VINICIUS PINHEIRO MARQUES
(Orientador)
RESUMO: O estudo possui o objetivo de analisar a atuação da Defensoria do Estado do Tocantins na utilização dos métodos de tratamento adequados de conflitos e de acesso à justiça. Nascida no bojo da Constituição de 1988, a Defensoria Pública carrega a missão de prestar orientação jurídica e promover os direitos humanos e a defesa de todos os necessitados. Através da Lei Complementar nº 80/94, o papel de promover a conciliação entre as partes nos conflitos foi estabelecido ao órgão e com a Lei Complementar nº 132/2009, a solução extrajudicial foi definida como prioritária. Cabe tratar que a Defensoria Pública do Estado do Tocantins tem buscado viabilizar métodos autocompositivos que fujam do tradicionalismo litigioso e proporcionem soluções conforme a necessidade das partes. Nesse sentido, destaca-se o Núcleo Especializado de Mediação e Conciliação (NUMECON), criado pela Defensoria, através da Resolução - CSDP n.º 127/2015, que visa promover prioritariamente a solução extrajudicial dos conflitos. O NUMECON funciona como estrutura permanente disponível a todos que buscam soluções pacíficas e eficientes, sendo elaborado para proporcionar alternativas que desafoguem o judiciário de sua alta demanda (DPE-TO, 2019, s/p). Com esta descentralização dos conflitos, existe a possibilidade de uma maior garantia à acessibilidade da justiça.
Palavras-Chave: Defensoria Pública. Acesso à justiça. Métodos de tratamento adequados de conflitos.
ABSTRACT: This study aims to analyze the role of the Tocantins State Defender's Office in the use of proper methods of handling conflicts and access to justice. Born in the wake of the 1988 Constitution, the Public Defender's Office carries the mission of providing legal guidance and promoting human rights and the defense of all those in need. Through Complementary Law No. 80/94, the role of promoting conciliation between the parties in conflicts was established by the body and further on, with Complementary Law No. 132/2009, the extrajudicial solution of disputes was defined as a priority. It is worth noting that the Public Defender of the State of Tocantins has sought to enable self-composition methods that escape the litigious traditionalism and provide solutions according to the needs of the parties that are part of the conflict. In this regard, the Specialized Center for Mediation and Conciliation (NUMECON), created by the Defender's Office, through Resolution - CSDP No. 127/2015, stands out, which aims to promote, as a matter of priority, the extrajudicial solution of conflicts. NUMECON works as a permanent structure available to all who seek peaceful and efficient solutions, being designed to provide alternatives that relieve the judiciary of its high demand (DPE-TO, 2019, s/p). With this decentralization of conflicts, there is the possibility of a greater guarantee to the accessibility of justice.
Keywords: Public Defender's Office. Access to justice. Proper methods of handling conflicts.
Este artigo busca explorar a atividade da Defensoria Pública e a importância do seu papel na utilização de mecanismos adequados de solução de conflitos, com enfoque na Defensoria Pública do Estado do Tocantins.
Metodologicamente, o estudo é pautado na abordagem de pesquisa qualitativa, por realizar um levantamento de dados já disponíveis, através de relatórios anuais disponibilizados eletronicamente pela Defensoria Pública do Estado do Tocantins, para analisar a atuação da Defensoria no que concerne à utilização de técnicas adequadas de resolução de conflitos.
Ao analisar a situação jurídica brasileira, bem como o desenvolvimento da atividade judicial em relação à resolução extrajudicial dos conflitos, percebe-se a importância do estudo da atividade da Defensoria Pública nesses casos. Nesse sentido, a presente pesquisa é norteada pela pergunta problema: como tem sido a atuação da Defensoria Pública do Estado do Tocantins na utilização de métodos alternativos de resolução de conflitos?
A justificativa do estudo reside na importância da Defensoria Pública em um regime democrático. Isso porque o papel de influência que a Defensoria pública tem para transformar o quadro social acaba sendo muitas vezes escondido e desconhecido frente aos sujeitos do direito e a sociedade que carece de uma transformação do contexto judicial atual. São projetos como este que podem promover a devida exploração do tema, a fim de evitar que a desinformação impeça a Defensoria Pública de assumir sua missão constitucional de transformação jurídica.
É possível observar uma crescente incidência de casos e conflitos que demandam uma nova percepção resolutiva. As influências sociais, políticas e culturais da contemporaneidade atingem diretamente a instituição e distribuição da justiça, traçando novos caminhos de administração das demandas jurídicas, a fim resgatar um sentimento pacífico e de conciliação entre as partes.
Ao passo que os métodos de tratamento adequados de conflitos ganham forma no direito brasileiro, que ainda está arraigado na cultura litigiosa, é necessário incentivo por parte do Estado em utilizar práticas de resolução de conflitos. Neste âmbito, a Defensoria Pública, órgão principal de garantia do acesso à justiça no Brasil, surge como crucial na utilização de meios alternativos de resolução dos conflitos.
As práticas adequadas de resolução de conflitos consistem em todos os mecanismos proporcionados para a pacificação social, diversos dos meios litigiosos usualmente utilizados na justiça brasileira. Com isso, tais meios são essenciais para o acesso à justiça de modo que o cidadão terá, ao seu dispor, mais métodos para a solução da lide.
Este artigo busca analisar o papel da Defensoria do Estado do Tocantins na utilização de meios adequados de tratamento de conflitos e de acesso à justiça. A presente pesquisa parte de argumentos gerais para argumentos particulares, em que se estrutura no método dedutivo.
Assim, a pesquisa parte de premissas maiores, como o estudo dos meios alternativos de resolução de conflitos e a compressão do papel da Defensoria Pública enquanto instituição garantidora do direito de acesso à justiça para então analisar a atuação da Defensoria Pública do Estado do Tocantins no uso de práticas adequadas de solução de conflitos.
Os problemas sociais repercutem no acesso à justiça, pode-se dizer
que o mais evidente deles que é a desigualdade sócio-econômica-cultural, grande parte da
população não tem conhecimento de seus direitos, o que vem consequentemente, dificultar a busca pela justiça, este enigma social demonstra cada vez mais, a necessidade de se aparelhar mais a Defensoria Pública para a regular a prestação da assistência judiciária gratuita.
O primeiro capítulo versa sobre o direito fundamental de acesso à justiça e a cultura litigiosa brasileira. As técnicas adequadas de tratamento de conflitos possibilitam uma melhor efetivação da justiça enquanto alternativa à crise no sistema judiciário.
O segundo capítulo trata sobre a Defensoria Pública e sua importância como função garantidora do direito de acesso à justiça.
No terceiro capítulo analisa-se a atuação da Defensoria Pública do Estado do Tocantins na prática adequada da resolução de conflitos através dos núcleos especializados de mediação e conciliação (NUMECONs).
2.1acesso á justiça E A CRISE NO SISTEMA JUDICIÁRIO
A jurisdição surgiu com o escopo de se evitar a justiça com as próprias mãos (autotutela), sendo um instrumento de controle social. É o que acontecia nos primórdios da sociedade e das civilizações, em que o homem, cru no conhecimento das regras elementares de convivência, buscava satisfazer a justiça por intermédio do olho por olho ou da vingança contra os membros da família do agente lesionador, por exemplo.
A respeito do exposto, a jurisdição é definida como “poder, função e atividade de aplicar o direito a um fato concreto, pelos órgãos públicos destinados a tal, obtendo-se a justa composição da lide” (GRECO FILHO, 2011, p. 131). A jurisdição, explica o citado doutrinador, é um poder, porque atua como revelação da potestade estatal em face das partes em contenda. De igual modo é, ainda, uma função, porque cumpre o desígnio de fazer valer a ordem jurídica posta em suspeita em detrimento de uma pretensão resistida. (COUTURE, 2017).
Em linhas gerais, no que concerne às funções atípicas (tais como administrar os próprios recursos e legislativas), pode-se dizer que os tribunais brasileiros possuem a competência de gerir suas próprias questões administrativas e financeiras, e elaborar o seu respectivo regimento interno, sem interveniência de quaisquer outros Órgãos. Do mesmo modo que o Poder Judiciário possui funções atípicas, conforme explanado anteriormente, a jurisdição também poderá ser função atípica de outro Poder. A esse respeito, Ferreira Filho (2017, p 254) elucida que:
Note-se que a função jurisdicional pode ser atribuída, como é na Constituição brasileira, a outro Poder que não o Judiciário, eventualmente. (Ele se dá com a função legislativa que não é toda entregue ao Legislativo como com a função executiva que não fica inteira em mãos do Executivo.) Assim, o Legislativo também a exerce: ele julga no impeachment, e o Executivo pode criar tribunais administrativos que aplicam a lei a particulares, inclusive por meio de um procedimento contencioso: são os contenciosos administrativos (embora em nosso direito não possam jamais decidir em última instância, ficando sempre sujeitos ao crivo do Judiciário). A função jurisdicional, porém, é típica do Judiciário, de modo que, na sua forma típica, pode ser chamada de função judiciária.
Desse modo, existe a possibilidade de obter-se o reparo de um direito lesado ou que estejam sob ameaça é por intermédio da ação diante do Poder Judiciário que, pela mera e suficiente razão do dever de imparcialidade de seus órgãos jurisdicionais, não pode agir de ofício, salvo em raríssimas exceções.
A esse respeito, Marques (2010, p. 34) preleciona que:
A própria Constituição, ao declarar os direitos individuais e suas garantias, prescreve normas que incidem diretamente sobre a proteção processual dos direitos e interesses do cidadão em face do Poder Público e de outros cidadãos. A Ação, como direito ao processo ou como direito de pedira tutela jurisdicional do Estado, está entre os Direitos e Garantias Individuais que a Constituição solenemente enumera, ali também encontrando-se a previsão de remédios processuais rápidos e seguros para a pronta restauração de direitos subjetivos atingidos por atos arbitrários do Poder Público.
Nessa toada, é na Constituição Federal que proporciona e efetiva as garantias fundamentais dos sujeitos de direito e, especialmente, impondo por meio do seu artigo 5º, XXXV, que não será afastado da análise do Poder Judiciário, lesão ou ameaça a direito, por meio de provocação do interessado, em virtude do princípio da inércia.
Para ilustrar, Cappelletti (2002, p. 5) afirma:
De fato, o direito ao acesso efetivo tem sido progressivamente reconhecido como sendo de importância capital entre os novos direitos individuais sociais, uma vez que a titularidade de direitos é destituída de sentido, na ausência de mecanismos para a sua efetiva reinvindicação. O acesso à justiça pode, portanto, ser encarado como o requisito fundamental _ o mais básico dos Direitos Humanos do sistema jurídico moderno e igualitário que pretenda garantir, e não apenas proclamar o direito de todos [...] o acesso não é apenas um direito social fundamental, crescentemente reconhecido; ele é, também, necessariamente, o ponto central da moderna processualística. Seu estado pressupõe um alargamento e aprofundamento dos objetivos e métodos da moderna ciência jurídica.
O direito ao acesso à justiça não está previsto somente na Constituição brasileira, sendo também previsto em diplomas internacionais de direitos humanos, conforme disposto no artigo 25 da Convenção Americana de Direitos Humanos, conhecida como Pacto de San José da Costa Rica, na qual o Brasil é signatário:
1. Toda pessoa tem direito a um recurso simples e rápido ou a qualquer outro recurso efetivo, perante os juízes ou tribunais competentes, que a proteja contra atos que violem seus direitos fundamentais reconhecidos pela constituição, pela lei ou pela presente Convenção, mesmo quando tal violação seja cometida por pessoas que estejam atuando no exercício de suas funções oficiais.
2. Os Estados Partes comprometem-se:
a. a assegurar que a autoridade competente prevista pelo sistema legal do Estado decida sobre os direitos de toda pessoa que interpuser tal recurso;
b. a desenvolver as possibilidades de recurso judicial; e
c. a assegurar o cumprimento, pelas autoridades competentes, de toda decisão em que se tenha considerado procedente o recurso.
A interface do direito ao acesso à justiça não está limitada somente à propositura do pedido ao Poder Judiciário, sendo imprescindível que a resposta seja eficiente e célere, algo que não sobrevém em decorrência da morosidade e acúmulo da justiça brasileira, se tornando primordial que sejam criadas novas técnicas capazes de suprir a demanda de maneira quantitativa e, principalmente, qualitativa.
O acesso igualitário também deverá ser buscado e perseguido pelo Direito. A Defensoria Pública consiste em um excelente exemplo de proteção ao princípio de acesso à justiça, haja vista que exerce a defesa de pessoas hipossuficientes de recursos financeiros, galgando as mesmas na condição de partes de um processo, assegurando, desse modo, a defesa de seus direitos (FERREIRA FILHO, 2017).
Inclusive, Mauro Cappelletti e Bryant Garth dividiram em três ondas renovatórias do acesso à justiça, sendo a primeira onda intimamente ligada à assistência judiciária aos necessitados, ou seja, conectada ao aspecto econômico, logo a Defensoria Pública está fortemente marcada nessa onda renovatória.
De igual modo, a lei deverá facilitar o acesso à justiça ao efetivar a quebra de formalismos inúteis que prejudicam a resolução do litígio e a devida presteza processual. O acesso à justiça, no entanto, deverá trazer consigo outros princípios, como, por exemplo, a celeridade processual (MIRANDA, 2017).
O Brasil traz enraizado em sua cultura litigiosa uma dependência do Poder Judiciário, no sentido de estabelecer sobre e apenas nele a necessidade de resolução dos conflitos. Os tribunais, em meio ao aumento de casos ajuizados, perde a sua efetividade, já que a estrutura existente é incapaz de garantir o tratamento judicial necessário. Nas palavras de Splenger (2014, p.34)
Atualmente, a realidade brasileira demonstra que unidos pelo conflito, os litigantes esperam por um terceiro que o “solucione”. Esperam pelo Judiciário para que diga quem tem mais direitos, mais razão ou quem é o vencedor da contenda. Trata-se de uma transferência de prerrogativas que, ao criar “muros normativos”, engessa a solução da lide em prol da segurança, ignorando que a reinvenção cotidiana e a abertura de novos caminhos são inerentes a um tratamento democrático.
Em um contexto de intensas transformações sociais e políticas, não cabe mais ao judiciário brasileiro manter uma estrutura fortemente hierarquizada e fechada. Percebe-se que, segundo Spengler (2014, p.17), este instituto “tem seu alcance diminuído na mesma proporção que as barreiras geográficas vão sendo superadas pela expansão da informática, das comunicações, dos transportes e os atores econômicos vão estabelecendo múltiplas redes de interação.”
Pode-se dizer que os processos e litígios se arrastam lentamente, em decorrência de vários fatores, tais como o excesso de recursos, a grande quantidade de processos existentes para poucos magistrados, o excesso de procedimentos, decorrentes do devido processo legal, e a malícia de alguns litigantes que buscam protelar, com as várias ferramentas existentes no âmbito jurídico, as respostas jurisdicionais, buscando a perda do objetivo, a prescrição, Almeida (2013, p.23) complementa:
É preciso admitir, portanto, que é impossível à máquina judiciária estatal resolver todos os dissídios que lhe forem submetidos através de sentenças, é que, se for preciso esgotar sempre todas as etapas e fases processuais necessárias para se chegar à efetiva satisfação dos direitos em definitivo reconhecidos como existentes, nunca haverá recursos públicos suficientes para montar e custear um aparato jurisdicional capaz de atender, em tempo razoável, a todos esses litígios.
Nesse sentido, a necessidade de um sistema igualmente acessível a todos possibilitou o desenvolvimento das alternativas mais simples e menos formais, ou seja, os caminhos extrajudiciais. Estes novos meios provocaram uma quebra no monopólio estatal para a resolução de conflitos, a fim de proporcionar o atendimento ao direito fundamental de acesso à justiça.
As soluções adequadas dos conflitos tomam seu embasamento no Tribunal Multiportas, ideal que surgiu nos Estados Unidos, em 1976, através do professor de Harvard, Sander. Em meio a uma insatisfação da população norte-americana com a administração da justiça, surge um posicionamento que “encontra” outros caminhos de resolução dos conflitos além do judiciário. (SANDER, 2012, p.32)
Com o desenvolvimento de várias portas em busca da efetivação da justiça, percebe-se que o judiciário até deixa de ser o meio mais eficiente e hábil para as soluções litigiosas. A justiça multiportas não veio para diminuir e enfraquecer a posição do poder judiciário, mas possibilitar alternativas tão satisfatórias quanto a via tradicional, a fim de garantir o acesso á justiça. Enia Cecilia Briquet (2016, p. 134) complementa:
(...) tribunal tradicional oferece ao público apenas uma ‘porta’ para resolver disputas: ‘o processo litigioso’. Com o conceito de multiportas se aperceberam que o litígio não é a melhor alternativa para resolver muitas das disputas. Além da adjudicação deveria ser oferecida às partes uma variedade de opções alternativas para a resolução dos conflitos; além disso, as partes deveriam poder contar com assistência para fazer avaliação dos casos no intuito de determinar qual processo de resolução de disputas seria o mais Mediação não é conciliação: a importância da técnica no desenvolvimento dos processos autocompositivos Página 3 apropriado.
Em meio a essas transformações judiciais, as práticas adequadas de solução de conflitos passam a figurar como hipóteses para solucionar demandas de forma célere e eficiente, com objetivo de diminuir a sobrecarga judiciária.
A mediação possui o objetivo de resolver pacificamente o litígio entre as partes, entretanto, podendo ser definida como um método de resolução dos conflitos, aplicado por uma terceira pessoa, imparcial e notadamente treinada, que buscará restaurar a comunicação bem-sucedida e colaborativa entre as pessoas que se acham em um impasse, auxiliando-as a alcançarem a pacificação por meio de um acordo (NAZARETH, 2009).
É uma alternativa vista como uma maneira “ecológica de resolução dos conflitos sociais e jurídicos, uma forma na qual o intuito de satisfação do desejo substitui a aplicação coercitiva e terceirizada de uma sanção legal” (WARAT, 2001, p. 05).
A lei nº 13.140/15, em seu artigo 1º, parágrafo único, tratou de definir expressamente o conceito de mediação:
Art. 1º, Parágrafo único. Considera-se mediação a atividade técnica exercida por terceiro imparcial sem poder decisório, que, escolhido ou aceito pelas partes, as auxilia e estimula a identificar ou desenvolver soluções consensuais para a controvérsia (BRASIL, 2015, p. 1).
O mediador, de forma distinta ao magistrado, não profere a sentença vinculativa e tampouco decide, somente se limitando a intermediar a comunicação de forma a deixar com que as partes cheguem a um entendimento. O mediador fica no meio, não se aproximando de nenhuma das partes, mas apenas mediando o litígio (BUITONI, 2006).
Cintra, Grinover e Dinamarco (2009, p. 34) relatam que
A mediação assemelha-se à conciliação: os interessados utilizam a intermediação de um terceiro, particular, para chegarem à pacificação de seu conflito. Distingue-se dela somente porque a conciliação busca sobretudo o acordo entre as partes, enquanto a mediação objetiva trabalha o conflito, surgindo o acordo como mera consequência. Trata-se mais de uma diferença 26 de método, mas o resultado acaba sendo o mesmo.
Com a mediação, permite-se que as partes atuem conjuntamente, de modo cooperativo, sem que uma se dê por vencedora e a outra por vencida. O mediador propõe a solução do conflito amoldando os interesses de ambos os lados, visando ao melhor resultado para a relação de emprego (SILVA, 2015).
Pode-se perceber que a mediação, mesmo com a intervenção de terceiro (na qualidade de mediador), prestigia a autonomia das partes na negociação, fornecendo um maior nível de satisfação psicológica aos litigantes. Sua finalidade é garantir aos conflitantes a responsabilidade pelo litígio do qual fazem parte e, com o auxílio de um mediador, amparar as divergências, compreender os fenômenos e emoções envolvidas, objetivando buscar um consenso que atenda aos interesses envolvidos e conduza à paz social (TORRES, 2005, p.171).
O procedimento da mediação é caracterizado pela oralidade, visto que é um processo informal, garantidor do debate e comunicação entre as partes, a fim de encontrar possíveis soluções ao problema. Essa oralidade não apenas garante o diálogo durante o processo, mas também permite a reaproximação dos conflitantes, através do consenso, para garantir a restauração das relações entre os sujeitos envolvidos. (SPENGLER, 2014, p. 55)
Deve-se destacar que tal modalidade de solução do conflito possui um conteúdo ético e respeitoso a ser observado pelas partes, visto que não há a figura de um terceiro com decisão vinculante, e considerando que são as próprias partes que estabelecerão o acordo, apenas com o auxílio do mediador, cada uma delas deverá agir em conformidade com os preceitos éticos objetivos, aplicáveis a situação concreta, observando ainda os deveres da probidade e da boa-fé objetiva (THEODORO JÚNIOR, 2015).
A natureza da mediação é negocial. Em função disso, devem as partes observar o disposto no artigo 422 do Código Civil que diz: “os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé”. O dispositivo legal citado é a consagração do princípio da lealdade e confiança (Treu und Glauben), radicado no §° 242 do Código Civil Alemão de 1900 (SANTOS, 2014).
A mediação contém em sua estrutura um componente autocompositivo, que permite sua combinação com a arbitragem, em proveito do procedimento de composição, e, nesse caso, não será mediação, mas terá fisionomia híbrida de mediação-arbitragem. Originariamente, é uma técnica intermediária entre a conciliação e a arbitragem. É mais do que conciliação, na opinião predominante, porque permite uma perspectiva maior de iniciativas. É menos do que a arbitragem, porque não autoriza atos decisórios.
A palavra “conciliação” é oriunda do latim “conciliatione”, a qual traz consigo o significado da pacificação entre pessoas. A conciliação consiste, desse modo, em um processo autocompositivo no qual a figura do conciliador ampara as partes em litígio com o fulcro de achar uma solução adequada para as partes envolvidas na lide processual. (ACQUAVIVA, 2000, p.355)
Ela tem como objetivo a pacificação das partes envolvidas conflito, sendo que elas atuam, de forma igualitária, na preparação das decisões. Mesmo que o conciliador possa recomendar soluções, fica a cargo das partes a deliberação final (SANTOS, 2014). Sobre isso, Theodoro Júnior (2015, p. 42) afirma que “a conciliação nada mais é do que uma transação obtida em juízo, pela intervenção do juiz junto às partes, antes de iniciar a instrução da causa. Uma vez efetivado o acordo, lavra-se o termo e o juiz profere sentença homologatória”.
Através dos juizados especiais, a conciliação ganhou força e, hoje, possui previsão legal no novo CPC, que garante a sua obrigatoriedade, conforme o art. 334
Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de conciliação ou de mediação com antecedência mínima de 30 (trinta) dias, devendo ser citado o réu com pelo menos 20 (vinte) dias de antecedência. (BRASIL, 2015)
A conciliação tem alguns pontos semelhantes ao processo de mediação. Nesse sentido, Netto e Soares (2015, p. 110) prelecionam que:
As figuras do mediador e do conciliador, como auxiliares da Justiça, realizam um papel importantíssimo na administração de conflitos e precisam ser treinadas especificamente para esse mister. Isso contribuiu sobremaneira para que a atividade do magistrado seja aliviada, e lhe seja reservada apenas a tarefa de julgamento.
O fim principal destes dois métodos de tratamento adequados será a resolução do conflito através do consenso entre as partes. Os princípios envolvidos na conciliação e mediação são os mesmos, consagrados pelo art. 166, caput e §§1º e 4º, CPC/15, sendo eles a independência, a imparcialidade, a autonomia da vontade, a confidencialidade, a oralidade, a informalidade e a decisão informada devem prevalecer a todo instante, seja na mediação ou na conciliação.
A liturgia da conciliação, assim como na mediação, pode ser exercida tanto no âmbito extraprocessual quanto no litigioso, em outras palavras, antes de iniciado o processo ou durante seu curso o seu objetivo é o mesmo, ou seja, instigar as próprias partes a chegarem em um acordo que seja bom para ambas, com determinadas renúncias. Tal forma alternativa mostra-se mais enérgica do que decisões judiciais; visto que em tais decisões, ao contrário do que ocorre nos magistrados, se alicerça no comum acordo das partes.
Sena (2011, p. 122) ensina que a conciliação pode ser conceituada como
[...] método de solução de conflitos em que as partes agem na composição, mas dirigidas por um terceiro. Compreende-se a conciliação em um conceito muito mais amplo do que o “acordo” formalizado. A conciliação significa entendimento, recomposição de relações desarmônicas, empoderamento, capacitação, desarme de espírito, ajustamento de interesses.
A conciliação é apropriada para as relações sem vínculo de continuidade, visto que o conflito é tratado pelo conciliador de maneira que sejam atendidos apenas os interesses imediatos dos envolvidos e a disputa seja encerrada. Quando se fala do relacionamento das partes e os sentimentos envolvidos, a mediação torna-se o método mais adequado de resolução.
Conforme diversos doutrinadores, dentre eles, Almeida (2013), a conciliação garante a eficiência do aparato judiciário, recupera as faixas contenciosas das pequenas causas, diminui a pressão numérica e reduz o tempo de duração dos processos, dentre outros; permitindo, na maioria das vezes, atender, seus objetivos, quais sejam, resolver de forma pacífica as lides jurídicas, atender a paz social, solucionar o conflito com a aproximação das partes, tornar melhor o desempenho do Poder Judiciário.
De início, pode-se conceituar a arbitragem como a justiça praticada por um juiz, denominada árbitro, com conhecimentos técnicos em determinada área, de livre escolha das partes envolvidas em um conflito jurídico. Nesta modalidade de resolução, o árbitro não precisará ter formação acadêmica em Direito, mas em diversas áreas, tais como Medicina, Engenharia, Arquitetura, Contabilidade etc. Se as partes forem buscar nos corredores da arbitragem a solução de um problema relacionado à construção civil de uma sala comercial, por exemplo, poderá contar com os préstimos de um árbitro engenheiro.
Com o objetivo de diminuir a sobrecarga do Poder Judiciário no que se refere ao excesso de processos, é sancionada no dia 23 de setembro de 1996, a Lei n° 9.307, a qual dispõe sobre a arbitragem. Nos termos do artigo 2°, inciso I, as partes poderão escolher, espontaneamente, as regras de direito que serão aplicadas na justiça arbitral, desde que não viole a ordem pública estabelecida ou aos bons costumes.
A arbitragem substitui a justiça comum, por vontade das partes em virtude, entre outros motivos, de ser menos onerosa e mais discreta, tendo em vista que as questões levantadas e requeridas não são submetidas ao crivo da publicidade. Cretella Junior (1998, p. 218-219) preceitua que a justiça Arbitral se caracteriza por ser
[...] o sistema especial de julgamento, com procedimento, técnica e princípios informativos próprios e com força executória reconhecida pelo direito comum, mas a este subtraído, mediante o qual duas ou mais pessoas físicas ou jurídicas, de direito privado ou de direito público, em conflito de interesses, escolhem de comum acordo, contratualmente uma terceira pessoa, o árbitro, a quem confiam o papel de resolver-lhes as pendências, anuindo os litigantes em aceitar a decisão proferida.
Assim como no Poder Judiciário, o árbitro deverá ser imparcial, estando para tanto acima das partes que demandam o litígio. Um dos motivos determinantes da imparcialidade do juiz é o fato deste ser pago pelo Estado, não lhe interessando, nesse sentido, facilitar a decisão jurisdicional a favor desta ou daquela pessoa. (CRETELLA JUNIOR, 1998, p. 218-219)
Nesta senda, a arbitragem poderá se caracterizar pela escolha de um ou mais árbitros, devendo ser especialistas na matéria a ser apreciado. Interessante notar na especificada conceituação que os envolvidos poderão escolher o árbitro para solucionar litígio existente ou vindouro. Em suma: na expectativa de litígio, conforme se verá oportunamente, também poderá ter escolha de árbitros. (CRETELLA JUNIOR, 1998, p. 218-219)
Outra questão interessante é que a resolução de conflitos a ser submetida ao árbitro deverá versar sobre direitos patrimoniais disponíveis, de modo que os outros tipos de lides deverão ser apreciados pelo magistrado da justiça comum.
Pode-se afirmar, nesse sentido, que a decisão do árbitro, no aspecto de fazer com que as partes sejam sujeitas ao seu disposto, em nada perde para a decisão do magistrado comum. Pedro Lenza (2008, p. 99) leciona que a sentença arbitral consiste no “Julgamento prolatado pelo árbitro, se único, ou pelo tribunal arbitral, se por vários árbitros, após concluída a instrução acerca da disputa que foi submetida a sua apreciação”.
Desse modo, a decisão poderá ser emitida monocraticamente ou por um colegiado de árbitros, nos termos da legislação pertinente. Vale ressaltar também, que quando o autor fala que a instrução deve ser concluída ele está deixando claro que o devido processo legal deverá ser respeitado. A celeridade buscada pela sentença arbitral, e pela arbitragem como um tudo, não deverá afetar aos ditames do epigrafado princípio constitucional, que se refere a todos os processos, incluindo o dessa modalidade relativamente nova de resolução de conflitos. (LENZA, 2008, p. 99)
3 A DEFENSORIA PÚBLICA NA EFETIVAÇÃO DO ACESSO À JUSTIÇA
A Constituição Federal, no artigo 134, traz a definição, as atribuições e a organização da Defensoria Pública, com redação dada pela Emenda Constitucional nº 80, de 2014:
Art. 134. A Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, na forma do inciso LXXIV do art. 5º desta Constituição Federal.)
P§ 1º Lei complementar organizará a Defensoria Pública da União e do Distrito Federal e dos Territórios e prescreverá normas gerais para sua organização nos Estados, em cargos de carreira, providos, na classe inicial, mediante concurso público de provas e títulos, assegurada a seus integrantes a garantia da inamovibilidade e vedado o exercício da advocacia fora das atribuições institucionais.
§ 2º Às Defensorias Públicas Estaduais são asseguradas autonomia funcional e administrativa e a iniciativa de sua proposta orçamentária dentro dos limites estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias e subordinação ao disposto no art. 99,
A Defensoria Pública é função essencial da justiça, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do art. 5º, LXXIV. No Capítulo IV, do Título IV, a Defensoria Pública foi disposta, ao lado do Ministério Público (arts. 127 a 130), da Advocacia Pública (art. 131 e 132) e da Advocacia (art. 133 da CF/88), à categoria de instituição incumbida de exercer uma das funções essenciais à Justiça.
A instituição da Defensoria Pública do Estado, através da Constituição Federal, surgiu com a finalidade de garantir aos necessitados a defesa e o acesso à justiça. Entretanto, em razão da morosidade da justiça, fato não exclusivo da justiça brasileira, e que a Defensoria Pública encontra-se sobrecarregada por sua demanda, acaba por dificultar a execução. O doutrinador constitucionalista Silva (2015, p. 606) dispõe que
Os pobres ainda têm acesso muito precário à justiça. Carecem de recursos para contratar advogados. O patrocínio gratuito tem-se revelado de deficiência alarmante. Os Poderes Públicos não tinham conseguido até agora estruturar um serviço de assistência judiciária aos necessitados que cumprisse efetivamente esse direito prometido entre os direitos individuais. Aí é que se tem manifestado a dramática questão da desigualdade da justiça, consistente precisamente na desigualdade de condições materiais entre litigantes, que causa profunda injustiça àqueles que, defrontando-se com litigantes afortunados e poderosos, ficam na impossibilidade de exercer seu direito de ação e de defesa assegurado na Constituição.
Discute-se muito na prática, como definir um parâmetro de hipossuficiência econômica, tendo em vista que no Brasil, as desigualdades sociais são enormes. Portanto, estabelecer um critério de atendimento para o público da Defensoria Pública se torna um fator complexo e desafiador.
O encargo constitucional e legal atribuído à Defensoria Pública não se limita a assistência judiciária, uma vez que esta exerce função endoprocessual e extraprocessual, vale ressaltar que contribuição é exercida exclusivamente em prol dos necessitados economicamente, conforme disposto no artigo 4º, I, da Lei Complementar 80/94: Art. 4º São funções institucionais da Defensoria Pública, dentre outras: I – prestar orientação jurídica e exercer a defesa dos necessitados, em todos os graus.”
Ademais, o artigo 3º-A, da Lei Complementar nº 80/1994 traz os objetivos da Defensoria Pública:
Art. 3º-A. São objetivos da Defensoria Pública:
I – A primazia da dignidade da pessoa humana e a redução das desigualdades sociais;
II – A afirmação do Estado Democrático de Direito
III – A prevalência e efetividade dos direitos humanos; e
IV – A garantia dos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório
Como se verifica no citado acima, constitui um dos objetivos da Defensoria Pública a afirmação do Estado Democrático de Direito, contendo como competência de legitimação para o ajuizamento da ação civil pública, como forma de promoção e garantia dos direitos e garantias fundamentais da coletividade, atuando, inclusive, como custos vulnerabilis.
A Defensoria Pública adquiriu um elevado prestígio social ao longo dos anos, sendo considerada uma função essencial de justiça, com a prestigiada finalidade de promoção e segurança dos direitos humanos e busca a realização da justiça, sem restringir-se à atuação do Poder Judiciário, mas estendida ao desempenho de todos os poderes, assim como os valores sociais necessários (ROCHA, 2014).
No Estado do Tocantins, a Defensoria Pública é regulada pela Lei Complementar n° 55, de 27 de maio de 2009, a qual organiza o aludido órgão. De acordo com o artigo 1° da citada Lei
Art. 1º A Defensoria Pública do Estado do Tocantins é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbida, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, de dar orientação jurídica, de promover os direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, deforma integral e gratuita, aos necessitados, assim considerados na forma do inciso LXXIV do art. 5ºda Constituição Federal.
Quanto à sua organização no Tocantins, a Defensoria Pública é dividida em dez grandes núcleos, os quais são fundamentais para assegurar o acesso à justiça. No presente capítulo, cada um dos núcleos foi abordado, assim como uma contextualização jurídica dos direitos relacionados a tais núcleos e o seu respectivo caráter coletivo.
Essa divisão da Defensoria é coerente com o explanado pela Constituição de 1988, a qual, ao garantir a criação deste órgão, tornou-o necessário ao funcionamento jurisdicional do Estado, no que diz respeito à garantia de defesa e orientação jurídica a todos os necessitados, nos moldes estabelecidos no art. 5º, LXXIV. A Defensoria busca a realização da justiça, sem restringir-se à atuação do Poder Judiciário, mas estendida ao desempenho de todos os poderes, assim como os valores sociais necessários (ROCHA, 2014).
Com sua responsabilidade definida, a Defensoria pode ser vista como uma instituição capaz de transformar a realidade do tradicionalismo judicial, a fim de introduzir novas possibilidades para resolução de conflitos e garantia de direitos. É primordial entender que esta instituição vai muito além de um organismo de defesa dos necessitados de acesso à justiça, possuindo potencial de atuação no processo de conscientização de direitos até a busca por soluções, sejam elas judiciais ou extrajudiciais (SADEK, 2001).
O papel de influência que a Defensoria pública tem para transformar o quadro social acaba sendo muitas vezes escondido e desconhecido frente aos sujeitos do direito e a sociedade que carece de uma transformação do contexto judicial atual. São projetos como este que podem garantir a devida exploração do tema, a fim de evitar que a desinformação impeça a Defensoria Pública de assumir sua missão constitucional de transformação jurídica (BARBOSA, 2015).
Conforme Zaneti Júnior, é imprescindível a compreensão do papel da Defensoria Pública como instrumento da demodiversidade, que garante “vários meios institucionalizados e abertos para a institucionalização e a participação do indivíduo e da sociedade na formação dos atos decisórios que irão intervir na sua realidade cotidiana.” (ZANETI JÚNIOR, 2014, p. 04).
Não há como falar em garantia de acesso à justiça através de um único órgão ou procedimento judicial. Para Sadek (2001, s/p), trata-se de uma série de mecanismos e fenômenos interligados que buscam “possibilidades de encontrar soluções – sejam elas no interior ou não do Poder Judiciário. E, finalmente, que essas soluções sejam efetivas”. Assim, é importante a construção de um pensamento que valoriza soluções que não se prendem a métodos ou órgãos judiciais específicos, mas viabilizam o acesso e a garantia à justiça.
Com a criação dos juizados especiais, a Lei da Arbitragem, a Lei de Mediação e o Código de Processo Civil, começa a acontecer uma transformação gradativa no sentindo de abrir espaço para as vias extrajudiciais, incentivando o seu uso e garantindo o acesso à justiça. Para Didier (2015, p. 273) “o estímulo à autocomposição pode ser entendido como um reforço da participação popular no exercício do poder - no caso, o poder de solução dos litígios. Tem, também por isso, forte caráter democrático”.
Em meio às diferenças apresentadas em cada uma das alternativas extrajudiciais, todas elas buscam proporcionar uma decisão advinda do diálogo entre as partes, não dependendo da intervenção judiciária. Nesse sentido, Santos (2014, p. 16) afirma que elas passam a funcionar como “garantias constitucionais do acesso à justiça e visam a efetividade de direitos sob uma visão humana, pois não se atém à soluções de cunho estritamente técnico-jurídicas.”
Através da adoção de um entendimento que valoriza o acesso à justiça pautado na pacificação dos conflitos, torna-se possível o desenvolvimento de um sistema descentralizado, acessível e desburocratizado de resolução de conflitos, focado na conciliação, na mediação e na arbitragem. Assim, é importante que as instituições jurídicas do Estado cumpram seu papel em buscar a concretização desta sistemática adequada e extrajudicial.
Desse modo, cumpre mencionar que a Lei Complementar nº 132/2009 altera alguns dispositivos da Lei Complementar nº 80/1994, e dispõe a respeito da promoção prioritária da solução extrajudicial de litígios, visando a composição das pessoas que estão em conflito, consagrando a utilização dos meios autocompositivos como prioridade.
A Resolução nº 127 do Conselho Superior da Defensoria Pública, de 16 de abril de 2015, cria no âmbito da Defensoria Pública do Estado do Tocantins os núcleos especializados de conciliação e mediação (NUMECONs). Levando em consideração a função de promover, prioritariamente, a solução extrajudicial de conflitos, bem como afirmando que a conciliação e mediação viabilizam maior celeridade na resolução do litígio.
Cria-se assim, no Estado do Tocantins, uma estrutura organizacional, de caráter permanente, para o exercício da mediação e conciliação em todas as unidades de defensoria com mais de um órgão de atuação. Para a instalação do NUMECON é necessário a iniciativa própria do Defensor Público Geral ou por decisão do Diretor Regional da Defensoria Pública, considerando as possibilidades orçamentárias e administrativas. Assim o Defensor público Geral deve designar um Defensor Público que terá a função de supervisionar os trabalhos desenvolvidos no núcleo sem que prejudique suas atribuições naturais. (NUNES, 2018).
Aproximadamente 70.000 pessoas, entre atendimentos iniciais e retornos, utilizaram os serviços oferecidos pela Defensoria Pública do Tocantins em suas 42 duas unidades espalhadas por todo o Estado no ano de 2016. Pouco mais da metade dos assistidos são do gênero feminino (52,11%). Esse quantitativo aumentou para aproximadamente 73.000 pessoas em 2017. Em 2019 o quantitativo voltou a ser de aproximadamente de 70.000 atendidos. (NUNES, 2018).
Em 2018 o NUMECON fez os seguintes atendimentos, assim divididos: Araguaína 2.874 (15,90%);); Araguatins 557 (3,10%); Dianópolis 458 (2,50%); Guaraí 1.575 (8,70%); Gurupi 1.412 (7,80%); Palmas 7.807 (43,20%); Paraíso do Tocantins 1.426 (7,90%); Porto Nacional 1.589 (8,80%); Tocantinópolis 365 (2,00%). (NUNES, 2018).
Com o exposto, verifica-se que o NUMECON possui capilaridade no Estado inteiro na resolução pacífica de conflitos. Ressalta-se que a partir da atuação da Defensoria Pública, com o auxílio dos meios alternativos que nela se estruturam, é possível que o acesso à justiça possua novos caminhos, além dos meios judiciais, que possam atuar como mais eficiência e menores custos.
Para Capelletti (2002), é preciso romper com a crença de que litígio só poderá ser resolvido com a atuação direta do Poder Judiciário, para que os meios de resoluções de conflitos alternativos e extrajudiciais possam ser devidamente estruturados. Segundo a Resolução-CSDP, n° 104, de 6 de dezembro de 2013, é necessário que o cidadão atenda a certas condições para ser atendido no NUMECON como possuir renda mensal individual de até 03 salários mínimos, ou renda mensal familiar que não ultrapasse 05 salários mínimos.
O NUMECON instalado na Defensoria Pública de Palmas é constituído por conciliadores, mediadores e atendentes. Nesse sentido, a conciliação é formada por analistas jurídicos que atendem na área cível e de família, e a mediação também trabalha com a área cível e de família e é composta por uma psicóloga mediadora e por estagiários dos cursos de Direito e Psicologia (NUNES, 2018).
O referido núcleo busca promover a conciliação e demais técnicas alternativas de resolução de conflitos. Sua atuação é no sentido de trazer acordo entre as partes envolvidas na lide processual. Tal setor é fundamental para o acesso à justiça. Messias e Lima Júnior (2017) dispõem que a Defensoria Pública é o instrumento que viabiliza a garantia de que a maior parte da população seja ouvida, na medida em que compõe a construção da justiça. (NUNES, 2018).
Ao promover assistência judiciária gratuita, a instituição auxilia a garantir a igualdade material e a justiça distributiva. Ao estudar o espectro de atuação institucional da Defensoria, O papel da instituição vai além da função atrelada à hipossuficiência financeira, visto que o conceito de vulnerabilidade não se reduz ao sentido econômico. A dificuldade em acessar a justiça e exercer efetivamente os direitos é característica de vulnerabilidade.
É oportuno que este tema seja abordado dentro do universo acadêmico do direito e tome maior proporção de conhecimento, no que tange ao acesso à justiça viável a todos os casos e necessidades. Não existe mais apenas um caminho para a resolução de conflitos, mas sim uma multiplicidade de possibilidades que precisam ser oferecidas e conhecidas pelos indivíduos que buscam a resolução de sua demanda judicial. (NUNES, 2018).
Acredita-se que através de um estudo sobre a aplicação e funcionamento dos métodos extrajudiciais de resolução de conflitos dentro da Defensoria Pública é possível alcançar os indivíduos atuantes na área do direito, a fim de provocar uma mudança cultural e social em prol da atuação cooperativa e pacífica, rompendo o engessamento judicial focado. (NUNES, 2018).
O trabalho prestado pela Defensoria Pública, da forma mais ampla possível, garante o respeito da dignidade da população carente. Destaca-se que analisando as atribuições dessa instituição, fica claro que muito mais do que prestar assistência jurídica gratuita para os necessitados, o objetivo da Defensoria Pública deve ser a transformação social.
Ora, na medida em que a Constituição prevê como objetivos da República Federativa do Brasil “erradicar a pobreza e marginalização e reduzir as desigualdades”, demonstra-se a necessidade de criação de pelo menos um órgão responsável por perseguir esses objetivos. No entanto, à Defensoria Pública não deve ser incumbida sozinha desse papel. O Estado deve constantemente criar mecanismos que possibilitem a perseguição desses objetivos. (NUNES, 2018).
Conforme dito acima, a Defensoria Pública é função essencial à Justiça, e cabe a ela a prestação de uma assistência jurídica integral e gratuita. Ao analisarmos as expressões “integral e gratuita” constatamos que o constituinte não quis restringir de forma alguma a atuação da Defensoria na perseguição dos interesses dos seus assistidos. (NUNES, 2018).
O quadro de desigualdade social que assola o Brasil é assustador. Com base nisso, o papel da Defensoria Pública é de grande relevância, posto que cabe a ela garantir o efetivo acesso à Justiça para a população que não possui condições para fazer valer os seus direitos. A maioria da população brasileira, hoje, desconhece os seus direitos, o que dificulta de sobremaneira o acesso à justiça.
Em razão disso, a atuação da Defensoria Pública não deve ser meramente passiva, pelo contrário, ela deve atuar da maneira mais ativa possível. Não deve aguardar simplesmente ser procurada pelas pessoas, em razão destas desconhecerem os seus direitos. Atuar apenas e tão somente no plano individual significa muito pouco, considerando a sociedade de massa e global que vivemos. E se atuação da Defensoria for limitada ao plano individual, podemos dizer que está atuará de forma eminentemente repressiva (ROCHA, 2014).
A Defensoria Pública só atuará de acordo com objetivos traçados para ela pela Constituição e pela Lei, se tomar uma posição de garantir efetivamente o acesso à justiça, de forma integral e gratuita, atuando ativamente, até porque, se não o fizer, os direitos de muitos restarão prejudicados, por não os conhecerem.
5 CONCLUSÃO
A Lei Complementar nº 80/1994 por meio do seu artigo 4º, II, expõe que um dos objetivos da Defensoria Pública é promover a solução extrajudicial dos litígios, como forma de composição dos conflitos. Esse objetivo vai de encontro com o conceito e função da própria Defensoria, uma vez que esta não atua somente perante os processos judicializados, devendo, portanto, ter participação endo e extraprocessual, não se limitando à judicialização, mas sim objetivando o melhor interesse do usuário.
Com isso, observa-se que a Defensoria Pública do Estado do Tocantins é bem atuante e com uma grande demanda de usuários do serviço. A subdivisão em 10 (dez) núcleos garante uma melhor distribuição, zelo e especialidade do tratamento, garantindo um bom atendimento e retorno das demandas com êxito e satisfação do usuário.
No contexto do Estado do Tocantins, a Defensoria continua desempenhando um papel de excelência na busca pelos direitos de seus assistidos. Não se trata de um sistema perfeito, mas sim uma instituição que tem se esforçado em acompanhar as modernizações sociais e políticas, a título de exemplo tem-se a criação do NUMECON, para que a população tocantinense tenha acesso a um sistema rápido e brando na solução de seus litígios.
Em virtude da morosidade da justiça e abarrotamento judicial, fato não exclusivo da justiça brasileira, é de extrema importância a atuação da Defensoria Pública como função essencial preocupada com a efetivação dos direitos e garantias dos cidadãos necessitados em todos os graus, buscando, assim, soluções adequadas para cada caso de forma ágil.
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Por: Gudson Barbalho do Nascimento Leão
Por: Maria Vitória de Resende Ladeia
Por: Diogo Esteves Pereira
Por: STEBBIN ATHAIDES ROBERTO DA SILVA
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