso em: 27, jun. 2022.
[158] LOPES JR, Aury. Fundamentos do processo penal–Introdução crítica. Saraiva Educação SA, 2019.
[159]BRASIL. Senado Federal. PL n° 1192/22. Disponível em: https://www.congressonacional.leg.br/materias/materias-bicamerais/-/ver/pl-1192-2022. Acesso em:15 nov. 2022.
[160] GOMES, Luiz Flávio; GAZOTO; Luís Wanderley. Populismo penal legislativo. A tragédia que não assusta as sociedades de massas. 2ª ed. Salvador: Jus Podivm, 2020, p. 17 apud LIMA, Carlos Augusto da Silva Moreira. Execução Provisória da Sentença Penal. Grupo Almedina, 2021.
[161] GOMES, Luiz Flávio; GAZOTO; Luís Wanderley. Populismo penal legislativo. A tragédia que não assusta as sociedades de massas. 2ª ed. Salvador: Jus Podivm, 2020, p. 16 apud LIMA, Carlos Augusto da Silva Moreira. Execução Provisória da Sentença Penal. Grupo Almedina, 2021.
[162] SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 24. ed. Ver. e atual. nos termos da reforma constitucional (até a Emenda Constitucional n. 45, de 8.12.2004, publicada em 31.12.2004). São Paulo: Malheiros, 2005.
[163] RODRIGUES, Paulo Gustavo. Redefinindo o trânsito em julgado a partir da soberania dos veredictos: a coisa julgada parcial no tribunal do júri. Revista Brasileira de Direito Processual Penal, Porto Alegre, v. 6, n. 2, p. 873-910, mai.-ago. 2020. Disponível em: https://revista.ibraspp.com.br/RBDPP/article/view/301. Acesso em: 28, jun. 2022.
[164] FERRAJOLI, Luigi. Garantismo. Uma discussão sobre Direito e Democracia. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2012
Formada pela Faculdade Nacional de Direito. Advogada. Pós graduanda.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: RIBEIRO, Mariane Novo. A execução provisória da pena no âmbito do Tribunal do Júri: Uma análise do art. 492, inciso i, alínea “e”, do CPP à luz da presunção de inocência Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 11 nov 2024, 04:56. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/66985/a-execuo-provisria-da-pena-no-mbito-do-tribunal-do-jri-uma-anlise-do-art-492-inciso-i-alnea-e-do-cpp-luz-da-presuno-de-inocncia. Acesso em: 09 dez 2024.
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