RESUMO: Há valores essenciais que vão permear toda a conduta daqueles que ingressam nos quadros da Marinha do Brasil. Nesse sentido, apesar dos valores serem intrínsecos à atividade militar, é possível encontrá-los também em sua maioria presentes na Constituição Federal de 1988 e na legislação administrativa militar, de maneira a evidenciar valores universais e fundamentais para uma conduta aprazível dos militares e também dos cidadãos civis.
Palavras–chave: Direito Militar. Rosa das Virtudes. Disciplina e Hierarquia. Estatuto dos Militares. Valores Militares. Dever de obediência. Direito Militar Disciplinar.
ABSTRACT: There are essential values that will permeate the entire conduct of those who join the ranks of the Brazilian Navy. In this sense, even though the values being intrinsic to military activity, it is also possible to find them mostly present in the Federal Constitution of 1988 and in the military administrative legislation, in order to show universal and fundamental values for a enjoyable conduct of the military and the civilian citizens.
Keys Word: Military Law. Rose of Virtues. Discipline and Hierarchy. Military Statute. Military values. Duty of obedience. Disciplinary Law.
Sumário: Introdução – 1. Rosa das virtudes: conceito. – 2. Os valores da Rosa das Virtudes na legislação militar. – 3. A rosa das virtudes e a Constituição Federal de 1988 – 4. Conclusão. Referências
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem como tema a importância dos valores presentes na Rosa das Virtudes como um verdadeiro fio condutor de boas contribuições para a sociedade e suas transformações sociais, pautadas na cidadania, dignidade e civilidade.
Assim, é possível observar que os valores militares se encontram em maior ou menor medida na produção legislativa, e, principalmente, na produção do constituinte originário: Constituição Federal de 1988.
Menciona-se que a prática do bem comum, a busca pela honra, cooperação, fidelidade e alguns outros valores são aqueles professados em inúmeros artigos da CRFB88 e principalmente a busca incessante por uma sociedade que valoriza a igualdade e o bem-estar coletivo.
Para alcançar os objetivos acima, mobilizou-se como recursos metodológicos a produção legislativa, os artigos publicados pela Marinha do Brasil, que possui vasto acervo literário em busca da valorização intelectual e desenvolvimento científico de sua força.
1.Rosa das virtudes: conceito.
De acordo com o site oficial da Marinha do Brasil, a rosa das virtudes foi publicada a primeira vez em 1954, no livreto "Nossa Voga" e expressa as qualidades essenciais dos militares. É composta de 16 valores que são valores de suma importância para navegação e atividade militar, tendo em vista que é formadora do caráter e da ética militar.
A honra é a força motriz que conduz as práticas à busca pelo bem. A honra está contida nos deveres e no agir com dignidade e bravura. A honra é o sentimento que é passado para filhos e netos, inclusive no âmbito profissional para profissionais que atuam juntos. A profissão do militar exige dedicação ao serviço e a honra seu pressuposto.
Lealdade é o devotamento à causa é cumprir e receber ordens com a mesma devoção, ainda que não as compreenda. É cumprir o que se ordena com exatidão, firmeza, atenção e deferência. Trata-se do valor humano de manter a honestidade com os demais.
Por sua vez, o site oficial da marinha enumera como iniciativa:
“A Iniciativa é o ânimo pronto para conceber e executar. É uma manifestação de inteligência, imaginação, atividade, saber e dedicação ao serviço. Um Oficial, cumpre de forma conscienciosa as obrigações, as rotinas de seu cargo, faz o treinamento regular dos seus homens e etc. Um outro faz tudo isso e vê onde um aperfeiçoamento pode ser introduzido. “
A cooperação é se esforçar em benefício do serviço e dos valores militares. É agir conforme o senso coletivo e bem-estar do conjunto. É exercer sua função de maneira a facilitar e contribuir com os demais membros da força. Ressalta-se que a cooperação é valor intimamente ligado à eficiência da Marinha do Brasil, pois representa a junção de ações otimistas e uníssonas para o bom funcionamento da força.
Por sua vez, há o espírito de sacrifício, que a Marinha do Brasil conceitua como a disposição sincera de realmente oferecer tudo em troca do cumprimento do dever. É a dedicação e disposição da própria vida, em detrimento de embates subjetivos pessoais.
O zelo é um valor fundamental na formação dos profissionais que vão compor os quadros da Marinha do Brasil, pois é o que vai denotar o preparo profissional e a maestria das funções desempenhadas. É se dedicar ao serviço e à pátria com o máximo de cuidado.
Outro valor que compõe a rosa das virtudes é a coragem. É ceder a própria vida, bem valioso, pela causa e pelo destemor nos combates. É saber enfrentar os desafios para assumir os atos de forma corajosa e responsável.
A ordem evita que se perca tempo. O acatamento de ordem promove a segurança e a organização do próprio trabalho, tendo em vista que se possibilita que todos exerçam a mesma conduta. A ordem possibilita que haja ordenação do próprio trabalho, organizando material, livros e uniformes. De acordo com a Marinha do Brasil, encontra-se tempo necessário para ocupar adequadamente as atividades de formação.
A Fidelidade também está prevista como um valor existente na Rosa das Virtudes. É perseguir uma finalidade honesta e concisa com as ideias de fidelidade. É desempenhar funções sendo honesto, responsável e sem que haja negligência ao realizar as tarefas. É estar se sacrificando para cumprir o que se espera na mais alta autenticidade e verdade.
O fogo sagrado é o intenso amor e o devotamento pela Marinha do Brasil. Se trata da paixão, da fé e do entusiasmo com que o militar se dedica à carreira e pelo serviço. De acordo com a Marinha do Brasil no site oficial:
“a vida comum de bordo, o militar tem diariamente, na maneira como conduz o seu serviço, o seu quarto, as suas fainas, os seus exercícios, frequentes ocasiões para viver esse sentimento perante seus subordinados. O “Fogo Sagrado” transmite-se, mas para tanto é preciso possuí-lo em grande intensidade e demonstrá-lo mais por atitudes e ações do que por ordens e palavras. O “Fogo Sagrado” é a alma da Marinha!.”
A tenacidade é a obstinação, dedicação e amor ao serviço. É a perseverança e a persistência na continuidade dessa prestação. Trata-se de um princípio da Rosa das Virtudes na medida em que é necessária disposição para conduzir homens e enfrentar dificuldades.
A decisão, por sua vez, é orientar a atividade, a atuação. É tomar decisões após análise cautelosa, examinando com minúcia as possibilidades. É proceder com decisões oportunas e adequadas.
A abnegação prevista é também o altruísmo, é o ato de servir de maneira a fortalecer a Marinha do Brasil. É ter atitudes não egoístas e pensadas sem trazer consigo interesses individuais. É saber renunciar para agir com a máxima virtude.
Espírito militar é relacionado ao comportamento, confiança e qualidades essenciais ao militar. É o prestígio à Marinha do Brasil, disciplina, lealdade e eficiência. É estar atuando de forma alinhada com o que se espera dos militares que compõe a força.
Disciplina é um dos pilares principais da Rosa das Virtudes e é valor encontrado na maioria das disposições normativas da Marinha do Brasil. É a obediência às ordens do superior, disciplina com eficiência.
O patriotismo previsto na Rosa das Virtudes é o amor à pátria, que vai mover e traçar um norte condutor para o desempenho de todas as funções militares, uma vez que a defesa da pátria pressupõe o patriotismo, que, por sua vez, é função precípua das forças armadas e assim, da Marinha do Brasil.
Assim, foi possível observar os valores existentes na Rosa das Virtudes e o seu papel fundamental dentro da Marinha do Brasil, sendo um verdadeiro padrão de conduta dos exercícios militares.
2.Os valores da Rosa das Virtudes na legislação militar.
O elemento humano que compõe a força produtiva e útil da Marinha do Brasil precisa estar em constante aperfeiçoamento para o desempenho de suas funções. É nesse sentido que valores que funcionam como norte de conduta e facilitam a convergência entre os desejos individuais e as demandas do bem comum.
Nesse ínterim, embora surjam conflitos no seio da sociedade, no âmbito militar haverá regras, legislação e valores para que os militares possam ordenar sua conduta de forma positiva. Dentre os valores que vão compor a Rosa das Virtudes, podemos citar: honra, lealdade, iniciativa, cooperação, espírito de sacrifício, zelo, coragem, ordem, fidelidade, fogo sagrado, tenacidade, decisão, abnegação, espírito militar, disciplina e o patriotismo.
Os valores previstos na Rosa das Virtudes, além de estarem explícitos e implícitos na Constituição Federal de 1988, também estão previstos na legislação infralegal. Podemos citar o exemplo dos valores da honra e da disciplina previstas no artigo 31 da Lei 6880:
Art. 31. Os deveres militares emanam de um conjunto de vínculos racionais, bem como morais, que ligam o militar à Pátria e ao seu serviço, e compreendem, essencialmente:
I - a dedicação e a fidelidade à Pátria, cuja honra, integridade e instituições devem ser defendidas mesmo com o sacrifício da própria vida;
II - o culto aos Símbolos Nacionais;
III - a probidade e a lealdade em todas as circunstâncias;
IV - a disciplina e o respeito à hierarquia;
Nessa perspectiva, outro exemplo possível de ser citado é o valor da disciplina e da ordem, que vão permear todas as condutas presentes no decreto 88.545, que é o regulamento disciplinar da Marinha do Brasil. Deixar deixar de cumprir ordem está previsto no artigo 7° como uma contravenção disciplinar, correspondendo ao desrespeito ao valor da ordem. O artigo 2° de o Regulamento Disciplinar da Marinha, cita a cooperação também como uma manifestação da disciplina militar, valor também presente na Rosa das Virtudes.
A lei complementar 97 de 1999 que disciplina as normas gerais para a organização, preparo e o emprego das Forças Armadas prevê no seu primeiro artigo que as Forças Armadas destinam-se a defesa da pátria, o que faz uma breve alusão ao valor do patriotismo da Rosa das Virtudes. A lei de serviço militar, 4.375 de 1964 também prevê inúmeros valores existentes na Rosa das Virtudes. Assim, no artigo 1° quando afirma que o Serviço Militar consiste no exercício de atividades específicas desempenhadas nas Forças Armadas e que essas atividades vão compreender todos os encargos relacionados com a defesa nacional, deixa claro que o patriotismo vai reger toda a atividade das Forças Armadas.
Há ainda os valores que não estão previstos na legislação de forma expressa, mas que podem ser retirados buscando a sistematicidade do seu significado. Ocorre dessa forma com o fogo sagrado, podendo ser extraído do artigo 27 do Estatuto dos militares quando menciona que o espírito de corpo e orgulho do militar pela organização onde serve são valores militares.
A tenacidade também se encontra prevista no artigo 27 do Estatuto dos Militares, que informa que um dos valores militares é o aprimoramento técnico-profissional. Evidencia o poder da vontade e a busca pelo aprimoramento. No mais, ainda é possível extrair do mesmo dispositivo o valor do zelo, uma vez que o aprimoramento vai decorrer diretamente do sentimento de não poupar esforços para o desempenho da função. Logo, resta claro e inequívoco que em muitos dispositivos é possível extrair uma gama de vastos valores militares.
O espírito de sacrifício é um dos valores da Rosa das virtudes que podemos extrair do artigo 31, V da Lei 6880, conforme prevê:
Art. 31. Os deveres militares emanam de um conjunto de vínculos racionais, bem como morais, que ligam o militar à Pátria e ao seu serviço, e compreendem, essencialmente:
V - o rigoroso cumprimento das obrigações e das ordens;
O que se conclui nessa breve demonstração é que os valores da Rosa das Virtudes não são valores expressos e categóricos a serem encontrados na legislação infralegal que rege a atuação das forças armadas, mas sim, valores quase que espiritualmente vão permear toda e qualquer atividade das Forças Armadas, uma vez que dizem respeito a toda a sua atuação, principal ou subsidiária. Assim, ainda que não haja plena vinculação com o nome previsto na Rosa das Virtudes, haverá sempre uma total consonância do objetivo da lei e a sua sistematicidade com os referidos valores.
Percebemos que há inúmeras legislações infralegais que mencionam os valores que são caros à Marinha do Brasil, sendo eles o Estatuto dos militares, lei de serviço militar, regulamento disciplinar da Marinha do Brasil e a lei complementar 97 de 1999 que vai dispor sobre normas gerais para organização, preparo e emprego das forças armadas.
3.Rosa das Virtudes e a Constituição Federal de 1988
De acordo com Kelsen, deve a Constituição Federal ser considerada a norma maior, com superioridade hierárquica, cujas leis infraconstitucionais tiram seu fundamento de validade. Assim, entendemos que serão inválidas normas do ordenamento jurídico que violem frontalmente o esquema previsto da CRFB88.
Nesse sentido, além da obrigatoriedade de respeito a um sistema normativo organizatório da constituição, há ainda valores passados ao longo das constituições e que historicamente vão sendo reproduzidas em outros atos normativos ou administrativos.
Assim, a legislação militar é pautada em valores que foram transmitidos de acordo com a historicidade das cartas constitucionais, agregando diversos valores às Forças Armadas e ao seu sistema normativo.
O princípio da cooperação é o esforço pelo bem comum, aumentando a eficiência da força. Nesse ínterim, a CRFB88 prevê no artigo 4° a cooperação entre os povos para o progresso da humanidade. Assim, percebe-se que o valor da cooperação está em total consonância com o que se espera dos militares e da sociedade como um todo. No mais, também consta na constituição a cooperação entre os entes federados:
Art. 219-A. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão firmar instrumentos de cooperação com órgãos e entidades públicos e com entidades privadas, inclusive para o compartilhamento de recursos humanos especializados e capacidade instalada, para a execução de projetos de pesquisa, de desenvolvimento científico e tecnológico e de inovação, mediante contrapartida financeira ou não financeira assumida pelo ente beneficiário, na forma da lei. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 85, de 2015)
O patriotismo, pilar que fundamenta a atuação das Forças Armadas também é um valor que pode ser extraído da constituição, como se observa no artigo 13 da CRFB88, que elenca os símbolos nacionais, dentre eles a bandeira, o hino, armas e os selos nacionais. Essa valorização decorre da importância que o constituinte originário concedeu aos símbolos nacionais, trazendo consigo intensa carga de valorização dos elementos utilizados para representar a nação.
Já a disciplina, está prevista no artigo 142 da Constituição Federal de 1988 como um elemento da organização das forças armadas. É importante frisar que a hierarquia e disciplina sempre foram características essenciais da organização das Forças e que a Constituição atual não foi inovadora nesse ponto, tendo previsão no artigo 92 da Constituição de 1967.
A honra também encontra espaço na constituição ao ser feita uma interpretação sistemática de seu texto. Dois dos princípios fundamentais do artigo 1° são a cidadania e a dignidade da pessoa humana, o que, apesar de não se confundir com a honra do militar, estão vinculados à busca pelo valor e pela moral do indivíduo. Assim, não é cabível pensar em um militar honrado que não encontre na sua subjetividade o prestígio da justiça, honra, moral, cidadania e dignidade.
4. Conclusão
Conforme exposto, a rosa das virtudes é um marco simbólico de valorização de valores que devem permear a conduta de militares. No entanto, encontramos essa valorização nas legislações militares e também nas constituições.
Isso evidencia o quanto o comportamento militar abarca princípios e valores que são extremamente valorizados em uma sociedade, trazendo desenvolvimento social, convívio harmonioso e até elevação moral dos indivíduos que compõe a sociedade.
Assim, apesar do militarismo exigir comportamentos específicos e necessários dos militares para que cumpram as forças armadas as suas funções típicas e atípicas, como a hierarquia, também há valores que podem ser transportados para o convívio social, como a cooperação.
Logo, os valores militares possuem o poder e a competência para agir em prol de transformação social e individual, uma vez que há inúmeros valores universais, necessários para a atividade militar, mas que se aplicados às relações humanas, serão benéficas para a coletividade.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição Federal de 1988. Promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm> Acesso em: 18 jan. 2022.
BRASIL. Lei n° 6.880, de 09 de dezembro de 1980. Disponível no sítio eletrônico: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L6880.htm. Acesso em 18 jan. 2022.
BRASIL.Regulamento 88.545, de 26 de julho de 1983. Disponível em: <https http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/atos/decretos/1983/d88545.html> .Acesso em: 18 jan. 2022.
BRASIL. Lei nº 4.375, de 17 de agosto de 1964.. Dispõe serviço militar obrigatório Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L4375.htm.> Acesso em: 18 jan. 2022.
BRASIL. Lei complementar 97, de 9 de Junho de 1999. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp97.htm.> Acesso em: 17 jan. 2022.
Rosa das Virtudes. Disponível em: https://www.marinha.mil.br/ciaan/rosadasvirtudes .Acesso em: 18 jan. 2022.
Advogada. Formada na Universidade Estácio de Sá, pós-graduada em Direito Público e Privado pela Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BELCHIOR, Gisele de Almeida Barreto. Marinha do Brasil e a rosa das virtudes: uma ótica constitucional Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 08 fev 2022, 04:25. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/58066/marinha-do-brasil-e-a-rosa-das-virtudes-uma-tica-constitucional. Acesso em: 04 out 2024.
Por: Sócrates da Silva Pires
Por: ADRIELLE DE OLIVEIRA ROSENDO FERNANDES
Por: Gabriel Bacchieri Duarte Falcão
Por: Bruno Márcio de Amorim Magalhães
Precisa estar logado para fazer comentários.