RESUMO: O presente trabalho objetivou analisar a posse sob o enfoque da teoria objetiva de Rudolf Von Ihering em contraposição à teoria subjetiva de Friedrich Carl Von Savigny. A finalidade foi entender a conceituação de posse, elementos e objeto, sua natureza jurídica e, com isso, melhor entender as teorias estudadas. Para tanto, utilizou-se a técnica de pesquisa documental indireta por meio de utilização de livros, técnica fundamental para esclarecer as ideias através do raciocínio, produzindo afirmações lógicas à conclusão. Observou-se que a posse é a relação direta da pessoa para com o bem, configurando uma relação de direito real e com isso a teoria objetiva de Rudolf Von Ihering é a vigorante no direito civil brasileiro.
Palavras-chave: Direito possessório; Teorias explicativas da posse; Natureza jurídica.
1 INTRODUÇÃO
O estudo do direito possessório se mostra tão importante que tem proteção constitucional. A sociedade primitiva tinha na posse uma forma de sobrevivência, de onde se extraia o mantimento da família e quando os recursos daquela propriedade esgotavam, migravam para outra região. A isso podemos dizer que havia a propriedade, mas o uso era por meio da posse.
Na era civilista contemporânea a propriedade existe, mas não se confunde com a posse. Esta traz a ideia de um exercício em coisas alheias e aquela é compreendida como o uso da própria coisa. Diante disso, surge a complexidade em entender o direito possessório, como sendo um dos ramos do direito que mais influencia as lides nos tribunais.
Dessa forma, a conceituação de posse não é universal o que reclama estudar teorias como a objetiva de Rudolf Von Ihering e a subjetiva de Friedrich Carl Von Savigny. Tais teorias trarão uma visão mais ampla para o direito possessório. Destarte existirem outras teorias explicativas da posse, estas têm maior aceitação no direito e na doutrina brasileira.
Esses estudos mostram que os elementos constitutivos da posse estão ligados diretamente ao bem possuído. É preciso de um corpo, algo apropriável para que seja viável a posse sobre esse bem. Assim, seu próprio objeto será tudo àquilo que for passível de apropriação. Da mesma forma, a natureza jurídica da posse se resume em um direito real que tem relação do possuidor com o bem possuído.
2 NOÇÕES SOBRE DIREITO POSSESSÓRIO
É unanimidade, entre os doutrinadores, o entendimento de que o estudo da posse se resume em um dos mais difíceis assuntos da ciência jurídica civilista. Este é o ensinamento de Carlos Roberto Gonçalves apud Roberto de Ruggiero (2011), nos seguintes dizeres:
Não há matéria que se ache mais cheia de dificuldades do que esta, no que se refere à sua origem histórica, ao fundamento racional da sua proteção, à sua terminologia, à sua estrutura teórica, aos elementos que a integram, ao seu objeto, aos seus efeitos, aos modos de adquiri-la e de perdê-la (GONÇALVES, 2011, p. 44).
No mesmo sentido, Maria Helena Diniz leciona que, “não há entendimento harmônico a respeito da origem da posse como estado de fato legalmente protegido” (2010, p. 31). Nesse caso, há de se depreender que as mudanças nos modos ou formas de aquisição da posse, assim como sua definição, dependerão da adoção da teoria explicativa.
3 CONCEITO DE POSSE
Em brevidade, Silvio Rodrigues (2009, p. 16) define a posse como sendo “uma situação de fato que é protegida pelo legislador”. No entanto, essa conceituação é muito superficial e pouco didática, sendo Maria Helena Diniz (2010), mais completa em sua definição, ao afirmar “que a posse é o exercício, pleno ou não, de fato dos poderes reais sobre coisas alheias, hipótese em que recebe a denominação de quase posse, que vem desde os romanos” (p. 38).
Nesse sentido, pode-se inferir que o conceito de posse está intimamente relacionado com a origem da mesma. Isto por que, segundo a doutrina majoritária, a posse se desenvolveu nos seios de Roma. Nesse diapasão são as lições de Carlos Roberto Gonçalves (2011), segundo o qual “a origem da posse é controvertida, malgrado se admita que em Roma tenha ocorrido o seu desenvolvimento” (p. 47). Portanto, o conceito de posse mostra-se desenvolvido em um tempo, que por seu turno surgiu anteriormente.
Carlos Roberto Gonçalves apud Joel Dias Figueira Júnior (2011, p. 62), define posse na seguinte conformidade:
Não é o exercício do poder, mas sim o poder propriamente dito que tem o titular da relação fática sobre um determinado bem, caracterizando-se tanto pelo exercício como pela possibilidade de exercício. Ela é a disponibilidade e não a disposição; é a relação potestativa e não, efetivamente, o exercício (GONÇALVES apud FIGUEIRA JÚNIOR, 2011, p. 62).
Dessa forma, a posse é a relação direta da pessoa para com o bem, configurando um vínculo de direito real. Este vínculo dá ao possuidor o direito de contra quem quer que seja de defender a propriedade em seu favor (DINIZ, 2010), inclusive contra o próprio proprietário.
4 PRINCIPAIS TEORIAS EXPLICATIVAS DA POSSE
Assim sendo, Maria Helena Diniz (2010, p. 43) aponta que surgiram várias teorias para definir a posse. No entanto, sobrepujaram-se duas: a objetiva e a subjetiva.
Ainda segundo a autora, a segunda teoria define que a “posse é o poder imediato que tem a pessoa de dispor fisicamente de um bem com a intenção de tê-lo para si e de defendê-lo contra a agressão de quem quer que seja” (DINIZ, p. 43). Assim, a posse se confunde com o possuidor. O mentor dessa teoria é Friedrich Von Savigny, segundo disserta Carlos Roberto Gonçalves (2011, p. 49),
Para Savigny, a posse caracteriza-se pela conjunção de dois elementos: o corpus, elemento objetivo que consiste na detenção física da coisa, e o animus, elemento subjetivo, que se encontra na intenção de exercer sobre a coisa um poder no interesse próprio e de defendê-la contra a intervenção de outrem. Não é propriamente a convicção de ser dono […], mas a vontade de tê-la como sua […], de exercer o direito de propriedade como se fosse o seu titular (GONÇALVES, 2011, p. 49).
Já segundo Maria Helena Diniz (2010), a teoria objetiva defende que a “posse é a exteriorização do domínio, ou seja, a relação exterior intencional, existente, normalmente, entre o proprietário e a coisa” Diniz (2010, p. 43). Continua a autora afirmando que “para que haja posse basta o corpus; o animus está ínsito no poder de fato exercido sobre a coisa; o que importa é a destinação econômica do bem” (p. 43).
No mesmo sentido, ao explicar a teoria de Savigny, Silvio Rodrigues (2009, p. 18), pondera que “os dois elementos são indispensáveis para que se caracterize a posse, pois, se faltar o corpus, inexiste relação de fato entre a pessoa e a coisa; e, se faltar o animus, não existe a posse, mas mera detenção” (RODRIGUES, p. 18).
Da mesma forma, Maria Helena Diniz apud Jefferson Daibert (2010, p. 35), perfilha que “pela teoria subjetiva é inadmissível a posse por outrem, porque não podemos ter, para terceiro, a coisa com o desejo de que seja nossa”. Acrescenta a autora, “pois se não há vontade de ter a coisa como própria, haverá apenas detenção” (p. 35).
Quanto à teoria objetiva de Rudolf Von Ihering, ensina Carlos Roberto Gonçalves (2011, p. 51), que
É por ele próprio denominada objetiva porque não empresta à intenção, ao animus, a importância que lhe confere a teoria subjetiva. Considera-o como já incluído no corpus e dá ênfase, na posse, ao seu caráter de exteriorização da propriedade. Para que a posse exista, basta o elemento objetivo, pois ela se revela na maneira como o proprietário age em face da coisa.
Ainda nas palavras de Carlos Roberto Gonçalves (2011, p. 51), a proteção dada à posse tem respaldo na manifestação do domínio, protegendo o bem:
A conduta de dono pode ser analisada objetivamente, sem a necessidade de pesquisar-se a intenção do agente. A posse, então, é a exteriorização da propriedade, a visibilidade do domínio, o uso econômico da coisa. Ela é protegida, em resumo, porque representa a forma como o domínio se manifesta (GONÇALVES, 2011, p. 51).
Com relevante ênfase, Maria Helena Diniz (2010), esclarece que a doutrina da teoria objetiva, “ao mesmo tempo que separa a posse da propriedade, coloca a relação possessória ao serviço integral da propriedade” (p. 36). Cingi-se observar que a teoria objetiva foi a adotado pelo Código Civil de 2002. Assim se manifesta Carlos Roberto Gonçalves (2011, p. 55)
Malgrado o prestígio de Savigny e a adoção de sua teoria nos códigos de diversos países, a teoria objetiva de Ihering revela a mais adequada e satisfatória, tendo, por essa razão, sido perfilhada pelo Código Civil de 1916, no art. 485, e pelo de 2002, como se depreende da definição de possuidor constante do art. 1.196, que assim considera aquele que se comporta como proprietário, exercendo algum dos poderes que lhe são inerentes.
Portanto, a teoria objetiva de Rudolf Von Ihering, é a vigorante na legislação civil brasileira, sendo possuidor aquele que defende a propriedade como se proprietário fosse, sendo oponível contra todos.
5 OS ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DA POSSE
Segundo o Dicionário Aurélio (2004, p. 257), elemento significa “1. Aquilo que entra na composição dalguma coisa. 2. Cada parte de um todo. 3. Ambiente meio. 4. Aquilo que permite formar um raciocínio, numa hipótese, etc.; dado [...]”. Dessa maneira, se pode perceber que os elementos constitutivos da posse devem pautar a sua composição para a real conjectura da mesma.
Segundo Carlos Roberto Gonçalves (2011, p. 51),
Para Savigny, a posse caracteriza-se pela conjugação de dois elementos: o corpus, elemento objetivo que consiste na detenção física da coisa, e o animus, elemento subjetivo, que se encontra na intenção de exercer sobre a coisa um poder no interesse próprio e de defendê-la contra a intervenção de outrem.
Assim, há de se entender que os elementos invocados pelo eminente autor, são o animus e o corpus, como rechaça Maria Helena Diniz (2010, p. 43).
6 OBJETO DA POSSE
Nos dizeres de Maria Helena Diniz (2010, p. 44), a posse terá por objeto tudo àquilo que for passível de apropriação, material ou imaterial, corpóreo ou incorpóreo:
Podem ser objeto de posse todas as coisas que puderem ser objeto de propriedade, sejam elas corpóreas (salvo as que estão fora do comércio) ou incorpóreas (com exceção da propriedade literária, artística e científica, segundo alguns autores), pois na nossa legislação civil não está a posse limitada aos bens corpóreos.
No mesmo sentido é o entendimento de Carlos Roberto Gonçalves (2011, p. 67), segundo o qual “por influência do direito canônico, o conceito de posse sofreu profundo alargamento, passando a abranger os direitos de jurisdição ligados ao solo e, posteriormente, todos os direitos pessoais”. Portanto, o direito possessório tem por objeto não só aquilo que for perceptível ao olho nu, deve ser visto de forma ampla, possibilitando a defesa da posse.
7 NATUREZA JURÍDICA DA POSSE
Silvio Rodrigues (2009, p. 20), “sustenta Savigny que a posse é ao mesmo tempo um direito e um fato. Considerada em si mesma é um fato; considerada nos efeitos que gera, isto é, usucapião e interditos, ela se apresenta como direito”. O mesmo autor aponta um ponto controverso, “para Ihering a posse é um direito. Partindo de sua célebre definição de direito subjetivo, segundo a qual é o interesse juridicamente protegido, é evidente a natureza da posse” (2009, p. 21). Maria Helena Diniz (2010, p. 53), ensina que “para a maioria de nossos civilistas é um direito real devido ao seu exercício direto, sua oponibilidade erga omnes e sua incidência em objeto obrigatoriamente determinado”.
Portanto, leciona Carlos Roberto Gonçalves (2011, p. 73), “Savigny e Ihering admitem que a posse seja um direito, embora o primeiro entenda que ela é, também, um fato”. De toda forma, a posse tem relevância jurídica e por isso deve ser objeto de constante estudos como forma de aperfeiçoar o aparelho jurídico.
8 CONCLUSÃO
Como visto percebe-se que o desenvolvimento do direito possessório tem sua eclosão no direito romano, sendo que no contexto atual a posse não se confunde com a propriedade. A posse serve como um marco balizador entre o possuidor e a coisa possuída, mantendo uma relação de direito real.
Isso se deve ao fato de o código civil de 2002 ter adotado a teoria objetiva de Ihering, mesmo considerando a base explicativa de Savigny. Assim, a propriedade não se mistura com o possuidor que mantem uma relação de direito real com a propriedade e dessa forma pode defendê-la contra qualquer insurgência contra os direitos possessórios, tendo em vista que a posse recai sobre quaisquer bens, sem distinção, desde que suscetíveis de apropriação.
Quanto à natureza jurídica da posse, resta concordar com Ihering, no sentido de que a posse é um direito. Se a posse recai sobre bens suscetíveis de apropriação é porque esse bem repercute na esfera jurídica e, portanto, é um direito.
REFERÊNCIAS
BRASIL. (Planalto). Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. (Institui o Código Civil). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm>. Acesso em: 03 fev. 2015.
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito das coisas. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Miniaurélio: o minidicionário da língua portuguesa. 6. ed. Curitiba: Positivo, 2004.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito das coisas. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.
RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito das coisas. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: Jairo. Breve estudo sobre a posse e a teoria objetiva de Rudolf Von Ihering versus teoria subjetiva de Friedrich Carl Von Savigny Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 11 fev 2015, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/43266/breve-estudo-sobre-a-posse-e-a-teoria-objetiva-de-rudolf-von-ihering-versus-teoria-subjetiva-de-friedrich-carl-von-savigny. Acesso em: 11 maio 2025.
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