EMANUEL MESSIAS SOARES REIS[1]
(coautor)
ROCHELE JULIANE LIMA FIRMEZA BERNARDES[2]
(orientadora)
Resumo: A presente pesquisa abordou a possibilidade de responsabilização solidária entre influenciador digital e fornecedor, nos casos de publicidade enganosa decorrente da omissão nos produtos anunciados. O objetivo geral do estudo, foi adentrar no universo do influenciador digital através do Direito do Consumidor, abordando a possibilidade de responsabilização conjunta entre este profissional e o fornecedor do produto anunciado. Esta pesquisa foi desenvolvida através de pesquisa bibliográfica, baseada em materiais já elaborados, composto por livros, artigos científicos e jurisprudências. Os influenciadores digitais se caracterizam pelo grande poder de alcance nas redes sociais, utilizadas diariamente por bilhões de pessoas. Devido ao grande poder de persuasão no ambiente virtual seus expectadores acabam buscando tudo que é visto em seu perfil. Em razão do alto crescimento das compras virtuais nos últimos anos, especialmente com a pandemia de Covid-19, os anúncios por este profissional se fizeram cada vez mais frequentes. Ocorre que, em alguns casos esses profissionais omitem determinadas informações consideradas essenciais, ludibriando o consumidor, caracterizando a publicidade enganosa por omissão. Por esse motivo, se questiona a possibilidade de responsabilização do influenciador digital junto ao fornecedor dos produtos.
Palavras-chave: Influenciador Digital, Publicidade Enganosa, Redes Sociais, Responsabilização Solidária.
Abstract: This research addressed the possibility of joint liability between digital influencer and supplier, in cases of misleading advertising arising from the omission of advertised products. The general objective of the study was to enter the universe of the digital influencer through Consumer Law, addressing the possibility of joint liability between this professional and the supplier of the advertised product. This research was developed through bibliographic research, based on already elaborated materials, composed of books, scientific articles and jurisprudence. Digital influencers are characterized by their great power of reach on social networks, used daily by billions of people. Due to the great power of persuasion in the virtual environment, their viewers end up seeking everything that is seen on their profile. Due to the high growth of online shopping in recent years, especially with the Covid-19 pandemic, ads by this professional have become more and more frequent. However, in some cases these professionals omit certain information considered essential, misleading the consumer, characterizing misleading advertising by omission. For this reason, the possibility of liability of the digital influencer with the supplier of the products is questioned.
Keywords: Digital Influencer, Deceptive Advertising, Social Networks, Joint and Several Liability.
Sumário: Introdução 1. O Influenciador Digital e o seu Papel Enquanto Fornecedor 2. A Importância das Redes Sociais no Mercado Consumerista 2.1 Compras Virtuais e o seu Aumento 2.2 Pandemia de Covid-19 3. Publicidade Enganosa 4. Responsabilização Solidária entre Influenciador Digital e o Fornecedor pela Publicidade Enganosa. Considerações Finais. Referências.
INTRODUÇÃO
Influenciadores digitais são os indivíduos que produzem conteúdo por meio de redes sociais, engajando milhares de pessoas com os seus perfis na internet. Por ter se tornado uma profissão nos tempos modernos, esses profissionais faturam por anúncios publicitários em seus perfis, incentivando o seu público a adquirir determinado produto.
O presente estudo levantou a seguinte questão norteadora: é possível haver responsabilização solidária entre o influenciador digital e o fornecedor em decorrência de publicidade enganosa por omissão no produto anunciado? Teve como principal objetivo analisar acerca de tal possibilidade de responsabilização. A metodologia utilizada apoiou-se em pesquisa bibliográfica com abordagem dedutiva, além de materiais já elaborados, compostos por livros e artigos científicos.
A pesquisa foi instigada pela percepção dos crescentes casos de publicidade enganosa nas redes sociais. Do ponto de vista social, é de suma importância discutir tal assunto, a partir do momento em que nossa sociedade vive um grande processo de modernização, acelerado pelo uso das redes sociais que se tornaram indispensáveis para grande parte das pessoas, inclusive dentro das relações consumeristas, onde muitas vezes somente adquirem determinado produto por ser indicação de um grande influenciador digital nas redes.
Devido ao grande alcance e influência que as redes sociais geram sobre a sociedade atual, esse profissional tornou-se uma referência para o público que o acompanha, levando as pessoas a adquirirem determinados produtos apenas pelo anúncio veiculado ao seu perfil. No entanto, a expectativa gerada sobre o produto, acaba muitas vezes não sendo atendida, devido ao fato do objeto não possuir a qualidade relatada pelo influenciador ou até mesmo possuir vício não mencionado na publicação.
Essa realidade se retrata a nível mundial, na medida em que a globalização interliga as diversas comunidades em diversos países. Diariamente, milhares de anúncios são veiculados por esses perfis, alcançando bilhões de pessoas ao redor do globo. A problemática alcança níveis universais, na medida em que todos que adquirem o objeto anunciado, esperam pelos mesmos resultados que lhe foram ofertados.
No Brasil, segundo a pesquisa realizada pela [3]We are social em parceria com a hoot suíte, 66% da população utiliza as redes sociais, essa porcentagem resulta em mais de 140 milhões de usuários. Explicitando que, o grande alcance da publicidade que o profissional dessa área pode possuir. No entanto, esse tema ainda é pouco debatido, apesar de sua crescente relevância.
Nesta esteira, o estudo analisou as evidências científicas acerca da responsabilização solidária do influenciador digital com o fornecedor do produto anunciado em decorrência de vício por omissão. Visto que é importante determinar o tipo de relação entre esse profissional e o fornecedor dos produtos. Além disso, estabelecer qual a sua responsabilidade perante a omissão de vício nos produtos por ele anunciados.
Alguns pontos importantes foram abordados acerca do tema, a publicidade enganosa por omissão veiculada pelo influenciador, embasando o papel desse profissional enquanto fornecedor no meio digital, foi apontado a importância das redes sociais, com foco no mercado consumerista, em virtude do grande aumento das compras virtuais, observando especialmente o contexto da pandemia de Covid-19, e por fim, a responsabilização solidária entre o influenciador digital e o fornecedor.
1 O INFLUENCIADOR DIGITAL E O SEU PAPEL ENQUANTO FORNCEDOR
O termo Influenciador Digital deriva do inglês digital influencer, são grandes formadores de opinião, possuindo a capacidade de modificarem o comportamento e a mentalidade daqueles que os seguem, em razão da maneira que expõem seus gostos, seu dia a dia, suas preferências, nas quais, acabam conquistando a confiança daqueles que os acompanham, os chamados seguidores.
Na maioria dos casos, são pessoas a princípio consideradas “comuns”, no sentido de não serem nacionalmente ou internacionalmente conhecidas. Mas ao longo do tempo foram adquirindo seguidores que gostaram das suas publicações, variando em diversos seguimentos, seja no mundo da moda, da saúde, do entretenimento e outras diversas áreas. No entanto, pessoas com carreiras já consolidadas, as chamadas celebridades ou famosos, também possuem esse chamado poder de influenciar seus telespectadores virtuais.
Com a Geração Y, conhecida como a geração que presenciou o surgimento e o crescimento das novas tecnologias, com foco na atividade de consumo e nas compras via internet, esses indivíduos possuem um papel em evidência. Por conta da correria do cotidiano e até mesmo da comodidade e do conforto de fazer compras em sua casa, as pessoas buscam a alternativa de adquirirem novos produtos via web. Com isso, buscam como referência a indicação daquelas pessoas que costumam acompanhar diariamente nas suas redes sociais, no caso, os influenciadores digitais.
Segundo Karhawi (2016), os influenciadores digitais que estão nas mais diversas redes sociais, ocupam espaços de “pessoas comuns”, dessa maneira, há um diálogo com seus seguidores em nível de igualdade, por esse motivo, esses influenciadores acabam tendo uma vantagem em relação às demais revistas e sites tradicionais, pois estas não possuem uma relação de proximidade com seus assinantes ou internautas.
Pelo fato de as redes sociais serem um grande mecanismo de publicidade por meio da atuação dos influenciadores digitais, muitas marcas acabam optando por elegerem o influencer como símbolo, pois atingem seu público-alvo com maior intensidade, consequentemente, aumentando suas vendas.
Algumas pesquisas comprovam esse alto poder de persuasão dos influenciadores, como a pesquisa feita pelo [4]Instituto QualiBest, em março de 2018. Dos entrevistados, 55% afirmaram que costumam pesquisar a opinião dos influenciadores antes de fazer alguma compra e 86% descobriram algum produto por meio de um digital influencer.
Analisando o campo econômico e empresarial, “influenciadores digitais são formadores de opinião virtuais que representam uma alternativa para as empresas que confiam na comunidade reunida em torno desses perfis como público-alvo de divulgação”. (ALMEIDA, 2018, p.16).
Desse modo, é possível observar a maneira como os influenciadores conseguem fazer com o que o produto ou serviço que anunciam em suas redes sociais sejam grandes objetos de busca, fazendo com que seus seguidores queiram também adquirir o que foi anunciado. Isso fez com que grandes marcas e até mesmo empresas iniciantes busquem cada vez mais esses profissionais para divulgarem seus produtos.
Em relação ao papel do influenciador digital enquanto fornecedor, cabe conceituar quem é o fornecedor de forma geral, elencado no artigo 3º, caput, do Código de Defesa do Consumidor:
Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
Em resumo, o fornecedor é aquele que na relação de consumo, dedica-se à atividade de prover o mercado, sendo o responsável pelo fornecimento de um produto ou a prestação de um serviço para o consumidor.
Diante do grande impacto persuasivo que os influenciadores conseguem atingir aos mais diversos padrões comportamentais dos seus seguidores, que podem também ser denominados de consumidores, em virtude das inúmeras compras realizadas através das indicações nas plataformas digitais, sob a ótica do Código de Defesa do Consumidor, há a possibilidade dos influenciadores digitais equiparados a figura do fornecedor.
Para que seja feita a parceria entre a marca ou empresa e o influencer, pode ser feito mediante pagamento, em que estipulam uma determinada quantia para que sejam feitas postagens em suas redes sociais, com destaque para o Instagram, ou por meio de trocas, por exemplo, é feita a divulgação e em troca recebem o produto que foi anunciado.
De maneira geral, as publicações são feitas de maneira natural, ou seja, não fica explícito que aquilo que estão anunciando é uma publicidade. No entanto, como anteriormente mencionado, há um retorno para quem está fazendo o anúncio, desse modo, entra a figura do Código de Defesa do Consumidor, pois ambas as partes, fornecedor e influenciador, estão sendo beneficiados.
É inegável o papel de garantidor que o influenciador possui na relação consumerista na qual está inserido. Há a figura da confiança, no momento em que pessoas passam a efetuar compras por meio de anúncio em suas páginas de perfil pessoal. Uma vez que, passam informações que não condizem com a realidade real do produto ou serviço também é violada a boa-fé. Cabe mencionar Gonçalves (2012), onde relata que aquele que lucrar com uma determinada situação, este deve responder pelo risco ou desvantagens que dela resultem.
Insta mencionar o julgado do Superior Tribunal de Justiça:
RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - DANOS MATERIAL E MORAL - RELAÇÃO DE CONSUMO - DEFEITO DO PRODUTO - FORNECEDOR APARENTE - MARCA DE RENOME GLOBAL – LEGITIMIDADE PASSIVA – RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. INSURGÊNCIA RECURSAL DA EMPRESA RÉ.
Hipótese: A presente controvérsia cinge-se a definir o alcance da interpretação do art. 3º do Código de Defesa do Consumidor, a fim de aferir se na exegese de referido dispositivo contempla-se a figura do fornecedor aparente - e, consequentemente, sua responsabilidade, entendido como aquele que, sem ser o fabricante direto do bem defeituoso, compartilha a mesma marca de renome mundial para comercialização de seus produtos.
1. A adoção da teoria da aparência pela legislação consumerista conduz à conclusão de que o conceito legal do art. 3º do Código de Defesa do Consumidor abrange também a figura do fornecedor aparente, compreendendo aquele que, embora não tendo participado diretamente do processo de fabricação, apresenta-se como tal por ostentar nome, marca ou outro sinal de identificação em comum com o bem que foi fabricado por um terceiro, assumindo a posição de real fabricante do produto perante o mercado consumidor [...]. (STJ - Resp. 1.580.432/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Marco Buzzi – j. 06.12.2018 – DJe 04.02.2019).
Nesse sentido, o entendimento é que há responsabilidade para aquele que mesmo sem participação de forma direta no processo de fabricação, identifique-se em comum com o produto fabricado, conhecido como fornecedor aparente.
Segundo Tartuce e Neves (2020), o conceito de fornecedor equiparado equivale a possibilidade solidária quando há uma publicidade ou oferta que causou algum dano aos consumidores, respondendo solidariamente o meio de comunicação, a empresa patrocinadora e todos os que foram responsáveis pelo conteúdo, como a agência de publicidade e seus profissionais.
2 A IMPORTÂNCIA DAS REDES SOCIAIS NO MERCADO CONSUMERISTA
Com o avanço da tecnologia e as mais novas formas de interações no ambiente virtual, as redes sociais assumem um importantíssimo papel, seja para facilitar a comunicação entre os indivíduos, para a busca de informações e até mesmo para o entretenimento. Falando em ambiente de consumo, esse meio virtual está em alta, principalmente por conta da presença dos influenciadores digitais.
Inúmeros são os acessos diários nas redes sociais, em especial o Instagram. Ao ser feito a publicidade de determinado produto, a própria ferramenta já facilita o direcionamento do usuário para que a compra seja efetuada, de maneira rápida e fácil, o que acaba elevando o número de compras. Por meio da rede social, o consumidor recebe a informação quando observa as publicações dos influencers que estão presentes em sua lista, no qual são escolhidos de acordo com sua preferência e de maneira tendenciosa é disponibilizado como seguir para a efetivação da compra, o que acontece com um simples click.
2.1 Compras Virtuais e o seu Aumento
Segundo Vaz (2011), com o advento da internet ocorreram diversas transformações que influenciaram os indivíduos a mudarem seu comportamento, se percebe que cada vez mais os meios virtuais fazem parte do cotidiano da população, refletindo diretamente no modo de consumo da sociedade, que usufrui da comodidade trazida pela tecnologia.
Nota-se que esse novo modo de comprar tem sido bem acolhido pela grande massa. Ao longo dos últimos anos, se percebe um largo crescimento nas compras virtuais, demonstrando assim que esse tipo de comércio já conquistou seu espaço no mercado consumerista.
Conforme a internet e as redes sociais se popularizaram, os perfis de consumo também mudaram. Segundo pesquisa realizada no ano de 2019 pelo [5]NZN Intelligence, cerca de 74% dos consumidores brasileiros tem preferido realizar suas compras virtualmente ao invés realizá-las em estabelecimentos físicos. E cerca de 82% dos consumidores que possuem internet em casa já realizaram alguma compra online.
2.2 Pandemia de Covid-19
Em 11 de março de 2020, a Organização Mundial de Saúde decretou que o mundo passava por uma pandemia de corona vírus, agente causador da doença COVID-19. De acordo com os pesquisadores da organização a doença é altamente contagiosa.
Poucos dias depois, no dia 22 de abril de 2020, o Conselho Nacional de Saúde recomendou que o Brasil adotasse o isolamento social, como forma de conter o avanço do vírus no país. Com a adoção das medidas, foi determinado que as lojas físicas que não vendiam produtos essenciais fossem fechadas.
Em razão disso, houve a necessidade do consumidor brasileiro se adaptar às compras por meio virtual. De acordo com um levantamento da [6]Ebit/Nielsen, que foi feita em parceria com a Elo, o faturamento com as vendas online subiu 47% no primeiro semestre. Ao todo, foram feitos 90,8 milhões de pedidos entre janeiro e junho de 2020 o que totalizou 38,8 bilhões de reais. Representando números superior ao esperado pelos especialistas.
Diante desses dados, se percebe que a mudança de comportamento dos consumidores tem feito cada vez mais as empresas se interessarem pelo ambiente virtual, veiculando publicidade a esta, um meio onde o influenciador digital encontra-se inserido.
3 PUBLICIDADE ENGANOSA
Em primeiro lugar, se faz necessário fazer uma breve distinção entre publicidade e propaganda, diante disso, Tartuce (2018) afirma que, a publicidade deve ter um objetivo sempre voltado para o comercial, além disso é paga e deve identificar o seu patrocinador, já a propaganda nem sempre é paga e identifica seu patrocinador, possui ainda uma maior amplitude, pois pode estar atrelada a fins religiosos, ideológicos, políticos, sociais, econômicos ou filosóficos.
Nesta esteira, é necessário conceituar o que é publicidade mais a fundo, segundo Nunes (2019) a publicidade se caracteriza como um instrumento por meio do qual o publicitário ou fornecedor aproxima o produto ou serviço do consumidor, sendo limitado pelos princípios constitucionais em relação a sua utilização. Se percebe que a publicidade é permitida no Brasil, desde que respeite certos limites impostos pela Magna Carta.
No entanto, nem todos os tipos de publicidade são permitidos, existem anúncios que visam ludibriar o consumidor ao apresentarem em seu conteúdo, produtos ou serviços que não correspondem com a realidade.
O Código de Defesa do Consumidor, proíbe em seu artigo 37 a chamada “publicidade enganosa”, além disso no parágrafo primeiro do mesmo artigo, o legislador buscou apresentar as características da mesma, sendo ela uma publicidade onde existem informações ou comunicações, inteira ou parcialmente falsas, mesmo que por omissão.
Aduz Filomeno (2018) dispõe que, a mensagem publicitária deve carregar consigo os verdadeiros atributos que os produtos ou serviços possuem, e ainda não omitir determinados atributos necessários para percepção do consumidor sobre o que está sendo anunciado.
Dando continuidade à linha de raciocínio, se percebe que existem dois tipos de publicidade enganosa, por omissão e por comissão. Segundo Almeida (2019) na publicidade enganosa por comissão, afirma-se algo que não existe, que não faz parte do que está sendo anunciado, para dessa forma influenciar erroneamente a opinião do consumidor sobre determinado produto ou serviço.
O Código de Defesa do Consumidor em seu artigo 37, parágrafo terceiro caracteriza o que é a chamada publicidade enganosa por omissão, como já mencionado, é aquela que deixa de apresentar dado essencial sobre o produto, o que pode vir induzir o consumidor a erro.
O grande questionamento fica na questão do que seriam esses dados essenciais. Segundo Nunes (2019), a informação essencial é aquela que quando ausente, influencia na compra do consumidor, além disso sem aquela informação o uso do produto ou serviço fica comprometido, pois o consumidor não sabe verdadeiramente suas especificações, nem tampouco como utiliza-lo adequadamente.
Desse modo se percebe que se o anunciante deixar de mencionar um item essencial do produto, como um volante em um carro, não se caracterizará a publicidade enganosa, a partir do momento em que é de conhecimento geral que todos os carros possuem volantes.
4 RESPONSABILIZAÇÃO SOLIDÁRIA ENTRE INFLUENCIADOR DIGITAL E O FORNECEDOR PELA PUBLICIDADE ENGANOSA
Esclarecido o conceito de publicidade enganosa, se faz necessário abordar as consequências para quem veicula esse tipo de publicidade, bem como para quem dela se beneficia. Aduz o Código de Defesa do Consumidor em seu artigo 30:
Art. 30. Toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado.
Realizando a leitura do artigo, se percebe que a publicidade ou oferta de produto realizada vincula o fornecedor que a fizer de modo que deve até integrar o contrato a ser celebrado.
Em seguida, o artigo 35 do mesmo diploma determina as penalidades para o fornecedor que se recusar a cumprir tal oferta, podendo o consumidor escolher livremente entre exigir o cumprimento da oferta apresentada na publicidade, aceitar outro objeto ou contribuição equivalente, ou rescindir o contrato com direito a ser indenizado por perdas e danos e ser ressarcido por eventuais pagamentos antecipados.
Filomeno (2019) destaca que o que o fornecedor prometeu em anúncio publicitário deverá ser cumprido, de modo que os consumidores devem exigir exatamente o que se foi prometido no anúncio publicitário.
Segundo Tartuce (2018) o entendimento é o de que o Código de Defesa do Consumidor determina que a responsabilidade sobre tais atos de publicidade enganosa é em regra objetiva e solidária, envolvendo o anunciante e o fornecedor, se estes não forem a mesma pessoa.
Vale ressaltar que, a responsabilidade objetiva é aquela que independe da culpa do causador do dano, ou seja, não é necessário que seja avaliada a intenção daquele que causou o dano, bastando tão somente que fique configurado o nexo causal.
O fornecedor-anunciante sempre será responsável pelos danos causados pelo seu anúncio e a agência que produziu o anúncio será responsabilizada, em regra, juntamente com o fornecedor, de forma solidária, Nunes (2019). Dessa forma, se percebe que a relação entre fornecedor e anunciante vai além da simples veiculação de publicidade sobre determinado serviço ou produto, ela une ambos os lados, de forma que se a publicidade for enganosa ambos responderão as sanções cabíveis.
Ainda existem dúvidas caso haja a responsabilização, como esta será caracterizada, se de maneira objetiva ou subjetiva. Tartuce e Neves (2017) aduzem que a discussão sobre a responsabilidade civil de pessoas com notoriedade, como os influenciadores digitais é ampla, visto que o princípio da boa-fé objetiva deve imperar sobre as relações de consumo, e a partir do momento que o profissional veicula sua imagem a determinado produto ou serviço, diversos consumidores irão os adquirir somente pela confiança depositada nesse indivíduo.
Nesse sentido, apesar das raras decisões acerca do assunto, o Juizado Especial Cível de Barra Mansa, em recente decisão, no processo de n°0019543-02.2019.8.19.0007, reconheceu a responsabilidade objetiva de uma influenciadora digital que anunciou a venda de um celular, no entanto, tratava-se de um golpe.
Segue um trecho da referida decisão:
Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. Assim, ao perscrutar os autos verifico que a atividade normalmente desenvolvida pela requerida (Virgínia) implicar em expor produtos de terceiros a venda, sob sua chancela e indiscutível influência, posto que sem ela, não teríamos a contratação do produto, pois por ser seguidora desta é que a ré comprou o direcionado produto.[7]
A aludida decisão confirma o nível de influência que tal indivíduo exerce sobre o seu público. É importante ressaltar que na decisão foi destacado que a autora somente adquiriu o produto por ter sido indiscutivelmente influenciada pela profissional.
Além disso, percebe-se na decisão que o fornecedor utilizou o nome da influenciadora para adquirir a confiança do público, tendo em vista a credibilidade que este tipo de profissional possui na grande maioria das vezes por parte dos seus seguidores. Por isso, ao vincular sua imagem com determinado fornecedor, o influenciador deve se atentar à credibilidade que a marca possui, evitando transtornos futuros.
No caso anteriormente mencionado, ficou claro que a influenciadora digital foi responsabilizada pelo golpe que sua seguidora sofreu. Fazendo uma extensão ao tema abordado, nos casos de vício por omissão, se vislumbra a possível responsabilização do influenciador nos mesmos moldes da decisão referida, pois mesmo que o seguidor receba o produto, se este não for o mesmo que se foi ofertado, ou apresentar algum vício oculto, se abre possibilidade para reparação do dano, de forma solidária entre influenciador e fornecedor.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do exposto, é notório que o tema possui extrema importância, na medida em que se encontra cada vez mais presente na sociedade atual. Percebe-se que apesar de ser uma nova profissão, a carreira de influenciador digital se tornou altamente rentável e a busca por esse profissional tende a aumentar consideravelmente.
Por apresentar grande influência no meio digital, esses profissionais estão sendo cada vez mais procurados por pequenas e grandes marcas, com o intuito de alavancarem suas vendas. Na sociedade atual, as compras virtuais são frequentes por inúmeros motivos, como a comodidade de comprar no conforto da sua casa, sem que seja necessário a ida a uma loja física. Neste cenário, o influencer acaba sendo a figura perfeita para atrair novos clientes.
No ano de 2020, com a pandemia de Covid-19, foi necessário o isolamento social com o objetivo de diminuir a propagação do vírus. Em razão disso, as lojas físicas foram fechadas, mas as compras não pararam, ocasionando um grande aumento no comércio virtual.
Juntamente com o aumento das compras virtuais, também cresceu a publicidade enganosa nesse meio. Vale relembrar que a publicidade enganosa é aquela onde existem informações ou comunicações, inteira ou parcialmente falsas, mesmo que por omissão.
Em relação a problemática central deste estudo, notou-se que é possível a responsabilização solidária entre o influenciador digital e o fornecedor do produto ou serviço anunciado, em decorrência de vício oculto. Apesar de ainda não existir legislação específica acerca do tema, através da adaptação da doutrina vigente, além de jurisprudências, percebeu-se que o influenciador ao anunciar um produto ou serviço que gere prejuízo ao consumidor em decorrência de vício, será obrigado a repara o dano juntamente com o fornecedor do produto.
Em razão disso, faz-se necessário um maior aprofundamento sobre as questões jurídicas relativas ao anúncio de produtos por esses profissionais. Para isso, a criação de uma legislação específica sobre o tema traria uma maior segurança diante de eventuais conflitos, como também a adaptação das normas já vigentes à modernização das relações de consumo.
Por fim, diante de todo o exposto e adaptando o tema à legislação vigente, conclui-se ser possível a responsabilização solidária entre o influenciador digital e o fornecedor, em decorrência de publicidade enganosa por omissão nos produtos anunciados.
REFERÊNCIAS
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[4] Quem são os maiores influenciadores digitais do Brasil?. Disponível em: https://www.institutoqualibest.com/comportamento/os-maiores-influenciadores-digitais/. Acesso em: 20 out. 2020
[5] COMPRA ONLINE É PREFERÊNCIA DE 74% DOS BRASILEIROS. E-commercebrasil, 2019. Disponível em: https://www.ecommercebrasil.com.br/noticias/compra-online-preferencia-de-consumidores-brasileiros/. Acesso em: 22 out. 2020.
[6] COM ALTA DE 47%, E-COMMERCE ALCANÇA MELHOR RESULTADO DOS ÚLTIMOS 20 ANOS. Consumidor Moderno, 2020. Disponível em: https://www.consumidormoderno.com.br/2020/08/28/e-commerce-cresce-47-no-1o-semestre-maior-alta-em-20-anos/#:~:text=Segundo%20pesquisa%20da%20Ebit%2FNielsen,janeiro%20e%20junho%20de%202020. Acesso em: 25 out. 2020.
[7] RODAS, Sérgio. Influenciadora digital responde por golpe dado por loja que indicou. Direito News, 2020. Disponível em: https://www.direitonews.com.br/2020/08/influenciadora-digital-responde-golpe-loja-indicou.html. Acesso em: 20 out. 2020.
Bacharelanda do curso de Direito pelo Centro Universitário Santo Agostinho-UNIFSA
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MIRANDA, GABRIELE BEZERRA. Responsabilização solidária entre o influenciador digital e o fornecedor em decorrência de publicidade enganosa por omissão nos produtos anunciados Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 maio 2021, 04:51. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56544/responsabilizao-solidria-entre-o-influenciador-digital-e-o-fornecedor-em-decorrncia-de-publicidade-enganosa-por-omisso-nos-produtos-anunciados. Acesso em: 26 maio 2024.
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